Nostalgia

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17 de fevereiro, terça, 2015
Hoje foi um dia muito chato, diário! Por isso vou te contar um fato que aconteceu comigo quando eu ainda achava que cheguei ao mundo toda boladona carregada por uma cegonha com um cordão de prata ouvindo baile de favela.
Vou contar sobre o primeiro garoto que me apaixonei, e não, não foi o Rafael.
Era uma segunda feira quando minha mãe virou pra mim e me disse que íamos na casa da minha tia, passar uns dias lá, e eu claro disse a ela:
-Nem morta.- Você deve achar estranho uma criança dizer isso, diário, mas eu era meio...Maluca. Na verdade, sou até hoje.
-Vamos, Jully! Vai ser legal! Você vai ver seus primos e seus tios!- Ela tentou me animar, mas a ideia não batia na minha cabeça.
-Eu não quero.
-Então não vou comprar sua casa da Barbie!
-Vou arrumar as malas.
Você pode achar besteira, diário, mas eu era super fã da Barbie, teve um aniversário meu que eu me vesti toda de rosa e escravizei minhas amigas pra que elas pegassem refrigerante pra mim a hora que eu quisesse.
VOOOOOOOOOOOLTANDO A HISTÓRIA:
Eu arrumei minhas malas que por uma incrível coincidência eram da Barbie e coloquei um vestido que também por uma incrível coincidência era da Barbie, coloquei uns óculos rosa que na época eu considerava super fashion e fui na fé.
Nós fomos no nosso carro e eu fui sentada sozinha no banco de trás.
No meio da viagem minha bexiga tava estourando e eu precisava fazer xixi.
-Mãe quero mijar.
-JULLY! Isso são modos de uma mocinha?
-Mãe quero mijar.
Minha mãe revirou os olhos e mandou meu pai parar num posto. Descemos eu e minha mãe. Diário, não sei se você conhece o cheiro de um gambá morto mergulhado em um lixão coberto por ovo podre, mas podemos dizer que o cheiro do banheiro era associado a isso.
O que aconteceu a seguir foi uma das coisas mais vergonhosas da minha vida:
-Jully coloca papel higiênico na borda do vaso.- Minha mãe me orientou. Diário, na minha cabeça de criança que dançava Kelly Key, eu tinha que encher o vaso de papel, e foi isso que eu fiz.
Joguei papel até dentro do vaso e na hora em que fui dar descarga o papel agarrou e entupiu o vaso. Saí de boas e fingi que não tinha acontecido nada.
-Lava a mão e vamos, Jully!- Lavei a mão e pra melhorar eu comecei a gastar o sabonete, GASTAR MUITO! Resumindo: Eu entupi o vaso e acabei com o sabonete líquido.
Depois eu sai como se não tivesse feito nada.
-Tá com fome, meu bem?- Disse papai colocando a mão sobre minha cabeça.
-Tô. Se eu pudesse eu devorava um caminhão com sete bois em cima.- Ele me olhou um pouco assustado e perguntou se eu queria uma coxinha com coca cola e eu falei que sim.
E lá estávamos nós felizes da vida comendo uma comida maravilhosa que iria entupir nossas artérias de gordura, mas ninguém liga mesmo.
Então, uma garçonete chega na nossa mesa e fala:
-O dono do posto quer falar com vocês.- Na minha cabeça nem passou o negócio do papel higiênico e do sabonete, então eu fui na maior cara limpa, quando eu, mamãe e papai chegamos no escritório do moço, ele se levantou e disse:
-Senhor e senhora, me desculpem o incômodo, mas um dos vasos do banheiro foi altamente entupido com papel higiênico e de acordo com as câmeras, a culpada de tudo é a sua filha.
Então eu tive que me defender:
-Moço de Jesus, eu não fiz nada! Eu nem sei embrulhar um presente e eu sou pobre, não tenho dinheiro pra comprar bonecas, minhas bonecas são feitas de palito de picolé...- Minha mãe não me deixou terminar minha mentira e me interrompeu.
-Jully! Para de mentir! Me desculpe, senhor. Tem algo que nós possamos fazer?- Quando mamãe disse aquilo eu senti que ela realmente quis dizer: "Olha aqui, moço, eu não vou fazer nada e se me obrigar a fazer alguma coisa eu te atropelo com um trator."
-Não. Eu só queria deixar essa advertência verbal.- Resumindo ele queria me ver morta.
