Capítulo 7

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As lágrimas caíam na mesa, minha respiração estava descontrolada, passava as mãos pelo cabelo e olhava para cima, como se de lá, fosse vir alguma resposta, ou ao menos, alguma ajuda. Mas sabia que estava sendo tola. A resposta nunca viria, eu já deveria ter aprendido... Eu chorava e meu peito se estreitava, as lágrimas caíam como cristais na mesa e tudo em que eu pensava era em como fazer aquilo parar. Me perguntava o porque; o porque de eu ser assim, tão vazia e ao mesmo tempo tão cheia; tão cheia de tristeza, de dor, de negatividade. Ah, como eu queria saber fazer aquilo parar. Mas não sabia, e aquela dor continuava mais intensa à cada dia. À cada dia ela dominava um pouco mais de mim, e naquele ponto já não sobrara muito de mim.
Respirei fundo tentando me recuperar e fazer o choro cessar. Fechei os olhos por um longo período, voltei à abri-los quando o telefone tocou. Fui até a sala, aonde ficava o telefone e o atendi:
-Alô
-Tá tudo bem filha?
-Está sim mãe...
-Mesmo? Qualquer coisa você me liga pelo amor de Deus. Está tomando o chá?
-Claro que estou-falei lançando um olhar para a cozinha
-Ok então, vou desligar.
-Tchau.
Desliguei o telefone e me joguei no sofá, pendi minha cabeça para trás e tentei ouvi a música que tocava lá em cima, mas dali o som era impossível de ser ouvido, ou talvez o disco já tivesse acabado. Ao lembrar do disco meu pensamento foi voltado para música. Fazia muito tempo que eu não ouvia nada novo. A última vez foi quando fui até a loja de discos. Tentei lembrar da letra e melodia que ouvi outrora, mas era impossível.
Ao pensar nisso, lembrei que sempre tive vontade de tocar algum instrumento. Violão para ser mais exata, por causa da sua melodia. Sempre achei o violão um instrumento muito versátil. E também sempre preferi as versões acústicas das músicas. Me perguntei se um dia iria ter vontade de tocar e se, de algum jeito, essa atividade poderia me ajudar. Levantei sobressaltada quando ouvi alguém gritar meu nome do lado de fora de casa. Me levantei e fui até a janela da cozinha ver de quem se tratava. Não conseguia pensar em ninguém. Além da minha mãe, quem se preocupava comigo? Ninguém parecia uma resposta razoável.
Me inclinei contra a pia e cerrei os olhos, era Paolo, achei muito estranho mas fui até lá.
-Tudo bem Magnoria?
-Tudo sim Paolo, e contigo?
-Tô legal- falou deixando aparecer um breve sorriso- Vim aqui te avisar que um trabalho de português para entregar segunda. É sobre o romantismo. Você tem que escolher uma das três fases do romantismo, escolher um autor dessa fase e pesquisar sobre ele... Ah, vai ter de apresentar. O trabalho vai ter peso 2 na média.
-Caramba... Valeu por se preocupar em me avisar Paolo.
-Por nada- ele sorriu mais um vez- agora vou indo, já devo ter atrapalhado demais. Até mais Mag.
Apenas sorri e acenei. Queria entender o por que que eu não conseguia ne aproximar novamente de Paolo. Éramos tão amigos, vivíamos juntos, mas eu me afastei. Ele até tentou mas eu me esquivei em todas as vezes que ele tentava se reaproximar. Talvez eu mesma tivesse procurado a situação que me encontrava.
Voltei para dentro de casa e joguei o chá que estava na xícara na pia. Subi para meu quarto e tirei o disco da vitrola. Não queria mais música. Queria silêncio. Queria silêncio já que minha mente rugia como um leão. Fui até o quarto da minha mãe e peguei o computador dela. Voltei pro meu quarto e comecei pesquisar sobre o trabalho de português. Na aula passada a professora tinha dito algo sobre o romantismo. Me lembrava de ter prestado atenção por dois motivos: o primeiro era que tinha esquecido meu livro em casa, e o segundo era que o assunto muito tinha me interessado. E me lembrava também que das três fases românticas brasileira, a que eu mais havia me interessado era a segunda. O ultrarromantismo, ou, mal do século.
