Contos Da História Sem Fim

III

Faziam apenas alguns minutos que Xyuniytsu entrara pela boca do ogro e já sentia náuseas, suas asas e seu pequeno corpo estavam úmidos dificultando o seu vôo.
A chama da lamparina que flutuava ao seu redor atiçou-se com um movimento da mão da fada, mas mesmo assim ainda era difícil de enxergar, ela deixava para trás um rastro luminoso demarcando o caminho até a boca do ogro colossal, apesar de ter asas Xyuniytsu tinha um péssimo senso de direção.
Ela quase conseguia farejar o ouro, mas a cada centímetro percorrido ficava mais difícil evitar os órgãos internos do monstro, foi quando ela bateu em uma artéria renal, próxima ao coração, e ficou presa em uma espécie de gosma que envolvia todos os órgãos do ogro. A lamparina caiu e se perdeu. Xyuniytsu esfregou as mãos uma na outra e quando as separou novamente criou uma bola de calor, repetiu o processo até que a bola ficasse grande e então atirou-a contra a gosma gerando uma pequena explosão, daí libertou-se. A escuridão que se fez após a queda da lamparina fez a fada perceber um brilho incomum vindo de dentro da artéria, a gema estava dentro da veia, Xyuniytsu abriu um sorriso ganancioso e sacou uma navalha minúscula de dentro da bolsa, estalou os dedos e fez a navalha dobrar de tamanho até ficar maior do que ela própria, então fez-a levitar até a veia e abrir um pequeno corte na área em que ela havia explodido a gosma presente naquele órgão, para a alegria da fadinha a veia estava entupida de ouro, era uma gema tão grande que ela teve de rasgar a artéria quase por inteiro para retirá-la, depois, Xyuni costurou a veia inteira com magia, ela estava tão feliz que considerou aquele ato como uma quitação de débito com o ogro, jamais considerando que não haveria corte algum se ela e seus amigos não tivessem interferido.
A fada cobriu a gema com algum tipo de pó que ela soltava pelas mãos, o ouro pareceu ficar tão leve quanto uma pena e Xyuniytsu facilmente o fez flutuar na frente percorrendo o caminho luminoso, ela já estava pronta para sair daquele lugar quando ouviu alguém gritando:

- Honrado seja o grande caçador! Que a honra seja dada ao grande caçador!

Curiosa, como sempre, decidiu perseguir a voz e descobrir quem mais estaria dentro de um ogro colossal.

- Lá está o ouro! - exclamou Zaid ao ver a gema sair flutuando pela boca do ogro - Mas onde é que está Xyuni?

Os abafadores não permitiam que eles se comunicassem, Graham estava imaginando se já podia parar de tocar. Santouro aproximou-se da grandiosa pedra de ouro que chegava a ter a mesma altura dele, assim que o minotauro pôde encostar o primeiro dedo na gema a magia se desfez e a pedra caiu na grama fofa, era tão bem polida que parecia que havia acabado de sair da oficina de um ferreiro experiente, tão fascinante como as histórias previam. Os dois começaram a pensar em uma maneira de transportar o ouro enquanto Graham continuava incansavelmente a tocar, as notas já estavam saindo mais distorcidas, esse tipo de encantamento não era o forte do fauno, apesar de geralmente precisar apenas de algumas notas para adormecer o oponente por horas Graham sabia que se parasse de tocar não teria mais efeito sobre o ogro colossal, o fato do fauno ser filho de um casal mestiço atrapalhava seu avanço em qualquer magia usada por Faunos de puro sangue.

- O ovo dourado será minha coroa, já sou mais forte que Athos, ele passou na prova aos 13 anos! Lento, lento! Eu já passei! Queria que todos soubessem que superei meu irmão! Papai ficaria orgulhoso... - repetia Luki desesperançoso, mas firme.

As palavras ecoavam pelo estômago escuro e frio, o grande navio já estava para afundar, seu casco estava quase que completamente deteriorado. Uma pequena fonte de luz surgiu fazendo Luki sair de seu monólogo e olhar para cima.

- Quem esta aí? - gritou Xyuni
- Sou o grande caçador Luki Hagaza! - gritou de volta - Quem é você?

Xyuni aproximou-se mais do menino ignorando completamente sua pergunta até que avistou o ovo de dragão de pluma do sul, ela encontrara outra preciosidade.

- Mas que tipo de ser é você? - perguntou Luki encantado com a pequena fada - nunca vi nada tão bonito!
- Ei menino, onde achou esse ovo?
- Eu o peguei! - exclamou ele orgulhoso.
- Mentiroso! Um baixinho como você não conseguiria pegar um ovo de dragão!
- Olha quem fala, mal chega a ser maior que minha maçã!
- Ah, tanto faz! Seja bonzinho e me entregue o ovo, e quem sabe eu te tire daqui.
- NUNCA! - gritou ele abraçando-se ao ovo - nem que eu morra, não entrego!

A fada rangeu os dentes de raiva ao ouvir a birra de Luki.

- Ora, você não tem escolha! Acha que este ouro é mais importante que sua vida?! - argumentou Xyuni nervosa.
- NÃO ENTREGO!

Ela ficou toda vermelha e vôou de lá para cá claramente irritada com Luki, Xyuniytsu é muito mimada e não aceita quando as coisas não acontecem do jeito dela.

- Se não quer ser salvo não vou te salvar, mas o ovo é meu!! - berrou a fadinha cobrindo o ovo com seu pó.
- Sai daqui sua barata velha, fique longe do meu ovo!! - gritou ele deixando-a ainda mais nervosa.

O ovo de ouro escorregou dos braços de Luki e flutuou para além de seu alcance junto com a fada

- Adeus menino suicida! - gritou Xyuniytsu dando tapinhas em suas nádegas e mostrando a língua.
- Ah, mas você não vai embora mesmo!

Luki pegou o estilingue e as pedrinhas, mirou no único brilho que era emitido naquele espaço e disparou certeiramente na pequena fada, atirou até que não sobrasse pedra alguma, Xyuniytsu não conseguia nem ver as pedras, quanto mais desviar delas, logo não aguentou mais manter vôo e despencou em puro suco gástrico, deixando o ovo flutuante e o menino suicida na superfície.
Sem pensar duas vezes Luki saltou do navio mergulhando no líquido atrás daquela pequena criatura.