VI

28 1 0
                                    

"Não existe?", Annalise sentia-se como se tivesse acabado de levar um soco no estômago. "Como assim não existe? É impossível?"

O homem deu um passo em frente e ela tentou recuar, batendo com as costas contra a superfície de metal atrás de si.

"Não se faça de sonsa, pequena."

Ela não sabia mesmo o que dizer. Jessamine estava apenas inconsciente. Tudo o que lhe injetara fora um remédio para dormir. Uma dose mais forte mas a essência era a mesma. Não a poderia ter matado. Não podia ser culpa dela.

Carlisle caminhou calmamente até ela.

"Não a matei!" exclamou ela apalpando a mesa atrás de si procurando algo, algo com que se pudesse defender. Qualquer coisa. Mas era escusado, tudo o que tinha eram os monitores e o computador, estes sendo demasiado pesados para ela lhes conseguir pegar.

"Então foi tudo uma coincidência? Ela morre, tu apareces?", desta vez não se deu ao trabalho de usar formalidades.

Ela começou a recuar ao longo da mesa enquanto ele se aproximava.

Jessamine nunca acreditara em consequências. Era uma mulher das ciências, tudo tinha uma explicação. Por culpa disso Annalise deu por si à procura de algo, o mais improvável que fosse, que justificasse o sucedido.

Falhou miseravelmente.

"Não, coincidência não.", murmurou pensativa e depois olhou o idoso nos olhos "Mas não vejo como pode isso estar relacionado comigo."

Bateu contra a parede e o seu rosto retorceu-se com a dor por uns momentos. Tinha de encontrar uma maneira de escapar. E quanto mais rápido melhor.

Ele parou a dois passos dela.

"Como o fizeste?", questionou-a num tom de curiosidade.

"Fiz o quê?", respondeu-lhe confusa.

A única resposta que obteve foi uma mão a apontar para si de cima abaixo. Parte de si desejou poder esconder-se. A outra parte encontrava-se já arrependida de se ter metido naquilo.

"Não posso simplesmente ser irmã dela?"

"Não testes a minha paciência. A Jessamine não tem irmãos."

Era verdade...

Annalise suspirou. "Não é uma máscara, se é isso que quer saber."

"Mas como? E com tanta perfeição...", a mente de cientista dele tentava desvendar o mistério. Esticou a mão para lhe tocar e ela esquivou-se e começou a correr até a porta. Abriu-a mas logo a fechou rapidamente quando olhou para o exterior.

Dois homens encontravam-se estacados do outro lado. Altos corpolentos, ela apostava que conseguiam levantá-la do chão só com uma mão.

Percebeu nesse momento o quão estava encurralada.

Dentro do laboratório ele sorriu e caminhou preguiçosamente até ela.
"Não gosto que brinquem comigo.", limitou-se ele a responder como se só essa frase explicasse tudo. Não explicava.

"O que me denunciou?", questionou-o ela caminhando para o lado da sala mais distante dele. Acabou encostada à única outra porta da divisão.

"A Doutora Witschi abomina este local e tudo o que esteja relacionado com ele. Nunca viria cá ter fora das suas horas de serviço."

Ela deveria ter adivinhado que iria falhar em algo do género.

"E eu a pensar que o meu plano era infalível.", notou ela num tom sarcástico enquanto mantinha os olhos postos nele. Este parara de anca encostada à mesa.

"Pena, pensei que fosses uma rapariga inteligente. Mas ainda não me disseste, quem és?"

Annalise pousou uma mão sobre a maçaneta da porta, recordando-se repentinamente da chave e do seu trabalho ainda por terminar.
Apontou para trás de si com a mão livre.

"Respondo se me disser o que está do outro lado desta porta.", negociou e por momentos ela podia jurar que ele hesitou, olhando a superfície pálida atrás dela.

"A Ciência interessa-te, minha querida?", pareceu divertido.

Não a ela, mas a Jessamine, e como interessava a Jessamine, interessava-lhe a si. A diferença é que ela sabia o que era, afinal fosse o que fosse era obra dela, mas não conseguia ver nada em concreto. Eram tudo imagens demasiado confusas para o entender.

"Terei de te matar, se te disser.", ameaçou ele mas ela não cedeu.

Sabia que não tinha outra escolha a não ser continuar a conversar com ele. Jessamine vi-o como um homem calculista, nada do que fazia era por acaso, por isso a password que colocara no computador tinha de ter algum significado.

Talvez algures no meio daquele falatório todo acabasse por descobrir algo que a ajudasse a poder finalmente aceder ao computador.

Então acabaria finalmente o que tinha a fazer e depois iria confirmar se o que ele dissera sobre a doutora era verdade. Talvez ele apenas tivesse inventado isso para a testar. E ela falhara.

Olhou o relógio no seu pulso, passavam quatro minutos das duas da manhã.

Sorriu. As voltas que a noite já dera, já deveria tar de volta ao seu quarto, provavelmente a dormir.

"Tenho pouco medo da morte e muita curiosidade. Pode começar a falar.", disse ela cruzando os braços e olhando o velho doutor que se preparava para começar a falar.

Infelizmente, por mais cansada que se sentisse, parecia que ainda não podia dar a noite por terminada.

OlharesOnde histórias criam vida. Descubra agora