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   — Um pouco depois de Damian e eu termos
nos conhecido. — Ela olha na direção dele e
sorri. — Assim que descobrimos que estávamos
apaixonados.
Como é? Não posso acreditar nisso. No que minha mãe me meteu?
— Tem mais uma coisa... — diz minha
mãe.
Ah, não. Pela forma como a voz dela falhou no fim da frase, posso afirmar que não vou gostar do que vai dizer.
Ela cutuca Damian.
— Vá em frente. Conte a ela.
Ele pigarreia antes de falar.
— Os alunos da Academia não são crianças
normais.

Como se eu não pudesse ter adivinhado algo assim. Pelo menos isso não era tão extraordinário.

— A média de aceitação é menor que 1%.
Nossos padrões de admissão são bem mais
severos do que grande parte das universidades
de elite — diz ele —, e são também
extremamente específicos.

Eu deveria parecer excepcionalmente feliz?Lanço para minha mãe um olhar que quer dizer que não estou agradecendo favor algum. Ela sabe que eu preferia voltar a Los Angeles a ser aceita em alguma escola metida a besta um dia.

— É sério — continua ele —, temos apenas
um critério.
Superpopularidade? Riqueza incomensurável? QI de gênio? Ótimo, vou ser a lerda numa escola de Einsteins.
— Todos os alunos da Academia... — Ele
ajeita a gravata azul-marinho, é a primeira
pista que tenho de que ele está nervoso por me
contar isso. — São... humm, descendentes de
deuses.

O mundo ao meu redor começa a escurecer enquanto encaro a gravata desprezivelmente frouxa de Damian e ouço minha mãe dizer:

— Ah, não, acho que ela vai desmaiar.
Quando dou por mim, Damian está ajoelhado por cima de mim e minha mãe está balançando a bolsa de um jeito frenético na frente da minha cara. Acho que ela está tentando me trazer de volta à vida ao me abanar, mas só consigo pensar que ia doer muito se a bolsa batesse no meu nariz. A bolsa da minha mãe é como a da Mary Poppins — dentro tem muito mais coisas do que seria
possível.
Ouço Damian dizer:
— Ela está recuperando a consciência.
Zenos, recolha a prancha e traga a maca.
Xena?
A bolsa chega tão perto que roça na minha
bochecha.
Espera. Uma maca?
A última coisa de que preciso é chegar à ilha amarrada em uma maca empurrada por uma princesa guerreira fictícia. Não é assim que se causa uma boa impressão — se essa escola idiota tem algo em comum com a Pacific Park, as fofocas circulam com mais rapidez que as gripes.
Não que eu tenha esperança de causar uma boa impressão. Deve ser realmente difícil impressionar alguém que se senta numa mesa
de jantar em frente a Zeus.
Espere, o que estou dizendo? Devo estar em choque. Isso é ridículo. Deve ser uma
pegadinha muito bem-elaborada de Damian. E da minha mãe.
Mas ela disse ter visto provas.
Tudo começa a escurecer de novo quando minha mãe finalmente acerta o meu nariz. E aí dói muito. Aquilo me tira do transe e eu me recomponho, ignorando o zumbido persistente no cérebro.
— Estou bem, de verdade.
Com a mão tento afastar alguns insetos amarelos brilhantes que rondam minha cabeça, mas só depois percebo que eles apenas existem na minha imaginação. Consciente de que minha mãe, Damian e a princesa guerreira que empurra macas terão muito assunto diante do meu comportamento, fecho os olhos e inspiro profundamente três vezes antes de dizer:
— Não preciso de maca, pode dispensar a
Xena.
— Quem? — pergunta minha mãe,
visivelmente desatualizada com a cultura
televisiva.
— Não é Xena — explica Damian —, é
Zenos. O capitão do nosso iate. De alguma maneira, sinto um certo alívio
ao descobrir que ele sabe que alguns
personagens da ficção não são de carne e osso.
— Desculpe — digo. — Eu me enganei. —
Por enquanto, acho que é melhor simplesmente entrar no jogo. Posso tentar argumentar racionalmente com a minha mãe depois, quando estivermos sozinhas. — Agora entendi.
— Abri meus olhos, razoavelmente certa de que
seria capaz de me manter consciente por um
momento. — Xena, ficção. Zeus, realidade.
Entendido.
Minha mãe e Damian trocam olhares que dizem acho-que-a-coitadinha-não-está- acreditando. E eles não estão errados. E quem poderia me culpar, com aquela história de que os deuses gregos existem ricocheteando no meu cérebro? Mereço pelo menos um pouco de flexibilidade quando se trata de misturar realidade e ficção. Talvez se eu tentasse um pouco de lógica científica, minha mãe veria o
quanto tudo aquilo era maluco.
— Então, o que isso significa? — pergunto,
esfregando minha têmpora para parecer que eu
estava realmente considerando acreditar
naquilo tudo. — Todos os estudantes são
imortais?
— Não, não, é claro que não. A
imortalidade é exclusiva dos deuses — diz ele,
dando uma risadinha. Como se essa fosse a
ideia mais louca circulando por ali. — Nós,
descendentes, somos mais parecidos com os
heróis das lendas antigas. Como Aquiles e
Prometeu, temos alguns, humm, super...
— Opa — interrompo. — Nós?
— Damian também é um descendente —
diz minha mãe.
Fecho os olhos e inspiro muito, muito profundamente. Isso só está melhorando.
— Certo. — Balanço as mãos na minha
direção como se quisesse dizer, Vem com tudo.
— Vocês são como... heróis?
— Sim — continua ele. — Como os heróis
sobre os quais você provavelmente já leu, temos graus variados de poderes sobrenaturais. Na maioria dos descendentes, os poderes se manifestam na pré-adolescência, embora existam casos nos quais eles permanecem adormecidos até depois da puberdade.
— É muito impressionante — diz minha mãe, borbulhando de entusiasmo. — Aparentemente existem controles embutidos para proteger o restante do mundo, com os deuses monitorando o uso...
Eu me desligo. Quero dizer, minha mãe
parece mesmo convencida daquilo, e até pouco tempo atrás eu confiava no julgamento dela. Mas esse não é o tipo de coisa fácil de se aceitar. Como se eu, de repente, decidisse que tudo o que aprendi sobre os deuses gregos não fosse simplesmente papo furado da aula de história. Não, era preciso bem mais que a palavra de Damian para que eu movesse os deuses gregos da terra encantada de Papai Noel, lobisomens e Cinderelas para a realidade do dia a dia. Mas mesmo que eu não tenha o hábito de acreditar em "realidades alternativas", como Nola costuma chamar,
estou disposta a manter minha mente aberta. É
claro que vou acreditar que eles existem. Assim
que vir um...
— Ora, ora — diz a garota que acabou de
surgir ao lado de Damian —, vejo que os
bárbaros chegaram.
Quando digo surgir, não quero dizer que ela veio andando até parar ao lado dele. Não, ela surgiu. Como se vinda no nada. Tipo, ela não estava ali e depois estava. Ela se materializou.
É difícil ignorar esse tipo de prova.
— Stella — diz Damian, há uma sugestão
real de advertência no tom de voz dele. — O
que eu contei a você sobre se materializar?

AI, MEUS DEUSES! deTera Lynn Childs (Degustação)Onde histórias criam vida. Descubra agora