APENAS UM ENCONTRO CASUAL (Conto 1)

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De anjo a demônio em apenas um leve sussurro e uma pequena mordida na orelha. Foi essa a maneira mais simples que encontrei para definir aquela que encontrei na noite passada. Realmente as madrugadas foram feitas para amarmos, ontem, vivenciei essa prática na íntegra da minha lucidez. Ao menos foi assim que eu me senti após a terceira taça de vinho.

Uma bela e alegre garota, cabelos loiros e lisos na altura dos ombros, um sorriso de desarmar até o mais bravo dos guerreiros, um olhar que fuzila e desmonta, deixa qualquer ser humano desnorteado e sem chão. Enfim, uma bela e sofisticada mulher, que do nada me despertou de uma forma sutil e avassaladora.

Fui até um barzinho que fica a poucos metros de casa. Lá servem um delicioso vinho bastante casual. Aroma leve e frutado, não muito adocicado. Na boca, tem paladar envolvente e com um travo bem característico de um bom carbenet. Cheguei cedo e meio sem graça, é sempre assim, depois um cansativo dia de trabalho a gente fica um pouco estressado e distraído. Como de costume, logo pedi uma garrafa do vinho e me sentei próximo a janela. Preferi não pedir nada para comer, queria apenas relaxar e aproveitar o vinho enquanto observo displicentemente o movimento na rua.

Assim meio do nada, vejo aquela garota encostada no balcão. Ela estava de costas e vestia uma calça vermelha e uma blusa regata preta bem simples. Sua pele lembrava um veludo, que de longe aparentava macia e apetitosa, semelhante a uma fruta suculenta que logo dava vontade de morder e usufruir de todo o seu sabor. Ela muito sorridente conversava com o senhor do balcão, e no meio de um lindo e inocente sorriso, virou-se e os nossos olhares se fixaram de uma maneira brusca que logo o seu sorriso desapareceu e deu lugar a um olhar daqueles de quem realmente sabe o quer. E eu nem de longe imaginaria o que viria dali por diante. Ela me olha novamente, pega uma taça com senhor do balcão e vem andando em minha direção. Eu me arrumo um pouco desajeitado e volto a olhar para a rua tentando disfarçar algum possível nervosismo.

_ Oi, boa noite! Posso sentar aqui com você?

_ Claro, por favor. Respondo apontando a cadeira à minha frente.

A sua voz ecoou lindamente nos meus ouvidos e cortou-me ao meio, deixando-me totalmente vulnerável naquele instante. Ela põe a taça sobre a mesa, e educadamente a sirvo. Ela toca a taça delicadamente nos lábios, sorri e diz que não é daqui, que é estudante de música e veio para concluir uma pesquisa de base do seu curso. Ela diz estar hospeda em um hotel no centro da cidade, e hoje saiu para aproveitar os dois dias que tem de folga. As minhas mãos estavam geladas, quanto mais ela falava, eu ficava meio hipnotizado com o seu sorriso que era doce e inocente. Quando ela gesticulava, a sua boca puxava um pouco para o lado, e o que lhe dava um charme arrepiante. Fiquei encantado por tal moça, que mal podia esconder o nervosismo ou alguma ponta de ansiedade. Seu olhar era puro, eu não conseguia ver maldade ou malícia nos seus olhos. E um ar de mistério rondou a minha cabeça, deixando-me um pouco confuso.

_ "Que mulher é essa? Que mulher é essa? Tal pergunta repetiu-se por varias vezes na minha cabeça. Pensei que estivesse louco, mas na verdade eram algumas dúvidas que começavam a me rodear.

Entre uma taça e outra de vinho, o tempo passou tão depressa que mal percebemos que já chegara próximo à meia-noite. O barzinho já estava quase vazio, e nós já terminávamos a segunda garrafa. Eu já me sentia bem melhor quanto àquela ansiedade. O vinho, a conversa, os encantamentos e tudo. E o quanto mais a gente bebia e conversava, mais interessante ficávamos um para o outro. Eu, um homem já feito, porém com muito medo e ansiedade. E ela uma linda e talentosa moça que apareceu praticamente do nada, e com muitas promessas para uma noite apenas.

Não me restava outra opção naquele momento, a não ser convidá-la para continuarmos a nossa conversa no meu apartamento. Uma vez que pelo horário que já era relativamente tarde, e pela violência que se instaurou em nossas cidades, e também era o mínimo de segurança que eu poderia oferecer. Assim fiz, formulei o convite e ela topou daí pegamos mais uma garrafa de vinho e fomos caminhando rumo ao meu apartamento aproveitando um pouco da brisa da madrugada. Era mais ou menos 01:30 da manhã. Chegamos logo, era mais ou menos dez minutos de caminhada, e durante o percurso não falamos nada, apenas riamos e nos olhávamos meio sem graça. Parece que o gelo voltou, e em forma de um enorme iceberg por sinal. Enfim chegamos, o porteiro abriu o portão de acesso e entramos em silêncio absoluto. Percebi certo medo ou receio nos seus olhos, e isso me assustou um pouco, a impressão de segurança que ela me passara em instantes atrás, e agora havia me deixado sem graça e um pouco encabulado.

