Crônicas do fim: A queda da Lua

Um homem forte

Algumas (19,5) centenas de anos antes...

[Jingle de plantão com notícia urgente]... − Em poucos minutos subirá à tribuna do congresso nacional um dos mais importantes cientistas da atualidade para falar sobre os mais recentes resultados de seu estudo denominado "cúpulas humanas". Esta tese foi aclamada pelos maiores cientistas do mundo como a última chance de perpetuação de nossa espécie. Dentro de instantes transmitiremos ao vivo seu discurso e traremos maiores detalhes do projeto e de possibilidades de sobrevivência...

Exceto pelo senado, é claro, poucas pessoas foram convidadas a participar do discurso do doutor River Rony, a pedido dele. Três emissoras de televisão e duas de rádio puderam enviar um repórter e dois técnicos cada. A primeira ministra Adriana foi convocada, mas não podia levar familiares ou seguranças. Poucas das cadeiras restantes estavam ocupadas por colegas cientistas que contribuíram com suas pesquisas. Não devia ter mais do que cem pessoas no congresso.

−Mais uma vez a música de plantão, será que já vai começar? − Perguntou André, ansioso.

Teria obtido alguma resposta se as pessoas do lado de fora do congresso não tivessem toda a atenção voltada para o telão que fora montado ali mesmo. André era um jovem cientista que acabara de se formar. Terminou a faculdade um ano mais cedo devido ao grande destaque conquistado em seus anos iniciais. Fora convidado para ser cientista júnior e, dois anos antes do contrato vencer, já trabalhava como cientista sênior na mesma faculdade onde estudara. André era jovem, não passava dos 25 anos.

−O doutor River Rony já está posicionado na tribuna. Iniciará seu discurso em instantes. Acreditamos que trará novidades. −explica a repórter, representante do canal 5. −Aguardamos o início de seu pronunciamento a qualquer momento.

O doutor era um homem forte. Servira o exército na juventude. Teve grande destaque em sua turma de formação e posteriormente no treinamento de tiro. Entrou para a equipe de tiro avançado um ano antes do previsto, dispensando todas as burocracias envolvidas. Recebeu o convite diretamente do general em exercício na época. Depois disso, errou apenas dois tiros na vida. Negro, alto e de olhos claros, usava um terno azul, com camisa branca de seda nesse dia.

Precisamente as 19:00 h, horário marcado com toda a imprensa, abriu seu discurso dizendo:

− Boa noite nação amada, mundo querido. −Não se as pessoas quando usava a palavra "mundo", mas sim aos animais, plantas... −Boa noite excelentíssimos senhores senadores, obrigado por disponibilizarem um pequeno intervalo do precioso tempo de que dispõe. Boa noite senhora Primeira Ministra e imprensa local que pôde comparecer.

Falava lentamente, tinha voz arrastada e se demorava um pouco nos sons acentuados de "r" e "s". Ainda assim, cada palavra soava mais elegante que a anterior.

− Para não ocupar-lhes um tempo que poderiam usar para cuidar de qualquer outro assunto, pretendo ser o mais direto possível.

A sessão estava sendo transmitida e traduzida em tempo real para todos os idiomas de países participantes da ONU. Toda essa apreensão se devia a um único fato:

− Estamos fadados a extinção! − Afirmou o doutor.

− Com um homem como o senhor a frente das pesquisas, eu duvido muito! −Exclamou em alta voz André, mas não fora ouvido.

− A equipe aqui presente trabalhou por mais de 15 anos elaborando as hipóteses de "cúpulas humanas". Somente depois disso me inteirei do projeto e quis participar da demonstração de cada hipótese e da elaboração das outras. Levamos 15 anos para isso.