Eu a amo. Pra mim é estranho amá-la como a amo, porque eu nunca me apaixonei por alguém igual Lara, mas percebi que o amor não está na audição de uma pessoa e não está em sua voz. O amor de uma pessoa por outra, surge repentinamente, como quem não quer nada, até te fazer sofrer. O amor te faz sentir-se feliz por ser recíproco ou te faz ficar triste por não ser. Ele te faz cometer o erro de ir atrás da pessoa mais perfeita e mais bonita do mundo só pra preencher um vazio, ou para simplesmente esquecer essa pessoa por quem seu coração declarou amor. O que as vezes acaba se tornando em vão, porque ela não era a mesma pessoa que fez de sua vida uma missão. Mas se eu não escolhi nem meu próprio nome, imagina se eu ia ter a escolha de me apaixonar ou não por Lara.
Faço parte de um grupo, "O grupo que não escolheu quem amar". Acredito que esse é o grupo que mais contém membros. Com Lara não foi diferente, sobre quem não escolhemos amar.
Nada melhor que sua cama após o primeiro dia cansativo de aula. Naquele dia eu tive dez aulas em um único dia e meu corpo pedia descanso. Era o que estava pensando, sentado em um batente na entrada do IFPB, que para minha surpresa, eu tinha passado. Eu e minha família ficamos muito felizes, mas isso foi até eu ter 53 aulas por semana sem contar com as aulas de reposição que alguns professores passavam. Aí meu corpo e minha mente começaram a tentar seguir o ritmo das aulas e comecei a perceber que o tempo que tinha livre não existia mais. Mas esse foi apenas meu primeiro dia de aula. A semana passada tínhamos apenas conhecido os professores e feito alguns amigos, eu não tinha feito muitos, apenas dois.
Esperava o ônibus chegar pra eu poder finalmente ir para casa. Onde eu estava passava muitos carros e muitas motos o que acabava trazendo um certo perigo. Eu olhava repetidamente para os lados com medo de ser atropelado. Meus olhos não se fixavam em um único lugar, mas quando abaixei a cabeça e a levantei-a e olhei para a frente, eu a vi. Segundo a ciência, quando nos apaixonamos a primeira vista, nosso cérebro bloqueia a função que nos permite criticar ou julgar a aparência de uma pessoa —seja ela(e) quem for. Mas mesmo que eu não tivesse me apaixonado a primeira vista por ela, eu com toda certeza a admiraria. Ela tinha um olhar que não me era estranho, eu tinha certeza que já tinha visto aquele olhar em alguma pintura sobre deusas antigas. Por isso, quando a vi pela primeira vez, meu cérebro fez a comparação mentalmente com antigas deusas. Seu sorriso era inconfundível, era quase impossível de confundi-lo com qualquer outro. Sua aparência meiga era reconfortante, ela passava a sensação de segurança, a sensação de amor e amizade. Ela tinha várias outras características marcantes, mas eu passaria horas detalhando, então é melhor em me adiantar... A partir do momento em que a vi, fiquei ali parado olhando-a e guardando na memória cada reflexo de seu rosto.
Ela conversava com um cara na linguagem dos surdos/mudos, naquele momento eu fiquei meio confuso em saber quem é o surdo ou mudo. Se era eu, por não escutar meu coração me falando que ela já tinha namorado, ou ela, só pelo motivo de não escutar. Ainda meio que sem saber quem julgar, penso que o cara com quem ela conversava era o surdo ou mudo. Pensei isso porque uma garota que estudava na mesma sala que eu, estava ao lado dela, elas falavam bem baixinho. Eu não podia ouvi-las, mesmo estando a pouco mais de dois metros de distância.
