Parte 3

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Os convidados começaram a chegar cedo. É claro, as mulheres Belikovs tinham acordado muito mais cedo do que eu e Dimitri, já que nós dois ainda estávamos nos acostumando com o fuso horário. A cozinha funcionava a todo vapor, enchendo a casa com deliciosos aromas. Confesso que a culinária russa não era a minha preferida, mas não teve pratos – especialmente os preparados por Olena – que eu não tivesse aprendido a gostar. Ela e suas filhas cozinhavam enormes quantidades de tudo, e quase todas as pessoas convidadas  também trouxeram um prato de comida para ajudar. Aquilo tudo era idêntico ao que aconteceu durante o serviço memorial de Dimitri, tirando que o clima agora era bem melhor.
No começo, todos ainda tinham um certo constrangimento. Apesar ter tomado a decisão de focar no lado positivo, Dimitri ainda demonstrou uma dificuldade enquanto seu tempo com o Strigoi foi o assunto central. Alguns convidados também pareciam nervosos, como se nós tivéssemos nos enganado terrivelmente e ele ainda fosse um morto-vivo sanguinário. Claro que só bastou cinco minutos para constatarem que não era verdade e toda a tensão se dissipou. Dimitri conhecia quase todos eles, desde criança, e pareceu cada vez mais encantado em reencontrar rostos familiares. Eles, por sua vez, se alegravam por ele esta a salvo.
Do lado de fora, eu fiquei feliz em ver como tinha vindo muita gente. Eu reconheci vários deles, que me cumprimentaram, mas Dimitri era o centro das atenções. A maior parte das conversas era em russo, mas eu conseguia entender o sentido pelas suas expressões. Uma vez que ele se sentiu à vontade entre os seus velhos amigos e familiares, vi uma alegria tranquila se espalhar por ele. A tensão que sempre parecia estalar em seu corpo, tinha se aliviado agora, e meu coração se desmanchou ao vê-lo tão bem.

- Rose?

Eu estava assistindo a tudo com diversão, enquanto algumas crianças o interrogavam seriamente. Ouvindo alguém chamar o meu nome, fiquei surpresa ao me deparar com dos rostos conhecidos e bem vindos.

- Mark, Oksana! Exclamei, abraçando o casal. - Eu não sabia que estariam aqui.

- Como não estaríamos? Perguntou Oksana. Ela era uma Moroi, quase trinta anos mais velha do que eu, mas ainda era muito bonita. Ela também era uma das poucas usuárias do espírito que eu conhecia. Ao seu lado, Mark, seu marido, também sorriu para mim. Ele era um dhampir e, para não provocar um escândalo por causa do seu relacionamento, preferiam manter tudo reservado. Oksana tinha usado seus poderes do espírito para trazer Mark de volta, depois que ele foi morto durante uma luta, feito este tão grande quanto ter restaurado Dimitri de ser um Strigoi. Isso era chamado de shadow-kissed.

- Nós queríamos lhe ver novamente - Mark disse, então inclinou a cabeça na direção de Dimitri. - E, claro, queríamos ver o milagre com os nossos próprios olhos.

- Você fez isso - Disse Oksana, com o rosto cheio de uma suave admiração. - Você o salvou, depois de tudo.

- Essa não era a minha ideia original - comentei. Quando eu decidi vir à Rússia, meu principal objetivo era caçar e matar Dimitri, a fim de libertar sua alma do estado obscuro em que estava. Até então, eu não sabia que existia outra alternativa.
Oksana estava compreensivamente curiosa sobre o papel do espírito na salvação de Dimitri, e eu lhe dei todas as informações que pude. O tempo voou. O dia deu lugar a noite e as pessoas começaram a beber aquela vodka letal que me arruinou da última vez. Mark e Oksana me provocavam para que eu tentasse beber novamente, quando uma voz, de repente, chamou minha atenção. O dono da voz não estava falando comigo, mas imediatamente consegui distinguir voz entre o barulho das pessoas da casa – porque era alguém falando em inglês.

