Capítulo 04 - A estação sem préstimo

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"[...]
Numa noite fria de outono,
[...] as folhas caídas no chão [...],
A flor conhece o beija-flor.
[...]"
– Versos de "A flor e o beija-flor", de Marília Mendonça.

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O outono se caracteriza por ser um meio termo de tempos. Aquela estação que divide duas outras estações antagônicas: inverno e verão. Para quem vive no Brasil, em especial perto dos trópicos, é um período irrelevante para se conhecer, já que não se manifesta com intensidade visível. Mas mesmo não sendo percebida, ela não deixa existir.

E esta estação me conquistou com grande efeito. A queda de temperatura, as árvores que renovam a folhagem, o tom das folhas secas caídas, as folhas caídas, o leve dançar das folhas caindo de mansinho acompanhando o vento, o cheiro de brisa fresca.

Necessariamente tudo parecia ter um toque especial.

Todavia, assim como o outono, a primavera era dona de outro título de estação sem préstimo algum para nós. Mas olha só, ela também não deixa de existir pó isso. A primavera, ao pouco que eu sabia, tinha significados interessantes. De modo geral, representa o renascimento, o qual saímos da introspecção calada e fria do inverno para florescer e despertar na vida. Aquela outra estação que se interpõem entre duas outras de caráter antagônico.

E foi nesse delirar que saímos do aeroporto rumo ao verão chuvoso e quente da Amazônia.

Decidi que se era mesmo para viajar, iria fazer com que fosse uma viagem divertida e memorável. Repeti algumas vezes algo como "não há problema em se deixar levar". E, afinal, por que o pessimismo? Pétala me disse que uma floresta é muito mais do que meramente árvores. Estava torcendo para que estivesse correta.

Nos reunimos dois dias antes do vôo para fazer nossa programação e checar os últimos preparativos. Era um mês, exatamente trinta dias livres, algumas atividades diferentes. No mais, não havia muita coisa que fugia estritamente do que considerávamos comum. Passeio ao ar livre, trilhas, pescarias – algo que eu nunca tinha feito -, festas culturais da região, piqueniques, banho no rio, algumas festas entre nós ou na cidade próxima – se houvesse. No geral, o que me preocupava era estar mentindo, comprometendo o meu emprego, por uma viagem que não tinha passado a ser um desejo. Mas isso não impedia que fosse agradável.

O avião estava pronto para sair. Não estava lotado. Pétala sentou no acento perto da janela, e eu sentei no do meio, ficando vago o acento do lado. Bee e Benjamim se sentaram na nossa frente, apaixonados como sempre aparentavam estar. Bee se levantou.

- Gente, quero entregar isso a vocês, é um presente da minha mãe. – Ela entregou dois colares com uma pedrinha de quartzo azul como pingente, um belo trabalho de artesanato. - Ela disse que você tinha pedido, Pétala, e vocês sabem como ela é fissurada em culturas indígenas. – Estava sorridente. - É para afastá-los do mal.

- Obrigado, Bee. – Disse eu.

- Estamos gratos. – Disse Pétala.

- Por nada, mas devem agradecer minha mãe. – Ela andou em direção ao seu acento.

- Fico feliz que ela tenha se lembrado. – Bee sorriu ao ouvir.

O coloquei e ajudei Pétala a colocar o seu. Bee e Benjamim também usavam um, mas os quartzos deles eram rosados. Aquela pedra combinava bem com os cabelos platinados de Pétala, que tinham nuances acinzentado, mas que lembrava um azul pastel, em decorrência do jogo de sombras e luzes.

- Você não tem medo de andar de avião, né? – Pétala riu quando viu minhas mãos tremendo. – Não esquenta. Teoricamente, é o meio mais seguro para viajar. – Virou-se para pegar algo na bolsa. - Tome, esse é um remedinho para dormir. Irá te ajudar.

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