Capítulo 4 Ricardo

9 1 2
                                    

Ricardo

Naquela espécie de consultório improvisado, já Ricardo tinha recebido muitos dos seus utentes, mas nutria por aquele velho homem uma simpatia especial.

O senhor Ernesto no meio da sua solidão, encontrava nas palavras e naquela partilha a explicação para a sua existência.

Contava as suas memórias com a esperança que um dia o neto as lesse, regressa-se à Nazaré e sentisse orgulho no avô que tinha.

- Com que então o Senhor Ernesto apaixonou-se desde tenra idade pela sua Maria- disse-lhe Ricardo.

- A minha Maria, foi sempre a luz dos meus olhos. Tinhamos quinze anos quando nos casámos e não houve um dia das nossas vidas em que fossemos dormir chateados ou amuados como fazem os casais de agora – disse Ernesto.

- Isso é uma boa politica. Ficamos por aqui hoje, Srº Ernesto? Vá pensando no que me quer contar para a semana- referiu Ricardo.

- Sim podemos ficar por aqui, deixe que ainda tenho muita coisa para lhe contar e nas aventuras em que me fui metendo- disse divertido Ernesto.

- Cá estarei para o ouvir, como diz o Rui Veloso...- disse Ricardo.

Despediram-se com um aperto de mão e uma pancadinha no ombro símbolo de uma grande cumplicidade.

Nesse dia Ricardo, recebeu mais algumas pessoas do centro de dia, mas nunca se interessou tanto pelas suas histórias, como se interessava pelas histórias que Ernesto lhe contava.

Ernesto não se lamentava da sua vida, e das doenças que tinha. Ernesto aproveitava para contar a sua vida enquanto era novo e -deixar para a posteridade o que sabia fazer, deixando assim um legado vivo e não um muro de lamentações ou cuscovilhices e irritações.

Ricardo era psicólogo à cerca de cinco anos. Tinha tirado o curso com grande dificuldade financeira. Era trabalhador estudante e sabia bem o que custava a ganhar a vida.

Era oriundo ali mesmo do Montijo, mas sempre soube que era para psicologia que devia seguir. Como os pais não tinham possibilidades de lhes pagar os estudos, Ricardo quando completou o 12º ano, foi trabalhar para um call-center e aos poucos foi estudando ao mesmo tempo.

Quando terminou a licenciatura, quis começar a trabalhar, mas a procura foi árdua, e só encontrou algumas horas ali naquele centro de dia, pelo que simultaneamente a ser psicólogo no centro continuava a trabalhar no call-center.

Vivia juntamente com a sua namorada, sem possibilidades financeiras de se casarem, mas entendiam-se bem e a paixão que os unia, fazia com que qualquer dificuldade passa-se ao lado.

Talvez por isso, Ricardo compreendesse tão bem Ernesto quando falava da sua Maria.

A Maria de Ricardo, ouvia falar daquele homem lá do centro de dia que Ricardo tanto mencionava nas conversas ao jantar, que quase diria que conhecia o pobre homem.

A admiração de Ricardo por Ernesto era pela perseverança com que Ernesto encarava todos os desafios. Por nunca ter desistido de encontrar novas formas de viver cada vez melhor e dar um futuro bom ao seu filho.

No fundo Ricardo identificava-se com ele, nos seus ideais e lutava também por uma vida melhor e por um dia conseguir ter filhos e uma vida mais estável e equilibrada.

Via Ernesto como o avô que nunca tinha tido a oportunidade de conhecer pois já morrera quando ele nasceu e absorvia cada ensinamento como uma verdadeira lição de vida.

Estava muito envolvido naquela história, como se da leitura de um livro se tratasse. Estava intrigado, queria conhecer que mais coisas tinha Ernesto para lhe contar e todas as semanas era com grande prazer que ali voltava uma e outra vez para conhecer aquele velho homem, que se revelava a cada semana uma caixinha de surpresas.

Dizia-lhe sempre que tinha grandes histórias ainda por contar e Ricardo estava em suspenso, como que a morrer de curiosidade por saber o que aquele lobo do mar tinha para lhe contar.

O velho lobo do marOnde histórias criam vida. Descubra agora