Digitei no site de pesquisa e fiquei por muito tempo pesquisando e lendo sobre o tema. Aquilo realmente tinha prendido minha atenção. Mas também não era difícil imaginar o porquê. O ultrarromantismo foi a fase em que os autores escreviam suas dores. Escreviam sobre sofrimento, sobre amor, era sempre algo muito bonito, mas também muito triste, e muito melancólico. Tinha descoberto que o principal autor dessa fase foi Alvares de Azevedo. Li algumas de suas frases e me senti profundamente tocada, talvez, eu ousava dizer, compreendida. Mas dentre todas as frases que tinha visto, uma se destacou. E como não iria? A frase era:
"Invejo as flores que murchando morrem,
E as aves que desmaiam-se cantando
E expiram sem sofrer..."
Quando à li pela primeira vez, me senti arrebatada, me senti compreendida, e me senti triste. Triste por alguém também se sentido como eu me senti. Coloquei o computador de lado e me levantei. Fui até minha estante e procurei alguma obra desse autor. Fiquei decepcionada em não encontrar nada. Voltei ao computador e pesquisei os nomes de suas obras. E achei mais um fato curioso sobre Alvares de Azevedo: suas obras tinham sido publicadas postumamente. Ele não tinha visto o sucesso de nenhuma delas. O que era de certo modo triste. Mas talvez, o que ele escrevia com tanta fervura, ele escrevia para ser guardadas, talvez..
Como não tinha em casa nenhum livro dele, decidi ir até a biblioteca da cidade. Ficava perto da loja de discos. Coloquei uma calça jeans escura, um moletom qualquer, prendi o cabelo em um rabo de cavalo e desci. Olhei de relance no espelho e meus olhos ainda estavam um pouco inchados por causa do choro. Mas não me importei, até porque a gripe era uma ótima desculpa caso alguém perguntasse. Mas é óbvio que ninguém perguntaria.
Tranquei a porta e coloquei a chave no bolso de trás da calça e saí andando pela calçada. Não tinha percebido até então que realmente estava indisposta. Meu corpo doía um pouco mas eu não ligava muito. Percorri todo o percurso fazendo o que sempre faço. Olhando nos olhos das pessoas tentando decifrar seus olhares. Cheguei na biblioteca e entrei fazendo os sinos da porta tocar. Olhei para cima por reflexo e fui até a bibliotecária.
-Posso ajudar- era uma moça de sorriso largo e olhos pequenos. Era negra e seus cabelos enrolados. Era muito bonita
-Ah, sim eu acho. Bem é que estou procurando um livro do Alvares de Azevedo
-Meu autor favorito- ela abriu o sorriso- vou pegar alguns para você tá bom? Espera aqui eu já volto.
Ela estava tão animada, que contagiaria qualquer pessoa. Sem dúvidas. Alguns minutos depois ela voltou com um livro
-Olha, eu iria trazer todos os livros dele, mas resolvi te trazer este. É o meu favorito tenho certeza que você irá gostar.
Peguei o livro sem nada dizer e olhei o nome na capa "Lira dos vinte anos"
-São poemas? -Questionei
-Oh, sim. E em minha opinião os melhores. Alvares toca o coração de qualquer pessoa, e de algumas a alma...
-Oh sim?- voltei meu olhar para ela- É realmente disso que estou precisando.
Ela sorriu e me disse para voltar lá assim que terminasse o livro para conversamos sobre. Enquanto eu assinava meu nome e colocava meu telefone ela continuava a falar
-Sabe, ninguém nunca tinha pedido um livro do Alvares aqui. Talvez por isso eu esteja tão animado- ela riu
-Terminei- disse lhe entregando a caneta- pode deixar que ao terminar eu venho conversar contigo. E obrigado.
Saí de lá me perguntando e tinha sido rude com ela, mas eu estava me sentindo ainda mais indisposta do que quando saí de casa. Já fazia muitas noites que eu não dormia e agora, a gripe estava acabando com meu físico.
Cheguei em casa e estava me sentindo realmente muito cansada. Fechei a porta e fui direto para meu quarto. Eu queria muito começar a ler mas estava muito cansada. Deitei na minha cama e me cobri com uma manta pois, apesar do sol, sentia muito frio. Dormia e acordavam de cinco em cinco minutos. Estava tossindo muito e lá embaixo o telefone tocava e eu escutava mas não tinha disposição de levantar da cama. Até tentei algumas vezes mas parecia que meu corpo pesava uma tonelada. Virei para o lado e minha visão ficou turva, meus ouvidos não ouviam nada, e de repente, tudo ficou preto.

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