Decidimos ir andando até a casa de Cassey, no caminho paramos pra eu beber água e comer uma banana nanica, alimento que alivia o enjôo por causa do potássio e a vitamina B6. Tentei explicar porque ficamos enjoados e vomitamos, mas Cassey não ficou nem um pouco interessada. Na verdade foi a primeira vez no caminho todo que ela conseguiu tirar os olhos do celular e me encarar.
– Alice eu vou te dizer isso por que sou sua amiga: Pare de falar sobre ciência! – Ela gritou a última frase e ao ver minha expressão de desapontamento ela voltou a abaixar o tom da voz – Não que não seja super legal esses fatos aleatórios que você adora comentar, mas fica difícil pra gente, meros mortais, acompanhar os seus assuntos.
– Sei. – bebi um gole de água.
Voltamos a caminhar e eu avistei uma lixeira a alguns metros de distância. Me preparei para lançar a casca de banana e... Cesta. Procurei Cassey para comemorar, mas ela tinha voltado a digitar furiosamente no celular.
– O que está acontecendo aí?
– Há – ela riu para o celular – Eu não posso contar.
– Como assim não pode me contar? – andei mais rápido para ficar ao seu lado. – Eu sou sua melhor amiga.
– Por isso mesmo. Você é péssima em guardar segredos.
– Isso é completamente... – comecei, mas Cassey me lançou um olhar de "nem adianta tentar" – Não, ok você está certa.
Não que eu seja uma fofoqueira de plantão, mas segredos me deixam nervosa. E como se o meu cérebro dissesse "fale de qualquer coisa menos do que não é pra contar" então tudo o que eu conseguia pensar era o segredo em si. Quando eu fico nervosa eu tenho tendência a falar muito, e bem rápido então minha boca e mente nunca estavam em boa sintonia.
– Só me diz que isso não tem nada a ver com os planos de hoje. – pedi
– Eu também não posso dizer isso.
De acordo com os planos da "operação" estávamos programadas para sair nove horas em ponto, porém chegamos na casa da Cassey oito e quarenta e se tem pessoas mais enroladas na hora de sair, essas pessoas são Cassey e eu. Antes de subir pra tomar banho no banheiro de Joana, Liv mandou uma mensagem dizendo que já estava "produzida" e a caminho.
– Produzida? – eu perguntei pra Cassey achando estranha a escolha da palavra.
– Ela também vai a caráter. – Cassey digitou uma ultima mensagem no celular e o guardou no bolso. – Vamos, anda. – ela me empurrou escada a cima.
Depois do banho, vesti as roupas que Cassey havia separado pra mim, o mesmo vestido azul claro de rendinhas que experimentei da última vez, um cinto branco e agora pra completar o look uma sapatilha preta com lacinhos nas pontas. Não era bem uma fantasia, era só um estilo inspirado no desenho da Alice, não tinha como ser algo a caráter.
Pela primeira vez nesses dois dias fiquei feliz de verdade ao saber que pelo menos não ia chamar muita atenção. Completamente presa no meu próprio mundo esqueci de me preocupar com o que as outras meninas iriam vestir. Quando entrei no quarto de Cassey subitamente entendi tudo. Ela estava com um vestido vermelho rodado com um grande decote em v, um cinto preto com a fivela de coração, um salto alto que a deixava uma cabeça inteira mais alta que eu e é claro uma coroa.
– Não. – eu disse incrédula segurando um sorriso – É claro que você tinha que ser a rainha de copas!
– Por favor, se dirija a mim apenas por vossa majestade. – ela usou um tom refinado e depois caiu no riso.
– Você tá linda Cassey. – eu disse olhando mais de perto o visual.
Seus cabelos longos estavam soltos e ondulados naturalmente, a maquiagem foi feita com o objetivo de dar a ela um ar de realeza e deu muito certo.
– Você tem que me emprestar esse batom. – eu pedi.
– Um dia. – ela disse enigmática – Senta aí, agora vamos fazer a sua.
