5 - Insonia

75 13 15
                                    


"Talvez eu esteja apenas sonhando que minha esperança vai me manter forte."

The Reason I Go On (Céline Dion)

Faltando apenas algumas semanas para terminar o ano letivo eu passei a ter problemas de insônia, o stress das provas finais estava me deixando maluca. Após horas deitada, em tentativas frustradas de agarrar no sono, eu me levantava de mau humor no meio da madrugada, atravessava o apartamento de meus tios em silêncio, sem me preocupar em vestir outra coisa que não fosse meu pijama, e descia para a área externa do prédio.

Havia um parquinho, para as crianças, próximo ao prédio em que morávamos, eu me sentava em um dos balanços e ficava observando as estrelas, enquanto sentia a brisa bater em meu rosto. Vez ou outra, minha atenção era desviada para a portaria do condomínio quando algum morador chegava ou saía.

Depois de um final de semana cansativo, me preparando para a prova final de Língua Portuguesa, meu sono parecia se esconder de mim, como uma brincadeira sem graça de pique-esconde promovida pelo meu velho amigo anjo, que deveria estar, mais uma vez, se divertindo a minhas custas. Enquanto eu tentava decifrar as constelações, sentada no balanço do parquinho, uma cabeleira castanha tampou minha visão do céu, eu pisquei focalizando o rosto de Rodrigo.

- Você não deveria estar descansando para a prova de amanhã? – Ele perguntou, sentando-se ao meu lado e imitando minha posição anterior de observadora de estrelas.

- Não consigo dormir! – Respondi, observando ele, que agora estava de olhos fechados ainda com a cabeça inclinada para o céu, percebi, em seu rosto iluminado pelo brilho da lua, linhas escuras que se estendiam sob a sombra dos longos cílios. – Pelo visto, eu não sou a única. O que não faz nenhum sentido, já que você está aprovado em todas as disciplinas com mérito desde as avaliações anteriores.

Um vestígio de sorriso surgiu nos lábios do rapaz, mas logo despareceu, talvez eu não tivesse sido capaz de notar se já não estivesse tão familiarizada com seu sorriso de lado. Estranhei, no entanto, o fato dele ter contido o sorriso, nunca tinha visto ele fazê-lo até aquele momento.

- Você está bem? – Perguntei, minha voz denunciando mais preocupação do que eu pretendia.

Rodrigo demorou mais alguns instantes de olhos fechados, sentindo a brisa que batia em seu rosto e balançava os fios do cabelo que agora estavam um pouco compridos demais, mas que lhe davam um ar de descaso que o deixava ainda mais bonito. Me repreendi por esses pensamentos, estava parecendo uma das garotas que vivam correndo atrás dele pelos corredores do colégio.

- Papai recebeu uma carta na última sexta-feira – disse virando-se para me encarar, seus olhos pareciam cansados e tristes.

- E daí? Seu pai é um advogado famoso, recebe um monte de cartas diariamente.

- Essa não era uma carta de trabalho – falou, enquanto mexia freneticamente em uma linha que se soltava da costura da camisa branca que fazia conjunto com a calça azul escura do pijama. Assim como eu sempre fazia, ele não havia se preocupado em calçar os pés ao sair do apartamento.

- Tudo bem! Então sobre o que era? – Perguntei, sem entender o que a carta tinha a ver com a insônia dele.

- Era uma carta de admissão na NCSU.

- Seu pai vai voltar para a faculdade? Na Carolina do Norte? Por que... – Minhas perguntas se perderam ao mesmo tempo que ele negava com a cabeça e a compreensão me atingia como um balde de água fria. – Espera, você foi aceito na Universidade Estadual da Carolina do Norte? – Ele confirmou com um movimento rápido de cabeça. – Mas como? Eu não sabia que você tinha vontade de ir para lá ou que tivesse feito a prova de admissão. – Tentei não soar traída por ele ter me escondido isso.

Anjo Da MorteOnde histórias criam vida. Descubra agora