Nas andanças pela cidade, tenho observado o comportamento dos vendedores, atendentes e trabalhadores que lidam com o público. Por ter formação em gestão da qualidade, aprendi, como um mantra, que o atendimento ao cliente é uma das principais chaves para o sucesso de um negócio. Contudo, infelizmente, entrar em um estabelecimento, seja ele qual for, e ser tratado com o mínimo de educação tem se tornado cada vez mais raro.
A situação é tão absurda que, outro dia, quase paguei muito mais caro por um produto, pelo simples fato de ter encontrado uma vendedora simpaticamente disposta a atender bem. Mas, devido ao período de vacas magras, precisei optar por comprar o mesmo produto, por um preço menor, com uma atendente que se quer olhou na minha cara.
O que mais assusta é que, a cada dia, tenho a impressão de que as pessoas estão cada vez mais mal-humoradas em seus ambientes de trabalho. Parece que foram contaminadas por algum vírus que as fazem ficar insatisfeitas.
Não pretendo criar um texto sobre a forma como as pessoas devem agir na labuta. Deixo isso para meus nobres amigos da área de gestão de pessoal. Porém, gostaria de refletir sobre as possíveis causas individuais para tanto mau-humor. Procuro justificar, ainda que mentalmente, as razões para tal, pois uma coisa é certa: não é pessoal. Por trás daquele "não sorriso"; "não levantar de olhos"; "não gentileza"; "não cuidado", existe um ser humano, com sonhos, desejos e planos, como qualquer outro. Fico imaginando: será que ganha pouco? Sofre pressão do chefe?Divide seu tempo entre trabalho-curso-casa? Será que mora longe e perde horas no trânsito? Será que enfrenta conduções lotadas, como metrô e trem e já não aguenta mais?
A não ser que questionemos, nunca saberemos o real motivo para uma cara emburrada no trabalho. Certo amigo contou que ao passar pelo caixa de um mercado, notou a grosseria da atendente e por curiosidade, indagou à moça se havia acontecido alguma coisa, se estava tudo bem. Qual não foi a surpresa, quando a mulher começou a falar sobre alguns dos seus problemas pessoais.
Ah! Os problemas nossos de cada dia... Se fizermos um balanço, metade são causados por nossas más escolhas e a outra, por escolhas dos outros que acabam por nos atingir, afinal, vivemos em sociedade.
Estava lendo um artigo que citava um trecho do livro A Música das Esferas: "Cada átomo, assim como cada sol e lua, através de movimento incessante, sob as leis da harmonia eterna, está lutando por equilíbrio. O homem sofre apenas porque ele está fora de harmonia consigo mesmo, com a Natureza e com a fonte eterna de seu próprio ser... São esses desacordes (ou desacordos) que abafam a Música das Esferas, e nós somos tão atentos sobre nossos próprios desacordes e tão ligados em nosso próprio desempenho, que ficamos surdos para a sinfonia da vida colocada diante de nós."
Tanto a caixa do supermercado quanto os outros atendentes que tenho encontrado pelo caminho, andam em desarmonia com alguma coisa. Mas será que vale a pena continuar vivendo dessa forma? Qual o sentido da vida se na maior parte dela, as pessoas estão levando como zumbis?
Enfim, enquanto a resposta não aparece, o jeito é continuar procurando um bom atendimento, como um garimpeiro em busca da sua pedra preciosa em plena cidade grande.
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Crônicas Urbanas
Non-FictionHistórias de quem vive e sobrevive na cidade, contadas por duas amigas que moram em diferentes cantos do Rio de Janeiro.