O tal surdo ou mudo com quem ela conversava, a ofereceu um pirulito, ela aceitou e o agradeceu com um gesto. Ele aparentava ser mais velho que ela (não muito), aparentava não ter idade para ser seu pai mas também não aparentava ser seu namorado. Observei seus comportamentos, então imaginei que eles eram apenas amigos. A aquela altura do campeonato, eu ainda estava receoso quanto a quem era surdo, ou mudo. Sou uma pessoa muito curiosa, mas ao mesmo tempo sou uma pessoa muito, muito tímida. Eu senti vontade de perguntar quem era o que, mas percebi que estava com vergonha de perguntar, então deixei pra lá. Eu ainda nem a conhecia e já me pegava pensando como faríamos um belo casal —como eu era esperançoso... Talvez fosse parecer um pouco bobo, ou ate idiota, mas eu mesmo assim tentei parecer o mais atraente possível. Comecei a mexer no cabelo, alisar a pele ou até mesmo a pôr força no bíceps só pra dá aquele volume que tantos homens se vangloriam. Mas eu não tinha muito a oferecer, eu não passava de um magrelo. Eu tinha meus pequenos músculos, mas nada que fosse fazer uma garota como aquela menina de lindos cabelos pretos, olhos castanhos claros, pele branca e um sorriso que eu desejava nunca esquecer, olhar pra mim —sim, estou caracterizando-a novamente.
Apôs perceber o quanto aquilo parecia idiota, parei de tentar chamar sua atenção. Achar aquilo idiota, não era o único motivo, enquanto refletia sobre o que eu achava daquilo, lembrei de uma frase que uma amiga minha tinha me falado há algum tempo, logo depois que me decepcionei com uma menina, "rosto bonito não te dá abrigo". Será que não? Será que por serem pessoas bonitas não dão abrigo a pequenos corações como o meu? Aquela frase sempre me abatia. Não importava o quanto eu tentasse me apaixonar novamente, ao me lembrar daquela frase, meu otimismo caia drasticamente. Sentado ainda no mesmo lugar eu refletia sobre aquela frase, até perceber que é ridículo pensar aquilo. Mas mesmo assim eu não continuei agindo daquela forma, em vez disso cruzei os braços e pra não parecer tão admirado, voltei a olhar para os lados.
"Lá vem o ônibus!", diziam algumas pessoas ali. Olhei para minha esquerda e já tinha um amontoado de pessoas se empurrando pra conseguir um assento no ônibus. Havia cerca de 15 a 20 alunos se empurrando, pensei em pegar o próximo, mas lembrei do que o cara da portaria tinha falado pra algumas pessoas minutos atrás, — o ônibus quando passa demora quase uma hora e meia pra retornar, isso é uma sacanagem pra quem quer voltar cedo pra casa!— Então comecei uma nova reflexão, pegar o próximo ônibus, ou pegar aquele mesmo. Comecei a achar uma boa ideia ficar um pouco mais, só assim eu poderia admirar aquela menina mais um pouco. Então quando eu parecia me conformar com a ideia de ficar e esperar o próximo ônibus, ouvi um carro prata buzinar. O cara que estava ao lado daquela menina, apontou para o carro. Ela levantou-se, pegou sua mochila, colocou em suas costas e de dentro do carro ela acenou para ele. Eu já tinha tomado a decisão de ir no próximo ônibus, mas ao vê-la ir embora no carro, mudei de opinião. O ônibus ainda estava esperando as últimas pessoas entrarem quando decidi pegar a mochila e correr para pegar o ônibus. Ao dar as costas pra ir em direção ao ônibus pude ouvir pessoas conversando.
Me virei e olhei para onde eu estava sentando antes. O cara com quem aquele menina linda conversava, estava falando e aparentemente ouvindo. Ele não fazia gestos, ele apenas falava normalmente, como qualquer outra pessoa não surda/muda conversa. Eu parei lá no meio da rua e o observei. Eu estava confuso e demorei um pouco para entender que o surdo ou mudo não era ele, mas ela. Eu me senti estranho, era como se eu tivesse acabado de tomar um soco na barriga, aquilo pra mim pareceu muito difícil de compreender. Olhei novamente para o ônibus e só restava uma pessoa entrar, corri pra não ficar para trás.
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Lara
Lãng mạn"As maiores e melhores coisas no mundo, não podem ser vistas, ouvidas nem mesmo tocadas, elas devem ser sentidas com o coração". Felipe se deparou com uma paixão que lhe surpreendeu, principalmente por sua amada(Lara) ser surda. Ele enfrentará muito...