Capítulo dois

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Quando o ensaio terminou, saímos do teatro o mais rápido possível sem dar qualquer oportunidade a Dores de querer fazer mais alguma mudança de última hora. Passar cinco horas em cima de um salto alto havia destruído meus pés, que passaram a maior parte da vida acostumados com o conforto que só um all-star poderia oferecer. Dei graças aos céus quando vi o Crossfox amarelo ovo da mãe de Cassey estacionado logo em frente ao edifício, de jeito nenhum eu ia conseguir andar os 650 metros até o ponto de ônibus.

Assim que Dafne me avistou eu acenei para ela que me retribuiu com um sorriso.

– Nunca pensei que um dia eu ia ficar feliz em ver esse carro. – Cassey falou ao me lado.

A mãe de Cassey, Dafne, é tão diferente da filha como a lua e do sol. Com cabelos loiros e enrolados em cachos perfeitos Dafne parece muito mais jovem do que aparenta, muitas vezes as pessoas a confundem como irmã de Cassey o que a deixa muito irritada. Já Cassey tem os cabelos pretos e lisos, e olhos azuis quase verdes, quando criança isso a deixava com uma aparência quase angelical. Isso até ela completar dezoito anos e tingir uma mecha do cabelo de amarelo e fazer uma tatuagem de pauta musical no braço direito, que ia do pulso até perto do cotovelo.

Durante a fase rebelde de Cassey, Dafne deu o maior apoio. Ela faz o tipo mãe legal mas, sem forçar a barra. Antes de fazer a tatuagem ela se certificou se o lugar era adequado, pesquisou na internet sobre o procedimento e foi com ela no dia. Quando percebeu que não era nada de mais, sugeriu que a filha colocasse um piercing na sobrancelha também, mas Cassey não quis. Se eu voltasse pra casa com um buraco na cara, eu não teria mais cara pra fazer buraco nenhum.

– Como foi o ensaio? – Dafne perguntou assim que chegamos perto.

Soltei um gemido choroso que estava preso na minha garganta e abracei Cassey. Não precisava olhar pra saber que Dafne estava franzindo o rosto sem entender nada.

– Mãe, a Aly pode dormir lá em casa hoje? – ela perguntou dando tapinhas nas minhas costas.

– Tão mal assim, é? O que aconteceu?

Soltei Cassey e respirei fundo.

– Não aconteceu ainda, esse é o problema. – disse irritada – Sabe, esse tipo de coisa não acontece assim, tem que ser conversado, planejado e...

– Acho melhor a gente conversar em casa. – Disse Cassey apontando com a cabeça o grupo de pessoas que ainda saiam do teatro.

Fiquei em silêncio a maior parte do caminho, as duas no banco da frente entraram em uma conversa sobre o trabalho de Dafne e eu parei de prestar atenção. Na minha cabeça eu revi todos os acontecimentos da última hora, pensei em várias coisas que podia ter dito para evitar a situação e depois pensei em que desculpa inventar pra sair daquela. Paramos em um sinal vermelho e Cassey conseguiu me trazer de volta quando aumentou o volume do rádio.

– Aly, essa é pra você! – Cassey virou o rosto para trás me assustando.

– "So tell me girl if every time we...(Então me diga garota se toda a vez que agente...)" – Saiu a voz pelo rádio e Cassey se juntou a música.

Ela cantava alto fazendo as pessoas nos outros carros olharem pra nós. Sua voz melodiosa foi o motivo dela ter entrado para o teatro mesmo sem gostar de atuar.

Foi a música que nós uniu. Quando tínhamos sete anos de idade participávamos do coral infantil da igreja. Cassey cantava na primeira fila enquanto eu ficava encolhida algumas fileiras atrás. Depois das apresentações todas as crianças eram liberadas para brincar em um parquinho nos fundos mas, Cassey nunca estava lá. Certo dia eu descobri que ela pulava a janela da sala de música pra tocar piano, e foi assim que nós conhecemos. Sempre admirei a sua ousadia de fazer e acontecer sem se importar com ninguém. Embora essa mesma ousadia fosse um motivo constante para a maioria das nossas brigas.

Operação primeiro beijoOnde histórias criam vida. Descubra agora