- Gostosa! Volta aqui! - Enquanto saia do carro ainda pude ouvir as palavras porcas do velho gorducho com quem passei metade da noite. Minha pior noite.
Olhei no pequeno relógio no meu pulso e me assustei vendo que já são 5:30hrs da manhã, preciso estar no hospital daqui duas horas e meia, fazemos um revezamento entre eu, minha mãe e a minha irmã, sou eu quem fica das 7:30 ao 12:00 no hospital com Clara e depois saio direto para a empresa, oque me deixa realmente exausta, com as poucas horas de sono que eu tiro em um intervalo e outro não dá pra descansar quase nada.
Entrei na pequena sala que diferente de ontem está vazia, minha sorte é que o pessoal da limpeza sempre deixa tudo aberto até acabarem o trabalho na boate e nos quartos. Dei graças pelo velho ter escolhido ficar em seu carro, dentro do beco, assim eu posso pelo menos trocar essa mínima peça de roupa por outra mais decente. Antes de ir para o hospital eu preciso passar no centro, na loja de brinquedos e comprar a bonequinha de pano pra Clara, ela realmente adora e espero que isso a anime pelo menos um pouquinho.
Peguei minha calça preta dentro da bolsa, o meu casaco que usei ontem pra vim pra cá e uma touca. Londres faz mesmo frio, ainda mais cedo assim. Vesti tudo rapidinho e olhei em volta procurando pelas minhas botas, achei jogadas em um cantinho e rapidamente coloquei os meus pés apreciando o quentinho que as botas deixam os meus pés machucados pelos saltos da noite passada. Me olhei no espelho, ajeitando o meu cabelo com o dedo pra enfim colocar a touca beje. Dei uma última olhada e sai do lugar que é capaz de me causar vômitos.
6:40hrs. Olhei mais uma vez no relógio e agradeci mentalmente por saber que a loja já estaria aberta quando chegasse. Faltam só mais algumas quadras até a loja e me sinto animada por isso,dias antes da Clara perder os movimentos ela me pediu a bonequinha e já que o velho me pagou uma quantia generosa eu vou conseguir comprar e ainda assim juntar o dinheiro para o pagamento no hospital.
Depois de mais alguns minutos andando, parei em frente a enorme loja com uma enorme placa colorida escrito "HAPPY" e entrei. UAL! É tudo tão grande e colorido que até eu me sinto feliz com esse tanto de brinquedos e pelúcias gigantescas, eu posso ser uma criança as vezes. Caminhei por entre as prateleiras imensas e armários cheio de carrinhos de diferentes tamanhos e cheguei a parte que é provável achar oque eu procuro já que na placa está escrito para menores de 5 anos, ou seja, nada de pontas afiadas, peças pequenas ou coisas duras que possam machucar.
Olhava tudo com calma, meus olhos passavam atentamente por cada bonequinha procurando pela mais bonitinha até que um barulho alto de brinquedos caindo soou, me virei rapidamente e um garotinho com os olhos esbugalhados olhava os brinquedos caídos no chão. Caminhei até ele e sorri gentil, começando a recolher os brinquedos caídos os colocando no lugar novamente. Logo o rapazinho de lindos olhos verdes se juntou à mim.
- Olá! - Sorri-lhe enquanto me abaixava pra ficar da mesma altura.
- Oi! - sussurrou e eu soltei uma risadinha.
- Por que está sussurrando? - perguntei no meu tom de voz normal, ganhando em seguida uma repreensão do pequeno que murmurou um "shiiuu" levando o dedo indicador sobre os lábios. Não pude deixar de rir baixinho. Ele provavelmente está com medo da mãe ver a travessura que acabou de fazer.
- Desculpa - Encolhi os ombros sorrindo. - Qual o seu nome?
-Nicol...
- NICOLLAS!
Um grito no fim do corredor me fez congelar e arregalar os olhos. Virei a cabeça lentamente e lá estava, os cachos bagunçados, o olhar firme, sem sinal de sorriso arrogante ou covinhas no rosto, estes foram trocados por uma expressão de causar medo. Coloquei o último brinquedo na prateleira e me levante sem saber muito oque fazer ou pra onde olhar, não era suposto eu encontrar um cliente aqui, muito menos o Styles. Ele caminhou a passos apressados, parando em uma distância suficiente pra me fazer encolher e recuar dois passos.
- Desculpa tio, eu derrubei os brinquedos sem querer.
- Sai de perto dela AGORA, Nicollas. - Okay. Isso magoou. Eu sei que não sou a pessoas mais digna e certa do mundo mas não é como se eu tivesse uma doença contagiosa ou fosse capaz de fazer mal à alguma criança, eu nunca faria.
Ele puxou o garotinho - que agora eu sei que é o seu sobrinho - como se estivesse a proteger de um monstro terrível. Coloquei o meu olhar nas minhas botas enquanto balançava o meu corpo pra frente e pra trás. Eu queria olhar no fundo daqueles olhos verdes e gritar, gritar e gritar, ate até fazê-lo perceber o quanto está sendo idiota em desprezar alguém que não conhece, queria dizer o quanto isso me irrita e me deixa pra baixo, queria descontar todas as minhas frustrações nele, pra quem sabe assim ele perceba que nem todos são como ele, com uma empresa bem sucedida e uma vida estável, queria que ele entendesse que as vezes fazemos coisas que não queremos apenas porque amamos demais. Mas como sempre, eu apenas mordi o lábio com força, engoli tudo e levantei a cabeça ouvindo mais um dos seus insultos:
- Fique longe! Longe de mim e principalmente da minha família. - sua voz era baixinha e rouca bem perto do meu ouvido, mas isso não fez com que eu sentisse menos medo.
- E-eu n-não sabia q-que...que...
- Não. Me. Interessa. Fica longe. Vai ser melhor pra você, sua vadia! - Eu já devia estar acostumada com esse tipo de tratamento, mas acontece que a cada palavra parece que facas estão entrando sem dó alguma no meu coração. Eu posso ficar longe dele e principalmente da sua família, esse não é o problema. O que dói mesmo é como ele me faz sentir, como se não fosse digna nem de respirar o mesmo ar que ele.
- Tudo b-bem! Não vai ser problema pra mim. - suspirei e olhei fundo nos olhos faiscantes que na hora me causaram um arrepio estranho no corpo. Não gosto dessa reação que ele me causa, se eu pudesse me proteger, com certeza o faria.
- Ótimo! - Ele intensificou ainda mais o olhar e eu rapidamente desviei. É tão intenso que parece queimar a minha alma. Ele se manteve parado por mais alguns segundos e só então, quando ouvi os barulho das suas botas se distanciando eu pude respirar com calma novamente.
Passei as mãos no rosto e voltei a observar novamente as bonequinhas, só que agora com bem menos atenção. Tudo oque aparece na minha mente são os frios olhos verdes que tem a intensidade capaz de ficar gravados na minha mente e capaz de me fazer sentir sensações estranhas no estômago. Sensações que acredito ser de pura mágoa e raiva.
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Sentire || H.S
RomanceClara Austin, a princesinha da família, foi atingida por uma doença desconhecida, porém, muito forte, capaz de paralisar os membros do corpo. A empresa e fonte de renda fora roubada a exatos um mês, deixando a família sem dinheiro algum e preocupado...