– Não é como se a gente tivesse hora mesmo... – Dei de ombros e obedeci.
A minha maquiagem diferente da de Cassey ficou mais romântica, com alguns toques rosados, a fita prendia meus cabelos que também estavam ondulados e me dava um ar mais jovem. Eu teria deixado a maquiagem daquele jeito mais básico, mas Cassey se certificou de fazer os meus lábios se destacarem mais, de acordo com ela isso chamaria a atenção dos garotos, eu não recusei.
Mergulhamos na caixa de jóias de Cassey e experimentamos brincos, pulseiras, colares... A maioria a gente só pegava pra falar que ficaria ótimo com outra roupa, em outras ocasiões. (Por que será que a gente nunca consegue sair na hora certa?). Decidimos não exagerar, e acabei escolhendo uma pulseira de bolinhas brancas, um par de brincos combinando e uma bolsinha. Cassey já usava uma coroa, então ela pegou leve na escolha dos acessórios.
Depois de algumas centenas de fotos na frente do espelho Joana apareceu vestida de Branca de Neve, ai foram mais algumas dezenas de caretas e poses pra fotos. Só depois de já termos perdido toda a nossa cota de criatividade de poses Joana falou o que veio fazer no quarto.
– A liv ta lá na sala esperando.
Cassey e eu nos entreolhamos assustadas pensando a mesma coisa: "Que horas são?" E descemos rapidamente as escadas.
Como a maioria de toda a população nessa época do ano, Dafne também daria uma festa hoje. Quando descemos vimos que alguns convidados já estavam lá e entre adultos de meia idade e crianças da escola de Joana estava Liv. Ela levantou do sofá com um pulo quando nos viu. Ela estava com um vestido roxo com mangas ¾ listradas, um salto tão alto quanto o de Cassey roxo e usava um boné com orelhas de gato que combinava com o vestido. O que me surpreendeu não foi o fato de Liv ter escolhido a fantasia do gato de cheshire, e sim o vestido.
– Liv você está usando um vestido! – olhei dela pra Cassey de boca aberta – Ela ta usando um vestido. – me certifiquei se Cassey tinha entendido.
Liv deu uma voltinha pra mostrar a "produção".
– Legal, né? – disse Cassey.
– Você sabia disso? Por que não me contou? – eu dei batidinhas raivosas no seu braço – Isso faz parte do que você estava tramando pelo celular hoje a...
Não pude terminar de dizer porquê as duas ficaram fazendo sinal de silêncio.
– O que você está tramando Cassandra? – o sensor de materno de Dafne deve ter apitado porque mesmo entre o barulho das pessoas conversando e a música ela conseguiu ouvir.
– Nada mãe, a gente só vai se divertir um pouco. Relaxa. – assegurou Cassey.
– Não é pra chegar muito tarde. Nenhuma de vocês. – ela advertiu.
– Eu sei... – Cassey revirou os olhos, Dafne não viu – Podemos pegar o carro?
Dafne vestida de mulher gato veio andando lentamente até nós com o chaveiro nas mãos.
– Você sabe as regras. Sem comida, não estacione no meio da rua...
– Sei, sei... Sem arranhões, sem apostar pegas nos sinais. Nossa você é tão super protetora.
Dafne riu e olhou pra todas nós arrumadas pra sair. Eu senti que ela queria dizer alguma coisa do tipo sentimental, mas mudou de idéia e simplesmente disse:
– Cuida dela Alice, você é a mais responsável do bando.
Eu sorri com orgulho e segui minhas amigas.
– Divirtam-se – Dafne se despediu antes de fecharmos a porta.
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Operação primeiro beijo
Novela JuvenilNa pequena cidade onde mora Alice Heliodoro, as peças de teatro são muito bem-vindas entre os moradores. Quando a peça mais aguardada do ano é passada para a aspirante de direção Dóris, ela começa a inovar nas produções para superar o idolatrado dir...