- Olena? Olena? Onde está você? Precisamos conversar sobre o Blood King.[1]

Seguindo a voz, logo pude avistar um rapaz, cerca de cinco anos mais velho do que eu, que se espremia tentando passar pela multidão até onde estava Olena, perto do seu filho. A maioria das pessoas não lhe deu atenção, mas alguns o olharam com a mesma surpresa que eu. Ele era um humano. O único humano entre nós, até onde eu podia dizer. Os humanos e os dhampir pareciam indistinguíveis um dos outros, mas era uma habilidade da minha raça conseguir dizer quem era quem.

- Olena - quase em fôlego, o cara humano chegou em Olena, me dando o primeiro vislumbre de sua aparência. Ele tinha o cabelo preto e bem cortado, e usava um terno cinza que parecia ter sido feito sob medida para seu corpo desengonçado. Quando ele virou o rosto, de uma certa maneira, a luz iluminou sua bochecha revelando a tatuagem de um lírio dourado. Isso explicou a sua presença ali. Ele era um Alquimista.
Olena estava conversando com uma vizinha e finalmente virou, depois do Alquimista chamar seu nome mais umas três vezes. A mãe de Dimitri permaneceu sorridente e simpática, mas eu consegui pegar um traço de desespero em seus olhos.

- Henry - disse ela. - Que bom lhe ver.

Ele ajeitou seus óculos com armação metálica. - Precisamos conversar sobre o Blood King. Quanto mais ele falava mais eu reconhecia o seu leve sotaque. Ele era britânico e não americano como eu.

- Esta não é uma boa hora - Olena disse. Ela fez um gesto para Dimitri que observava Henry minuciosamente. - Meu filho está nos visitando. Ele não vinha aqui há anos.
Henry deu a Dimitri um aceno educado e uma curta saudação, em seguida, tornou a voltar-se para Olena.

- Isso nunca terá uma boa hora. Quanto mais tempo isso ficar de lado, mais pessoas irão se machucar. Como você sabe, outro humano foi morto ontem à noite.
Aquelas palavras trouxe o silêncio de quem estava por perto. Isso também fez com que eu caminhasse para perto de Olena e Dimitri.
- Quem foi morto?- Eu exigi saber. - Quem está fazendo uma matança?

Henry me examinou rapidamente. No entanto, não era uma rápida-verificação-se-eu-era-quente. Era como se ele buscasse descobrir se valia a pena responder à minha pergunta ou não. Aparentemente não. Ele voltou-se para Olena.
- Você tem que fazer alguma coisa.
Olena levantou as mãos. - Por que você pensa que eu posso fazer isso?

- Por que você, bem, é uma espécie de líder aqui. Quem mais poderia organizar os dhampirs para combater essa ameaça?

- Eu não posso liderar ninguém - Olena disse, balançando a cabeça. - As pessoas aqui... elas certamente não podem ser ordenadas a entrar em uma batalha, seja quando for.

- Mas eles sabem lutar - rebateu Henry. - Vocês todos são treinados, mesmo que não se tornem guardiões.

- Nós somos treinados para nos defender - ela o corrigiu. - Com certeza, todos reagiriam se os Strigois invadissem a cidade, mas ninguém sai procurando encrenca. Bem, exceto os Desmarcados. Mas todos ele se foram agora. Assim que estiverem de volta no outono, ficarão felizes em fazer isso para você.
Henry suspirou frustrado. - Nós não podemos esperar até o outono! Seres humanos estão morrendo agora.

- Seres humanos muito idiotas que não conseguem se manter longe de problemas -disse uma mulher dhampir de cabelos grisalhos.

- Este tal de Blood King é apenas um Strigoi comum - acrescentou outro homem que estava ouvindo a conversa. - Os humanos precisam apenas ficar distantes, que ele os deixa em paz.

Homecoming (Voltando Para Casa)Onde histórias criam vida. Descubra agora