(este conto aborda temáticas fortes, por isso é importante que o leitor esteja preparado emocionalmente, e saiba que a autora que o escreveu não pretende incentivar quaisquer práticas aqui retratadas, é uma leitura de reflexão e identificação) Boa leitura!
Lágrimas, desespero solidão, era tudo que o cérebro de Anna gritava, enquanto seu rosto exibia um sorriso puro, quase genuíno, mas que funcionava apenas como uma máscara para a escuridão de seus sentimentos.
Todo dia sua vida seguia um cronograma. Levantava-se, ia para escola, tomava café da manhã, tudo muito simples, e tão frustrante que parecia impossível colocar em palavras. Talvez os professores não conseguissem entender o peso da carga emocional que depositavam nos ombros de crianças adultas, mas eles o faziam.
Todos os dias ensinavam, ou mais matérias que seriam necessárias para o vestibular, ou discussões pesadas como a pobreza, os dispositivos capitalistas, a manipulação da mídia, e tantas outras que era difícil acreditar que o mundo poderia ser bom.
Mas a culpa não era apenas deles. Os alunos também pareciam não entender, sempre encarando o magistério com um semblante tedioso, como se tudo fosse palavras vazias e aquilo não tocasse seus frios corações.
Ninguém parecia entender. Nem mesmo a família e amigos de Anna. Seu sofrimento passava despercebido por quem quer que estivesse ao redor, e isso também era frustrante.
Quando suas lágrimas pesadas escorriam pelo cinto de segurança, ou pelos lençóis da cama, e até em seus matérias escolares ninguém preocupava-se em lhe perguntar o que estava acontecendo. E mesmo que ela soubesse que não tinha o direito de julgá-los, já que ela mesma não se abria, não havia vontade alguma de se expressar.
Anna sentia que seu sofrimento interior era tão pequeno comparado a fome na África, aos refugiados da Guerra da Síria, aos enfermos dos hospitais, que preferia ficar calada para não ser julgada pela pequenez de sua angustia. Mas paradoxalmente sua angustia estava intimamente ligada com todas as causas sociais.
Muito além disso, suas frustrações estavam ligadas ao tempo, o qual passava tão rápido, mas muitas vezes ela não sabia o que fazer com ele. Só sabia que gostaria de ficar o mais longe possível de suas responsabilidades.
O sentimento que a assolava estava incrustado em todas as partes internas de seu corpo. Quase como se seu coração fosse uma bomba de angustia e distribuísse o veneno por sua corrente sanguínea. Mas seu sorriso estava lá, inabalável, para que ninguém desconfiasse ou a julgasse por seu desencanto pelo mundo.
Anna era o Atlas da mitologia grega, ou talvez o eu-lírico do poema de Carlos Drummond, pelo menos se sentia dessa forma, esmagada pelo céu e por todos os desastres da humanidade.
Um dia, que não apresentava nenhuma novidade, e era apenas mais um como todos os outros, Anna viu um Andorinha passando por sua escola. Talvez, se Anna não estivesse tão sozinha por ter brigado com sua família e amigos naquele dia, ela nem teria notado o pássaro, mas ela o fez. E a liberdade da Andorinha a encantou tanto que não pode deixar de segui-la até que não pudesse mais.
O pássaro foi andando para cima, cada vez mais alto e Anna a seguia pelas escadas da escola, as quais levavam para uma pequena sacada perto das salas de aula do terceiro colegial.
Até que a Andorinha posou. Posou no muro que cercava a sacada florida. E Anna parou para observá-la. Sentou no muro e ficou em silêncio, só ouvindo o vento carregar as folhas das árvores.
Quando focou seu olhar para o horizonte, entretanto, ficou surpresa ao notar que ao contrário de todas as outras vezes que passara pelo local, o lugar a embalava de maneira distinta, e mesmo tentando de todas as formas, não conseguia enxergar o que estava a sua frente.
Depois disso, tudo aconteceu muito rápido. A Andorinha começou a bater as asas, e levantar vôo.
Algo inédito aconteceu.
O vôo da Andorinha, que antes era ilimitado, passou a ser finito, e cessou ao som do suspiro de Anna.
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Crônicas de uma adolescente em crise
PoesiaNos piores momentos, durante a noite, imersa numa angustia e reflexões sobre a vida, uma garota prefere trocar o diário por crônicas poéticas. Prefere contar o que sente dessa maneira, e tentar metaforizar seus sentimentos, para que suas emoções sej...