- Mãe, vamos embora! - Eu tinha quatro anos de idade quando aconteceu.
- Por que, filho? Não tá gostando? - Surpresa é pouco. Minha mãe estava era indignada. Eu adorava praia. E fiz o pedido
bem na hora em que estávamos na água, com a espuma do resto das ondas batendo nas canelas.
- Tô gostando sim, mas já tá quase fechando.
- Fechando o quê?
- A praia!
- Acha, filhote! Fechar a praia?
- É! Olha lá o homem de boné laranja com a vassoura. Tá na calçada, varrendo. Tem até carrinho pra pegar o lixo. Já já ele vem aqui pedir pra gente ir embora. Ele tá limpando a praia e vai fechar depois.
Eu imaginava que a praia fosse igual clube onde, à tardezinha, o sol indo embora, eu ficava triste. Era a hora que ia fechar. Não podia mais ficar na piscina.
- Vamos, Gabriel?
- Ah, mãe... só mais um pouquinho!
- Só mais dois minutos, hein? Olha lá: o rapaz já tá chegando para limpar a piscina. - E apontava para um cara uniformizado,
que trazia uma máquina esquisita, toda cheia de canos e acessórios de limpeza dentro de um balde.
Ela continuou na água, junto comigo, e explicou que praia não fecha, mas eu duvidei. Imaginei um bando de adultos
chegando, instalando cerca móvel e pendurando uma placa gigante, com letras vermelhas, bem brilhantes, escrito "fechado". Só fui desistir desta ideia quando, semanas depois, notei um programa de TV mostrando luau na praia.
- Vem ver, mãe! - gritei para ela, que estava na cozinha.
- Ver o quê, Gabriel? - ela me olhou lá na sala, sem deixar de lado o que fazia na pia. Era pastel.
- Olha só! Estas pessoas estão na praia!
- Ué, e daí?
- Daí que é de noite!
- É sim.
- Não pode! - Fiquei indignado com a cena.
- Não pode por quê, Gabriel?
- Porque a praia fica fechada! Será que eles pularam o muro?
- Filho, eu já te expliquei - dizia ela rindo - a praia não fecha!
- Mas e o sapo?
- Que sapo, menino?
- O sapo que passa por lá à noite! Vai pegá-los!
- Que sapo, que nada! Eles estão na areia! Sapo não vai na areia, Gabriel!
- Isso não é justo!
- O quê?
- Ah, caramba - comecei a choramingar - toda vez que fica "de noite" você manda eu voltar para casa, falando que é perigoso
o sapo me pegar! Eu não posso brincar na rua quando é "de noite". Mas esse povo aí pode ficar na praia! - Disse, revoltado, com o dedo em riste, apontando para a TV naquele
que foi o primeiro protesto (falado!) de que lembro ter feito na vida.
- Eles são adultos, meu filho. Quando você for adulto, vai poder ficar onde quiser. Na praia, no clube, na rua... mas criança não pode. - Depois do primeiro protesto, roguei a
primeira praga:
- Eu vou torcer para o homem do saco passar lá e pegar todo mundo! Nem vai caber tudo no saco. Ele vai ter que ir de trator!
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Franja, ki-chute e estilingue
Historia CortaO "Franja" é uma coleção de memórias de minha infância. Conto sobre a desilusão que tive ao participar de gravação do Xou da Xuxa, travessuras na escola, devaneios infantis, entre outros temas. Escrevi, inicialmente, para treinar a escrita e a memó...