Chegamos à porta do elevador e apertei o botão. Enquanto esperávamos o elevador chegar, encostei-me à parede e finalmente o silencio foi rompido por um belo sorriso.

_ Mais que dia esse, não! Saí para aproveitar um dia que tive de folga e acabei conhecendo um estranho bem interessante, tomando duas garrafas de vinho e conversado bastante, e até tive que vir passar a noite na casa "desse" tal estranho. Estranho isso não é?

Completou-a sorrindo e baixando a cabeça.

_ Pois é! Eu não poderia te deixar a mercê numa cidade que pouco você conhece ainda mais hoje em dia que confiar nas pessoas está cada vez mais difícil.

Nesse instante percebi a volta de toda aquela segurança que vi no barzinho. O elevador chegou, entramos e apertei o número do meu andar. Ela ficou encostada no canto e de frente para o espelho, e eu apenas a observar os ruídos que fazia dentro do elevador. Ela parecia distraída, mas na verdade me observava com tamanha sutileza que eu mal percebia o seu olhar na minha direção. Eu me sentia um pouco tenso. Elevadores não é um lugar cômodo para mim, e com a companhia que eu me encontrava, nada me ajudava a esconder alguma timidez ou certo nervosismo.

O elevador para. A porta se abre e nós saímos. Fui à frente indicando o apartamento a adiante. Paramos em frente à porta, puxei as chaves do bolso e elas caem no chão.

_ Droga! Esbravejo levando às mãos a cabeça. Me abaixo para pegar as chaves enquanto ela rir e induz-me a fazer o mesmo.

_ Essas coisas acontecem. Diz ela.

_ E comigo então... Respondo gesticulando espremendo um pouco os olhos. O que leva ela a soltar um leve sorriso e fitar o meu olhar. Fico meio sem graça. Abro a porta e então entramos.

_ Não repare a bagunça. Casa de homem é horrível, hoje eu não tive muito tempo, saí às pressas e quase atrasado. Ela rir e senta no sofá, tira o sapato e fica apertando os dedos dos pés e diz baixinho que os seus pés estão a matando.

Bem, ficamos sentados e em silencio durante uns 15 minutos. Penso em abrir a garrafa de vinho, mas sei que ela não aceitaria, já estávamos um pouco alto e o mundo estava prestes a rodar por inteiro. O barulho da rua vai diminuindo, àquela hora, poucos carros ainda passam na avenida. E nós apenas conversando, na verdade, jogando conversa fora, apenas falando coisas sem importância. Ela fala sobre os seus estudos, a sua cidade e pouco dela. Eu fico apenas escutando ela falar, e enquanto ela fala, vou até cozinha e pego dois copos e sirvo um pouco de vinho. Falo um pouco de mim, do meu trabalho e das coisas que costumo fazer quando estou livre. O tempo passa, os olhos começam a pesar e até àquela hora... Mas que hora!? Tudo estava perfeito. Eu ali, com meu copo de vinho na mão. Ela, com o seu copo e os cotovelos sobre a mesa, e com os olhos redondamente brilhosos. Já me sentia totalmente entregue ao acaso, e de repente ela me olha de uma maneira estranha:

_ Me abraça!

_ Uma taça? Respondo fingindo não entender.

_ Me abraça e venha logo, antes que eu me arrependa por não ter feito isso antes...

E assim a noite se foi, e essa garota estranha que do nada apareceu também. Deixou-me muita saudade. Sei que aquela prazerosa noite em claro não foi em vão. Todos os dias eu volto no mesmo bar, sempre escolho o mesmo vinho, e mesmo sabendo que ela não mais aparecerá, sento na mesma cadeira de frente á janela, e tudo isso para sentir o mesmo sabor daquele dia.

O cheiro do seu sexo impregnou no ar e nos lençóis que ainda permanecem por lá. Aquela figura toda nua não mostrou apenas o seu o corpo esbelto e ardente, mostrou-me também a sua alma em todos os seus lances e nuances... Do mais doce ao selvagem, do inocente a indecência do pecado, da luxuria a pureza da moralidade.

Com certeza ela fora uma dama e uma meretriz, e eu um mero escravo seu preso nas correntes daqueles braços sedento de prazer e incansavelmente vorazes. Desfrutei de todo o seu sabor, esbaldando-me na essência sedutora daquele olhar indecifrável que literalmente me devorou por inteiro. Não houve apenas um só dia que eu não me pensasse naquela pele macia, daquele rosto tão suave e do seu olhar doce e inocente.

Ah... Como eu queria me ver novamente na sombra daqueles olhos tão perdidos quanto eu. Quando deslizava suavemente sobre o seu corpo suado matando toda nossa sede de prazer.

Ricardo Lima

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