Depois dessa vergonha, eu, papai e mamãe fomos felizes rumo a casa da minha tia Lúcia. No caminho eu levei umas chineladas, mas nada muito grave.
Quando chegamos na casa da minha tia Joezesvalda, uma manada de crianças pularam em cima de mim, e quando eu digo uma manada quero dizer que foram duas crianças.
-Oi! Meu nome é Gabriela, mas me chama de Gabi!-Disse uma menina moreninha.
-Oi!- Ela era uma pessoa legal, bem animada na verdade. Gostei dela!
-Qual seu nome?- Disse ela animada.
-Samara Maria do Poço.
Ela me olhou assustada mais logo sorriu.
-Samara, esse é meu irmão Antônio Antony!- Ela apontou pra um menino estranho que eu resolvi apelidar com um nome carinhoso.
-Oi, Pereba Perebão.- Ele começou a chorar e minha mãe foi me bater.
-JULLY! EU VOU TE DAR UMA CHINELADA!- Ela correu atrás de mim com um chinelo e eu me escondi numa pedra atrás de um lago.
-Quem é você?- Perguntou um menininho moreno.
-Sou Samara Maria do Poço.
-Qual seu nome de verdade?
Não sei o que me deu, mas resolvi falar a verdade.
-Júlia, Júlia Amélia Mackenzie.- Ele sorriu vitorioso e me deu a mão.
-Levanta daí ou vai ficar toda suja.
-Menino eu não posso, minha mãe quer me bater com um galão de leite.- Vou fazer um resumo rápido do que eu era: Menina chata, mimada, mentirosa e que fazia bullying. Agora, um resumo rápido do que eu me tornei: Uma mulher linda, diva, maravilhosa e #AntiBullying.
-Sua mãe é algum tipo de psicopata?- Ele se ajoelhou ao meu lado e eu já senti meu coração disparar.
-É, ela já roubou o carro do peixe e tentou atropelar meu pai, só que aí...
-JÚLIA AMÉLIA MACKENZIE!- Meu coração parou de bombear sangue na hora, e o engraçado, diário, é que eu lembro que minha mãe quando me viu, jogou o chinelo em mim (Mas não me acertou.)
-Deixa comigo.- Disse o menino moreno e se levantou.
-Ei! Seus dias de atirar galões de leite em crianças acabou!- O menino era doido, só pode!
Minha mãe foi até ele, me puxou pelo braço e quase me ergueu no ar.
-Você não pode fazer isso!- Disse o menino, aí minha mãe enfezou com o moleque.
-MENINO EU VOU TE PEGAR A NOITE!- Preciso dizer que o menino saiu correndo? E até hoje eu não sei o nome dele!
-Vamos voltar!- O caminho inteiro ela ficou me dando sermão, foi um saco!
Quando a gente chegou de volta na casa da tia Lúcia, ela me forçou a pedir desculpas pro Pereba Perebão.
-Desculpa.- Mas tipo, o que eu queria falar foi: "-Pereba Perebão você é uma mariquinha, nunca vai ter uma namorada!"
Ele me deu um sorriso muito escroto e disse que me desculpava.
E nós acabamos virando amigos, e, diário, você acredita que ele se apaixonou por mim?
Um dia nós dois estávamos andando juntos, aí ele vira pra mim e fala:
-Seus olhos são lindos como duas gordas jabuticabas e seu cabelo é como o mel produzido pelas abelhas e seu sorriso é como o marfim.- Eu fiquei meio assustada, mas eu fiquei tocada. Ele foi super romântico comigo.
-Pe-Pe-Pereba, essas sãos as segundas palavras mais lindas que alguém já disse pra mim!
-E quais são as primeiras?
-"A comida tá na mesa."
E esse foi o primeiro amor que eu tive, meio idiota, chato e sem emoção. Mas depois de todos esses anos ele deve ter ficado mais bonito, mais corpulento, é o que eu imagino.
E sabe porque eu te contei toda essa história? Porque no sábado nós vamos visitar minha tia novamente, e isso inclui ver a diva da Gabs de novo e o Pereba Perebão.
Bom, diário, é isso!
Beijos, da sua dona, rainha, diva, maravilhosa, senhora de si, espada de He-man, a criadora da renew: Júlia Amélia Mackenzie, ou Jully ❤️

Diário de uma conquista fracassadaOnde histórias criam vida. Descubra agora