Boa menina

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Dois meses se passaram e Doug continuou me evitando.

Não ligava mais para ele então estava cagando e andando para isso.

Rita estava fazendo 10 anos naquela tarde de domingo. A festa dela não seria comemorada. Aliás estamos em um hospício. Ela, como sempre estava sem ânimo algum, eu prometi a ela que passaria mais tarde em seu quarto para cantar os parabéns. Mas ela só balançou a cabeça e saiu.

A tarde estava demorando a passar, então resolvi ir falar com ela mais cedo do que o combinado.

Bato na porta porta do quarto dela três vezes. Ela demora a atender.

Quando ela finalmente atende vejo sua expressão cansada e sua boca sangrando por ser muito ressecada.

- Posso entrar ? - pergunto soltando um sorriso sem mostrar os dentes.
Ela revira os olhos e me dá espaço para entrar.

O quarto dela é mais arrumado do que o meu. Uma garota de 10 anos saber arrumar o quarto igual a uma design, era muita coisa pra mim acreditar.

- Uau, quem arruma isso pra você ? - pergunto encantada com a organização que era aquele quarto.
- Eu - ela responde sem emoção.
- Você ? Sério? - pergunto.
- Tem muitas coisas sobre mim que você não sabe. - ela diz. E sinceramente isso me deixa muito curiosa e ao mesmo tempo assustada. Como uma simples menina ruiva consegue botar tanto mistério em uma simples frase.?

- Você tá certa, não sei mesmo - digo me sentindo na cama dela.
- Levanta - ela diz aumentando a voz.
Me levanto rapidamente.
- Desculpa eu não sabia. Desculpa mesmo - digo.
- Tudo bem, é que eu zelo pelas minhas coisas. - ela diz.

Fico observando o quarto dela é me dou o direto de perguntar.

- Você está aqui a quanto tempo ?

Ela tira um post da parede e atrás do post que ela havia tirado tinha um monte de palitinho, contando os dias em que Rita estava aqui.

- Eu risco um palitinho a cada dia que passa. - ela diz

Meu raciocínio é lento demais para contar rapidamente todos os palitinhos da parede.

- Quantos dias que são aí ?

- 389 - ela diz.
- E eu achando ruim os poucos dias que eu tô. Eu queria ir embora, desde que beijei o Doug.. - eu ia terminar a frase mais aí lembrei de que ela só tinha 10 anos.

Merda acabei de contar para uma criança sobre meu beijo com Doug.

- Doug... E ele ainda gosta de você ? - ela pergunta se interessando no que eu disse.

Me deu um certo receio de contar da minha vida para Rita, mas não liguei. O que ela poderia fazer afinal ?

- Não. - digo
- Ata por que se você falasse que sim eu ia achar estranho. - ela diz. E me deixa curiosa.
- Como assim ? - pergunto me aproximando dela.
- Doug é esquizofrênico. Ou seja " mudança de personalidade " . - ela diz.

Então foi por isso que Doug agia como se eu fosse um lixo. Ele havia mudado, não por ele. E sim pela doença. Me senti aliviada.

- E como você sabe disso ? Você é muito inteligente... nem eu sabia o que era exatamente esquizofrenia. - digo e meu alívio está estampado na minha expressão.
- Como eu já disse... tem muitas coisas sobre mim que você não sabe. - ela diz.

Logo me lembro do aniversário dela e então trato de cantar os parabéns. Ela não liga muito só me agradece e pede para que eu me retire.

Ando pelo corredor e volto para o meu quarto. Abro a porta e vejo Doug sentado na minha cama.

- Como você entrou aqui? - pergunto fechando a porta atrás de mim.
- A porta não estava trancada. - ele diz com sua voz calma.
- Tá, agora sai. - digo me lembrando do que ele tinha feito comigo no terraço.

Não ligo se ele é doente. Ligo pelo fato dele ter me magoado e não tô nem aí se a culpa não foi dele. Meu coração tinha se partido e eu queria que ele saísse antes que eu batesse na cara dele com um pau.

- Por que tá me tratando assim ? O que eu te fiz - ele pergunta como se ele não tivesse falado nada de ruim para mim.
- Você é patético, Doug. - digo revirando os olhos.
- Serio, o que eu fiz ? - ele pergunta se levantando da minha cama e parando na minha frente.
- Eu não tenho paciência para aguentar a sua doença. - digo irritada.
- O que ? - ele levanta uma das sombrancelhas.
- É isso que você ouviu. Não tenho paciência. Você muda de personalidade, e isso me machuca. - digo.
- Então me engula. - ele faz uma cara seria e sai do meu quarto.

Fico triste. Não queria ter falado aquilo pra ele, eu devia ter sido mais tolerante. Mas eu não tenho paciência pra ficar aguentando os pitis de um esquizofrênico.

Deito na cama e fico pensando.
" Se ele tivesse deixado eu me matar ele não teria ouvido nada disso. E eu estaria em paz. "

Levanto e começo a andar pelo meu quarto. Muita coisa aconteceu. Minha cabeça estava confusa. Eu estava com uma imensa vontade de me cortar.

Ouço baterem na porta.

Levanto e me deparo com Rita.
Dou um sorriso é deixo ela entrar.

- Oi, o que houve? - pergunto curiosa para saber o que ela queria no meu quarto.
- Só vim elogiar o quanto você é forte. Mesmo triste ainda consegue sorrir e se preocupar comigo. Obrigada. - ela diz.
- Eu sou muito sensível a dor dos outros e a minha mesma. Eu sou um anjo e queria poder voltar ao paraíso. - digo me lembrando das palavras daquele garotinho.

Rita fecha a porta e me olha confusa

- Anjo ? Paraíso? - ela fala. E vejo a curiosidade em seu olhar.
- Sim! Anjos se cortam para poder morrer e voltar ao paraíso. - digo explicando da mesma maneira que o garotinho tinha me falado.
- Acho que eu também sou um anjo. - ela diz E sai do meu quarto.

Rita se corta como eu. Uma dor invade meu coração. E eu me cortar tudo bem, agora uma menininha de 10 anos... isso me deixou pensativa pelo resto na noite.

Garota De PapelOnde histórias criam vida. Descubra agora