8 - Quando a noite vier

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"Toda noite e toda manhã

Alguém para a miséria está a nascer.

Em toda tarde e toda manhã linda

Uns nascem para o grande gozo ainda.

Uns nascem para o grande gozo ainda,

Outros nascem para uma noite infinda."

Augúrios da Inocência

(William Blake)

Numa tarde de quinta-feira quente e úmida, típica dos dias de verão em Sergipe, me vi sentada no banco de trás do carro de meus tios ao lado de Rodrigo e Adriel, enquanto Jorge guiava o carro em direção ao aeroporto. Tia Tânia estava incrivelmente quieta, provavelmente tentando não cair no choro de novo, como havia feito nos últimos dias, todas as vezes que se tocava no assunto da viagem.

Ao chegarmos ao aeroporto, fomos informados de que o voo para São Paulo, de onde Rodrigo partiria para os Estados Unidos durante a madrugada, havia sido adiado por uma hora. Não sei se vocês já tiveram a chance de visitar o aeroporto de Aracaju, mas não tem muito o que se fazer por lá durante uma hora, enquanto tia Tânia e Jorge se ocupavam em vigiar Adriel para não o perder de vista resolvi ler um dos livros que havia pegado emprestado com minha amiga Bia, foi então que me lembrei de tê-lo deixado no carro.

-Tia, será que eu posso ir até o carro? Esqueci uma coisa lá dentro.

-Claro, querida. – Ela remexeu em sua bolsa. – Aqui está a chave, não esqueça de fechar quando voltar.

-Tudo bem! – Quando já estava próximo a uma das saídas senti um braço rodear meus ombros, não precisava olhar para saber que era Rodrigo.

-Vai ficar sem falar comigo para sempre? – Ele perguntou quando chegamos até o carro.

-Só estou treinando, não vai ser tão difícil daqui alguns minutos. – Respondi sem olhá-lo.

-Ótimo! Resposta nada agressiva. Estamos de bom humor hoje. – Rebateu ele.

-Não tem nada a ver com humor, está bom? – Bati a porta do carro e me encostei de braços cruzados, ainda sem encará-lo.

-Então o que?

-Você está mesmo perguntando isso? – Bufei revirando os olhos.

-Eu sei que isso é uma droga, mas são só alguns meses, eu volto para visitar vocês em julho. – Ele me abraçou e beijou o topo da minha cabeça. – Vai passar bem rápido, você vai ver.

Rodrigo me abraçou com mais força, enquanto eu tentava impedir que as lágrimas, que insistiam em aparecer, rolassem por meu rosto e encharcassem a camisa dele.

-Mas e se você esquecer de mim? – Sabia que estava soando como uma tola, mas não conseguia evitar.

-Shhh... Não pense nisso! Eu nunca poderia esquecer de você! E quando você estiver se sentindo sozinha lembre-se do anjo-guardião, ele vai te fazer companhia quando a noite vier e eu não puder te encontrar sentada nos balanços do parquinho.

A menção ao presente que ele me deu me fez rir de lado, o anjo-guardião, como ele dizia, já estava se mostrando ser realmente meu velho amigo Anjo da Morte, mais uma vez tirando de perto de mim aqueles que amo, ao menos dessa vez ele estava vivo e eu estava tendo a chance de me despedir. Me aconcheguei mais em seu abraço, imaginando se existia alguma chance de congelar aquele momento no tempo, para que ele não pudesse me soltar, nunca mais.

-Ei, vocês dois! – Tia Tania apareceu ao nosso lado. – Sinto muito por atrapalhar a despedida de vocês, mas está na hora de você ir. – Ela falou olhando para Rodrigo. Os olhos dela agora refletiam os meus, cheios de lágrimas.

-Tudo bem, vamos lá despachar o Mala Sem Alça. – Falei, implicando uma última vez com ele, antes que partisse. – Ah, e não esqueça do que eu te pedi.

-Pode deixar! – Falou ele. – Na primeira chance que eu tiver, vou procurar seu amigo, Jesse, e falar que você está muito feliz por se ver livre de mim e que para ficar melhor só falta ele vir ficar com você. – Rodrigo me provocou enquanto caminhávamos em direção ao portão de embarque, onde ele teve que se esforçar para fazer tia Tania soltá-lo de seu abraço.

-Bobo! – Fiz careta para ele que estava de joelhos no chão abraçando o irmão, em seguida, levantou para me abraçar uma última vez antes de partir.

-Prometo que um dia eu vou fazer você esquecer todas essas preocupações, você vai entender que não tem nada a temer e que eu sempre estarei por perto. – Falou ao meu ouvido e saiu em direção ao portão de embarque.

Quando voltamos para casa corri direto para meu quarto, ignorando qualquer coisa que tia Tania tenha falado sobre comer, pelo menos eu acho que era isso que ela falava. Fui até a mesinha, onde havia colocado meu pequeno amigo-anjo-guardião-da-morte, o peguei e me joguei na cama. Eu sabia que Rodrigo tinha razão em dizer que logo eu me acostumaria a falta dele e que quando ele viesse passar as férias em casa, nós poderíamos ficar o tempo todo juntos, mas naquela hora meu único pensamento era rejeitar a ideia de me acostumar a falta dele, assim como não havia me acostumado a falta de meus pais ou de meu irmão.

Tentei tirar aquele pensamento de minha mente, não podia comparar a partida de Rodrigo com a falta de minha família, afinal, ao contrário deles, ele estava vivo e saudável, ainda que longe de mim. Fiquei deitada na cama, agarrada ao presente que ele me deu, até que agarrei no sono desejando acordar apenas quando ele estivesse voltando para mim.

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N.A.: Olá, pessoas! Nem me desculpo mais pela demora, vocês já devem estar acostumados. Espero que o capítulo agrade vocês, creio que esteja mais curto que o normal, mas eu precisava postar logo, então enrolei o menos possível. Se gostaram do cap, cliquem na estrelinha, que eu ficarei muito agradecida, e comentem bastante, que eu ficarei felicíssima em respondê-los.

xoxo

P.S.: O título foi inspirado na música "When The Night Comes", que tem duas versões, sendo a que mais gosto a do cantor Bryan Adams, mas na playlist do livro, lá no Spotify, vocês vão encontrar a versão original, que é do cantor Joe Colker, com participação de Chris Lord-Alge.

Anjo Da MorteOnde histórias criam vida. Descubra agora