Capítulo 5 - Alice

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Liguei a tela e deixei que o vídeo rodasse. A história vista pelo lado de quem "está correto", ocultando o número de mortes que causamos, também quantas crianças hoje não estão com suas famílias e amigos, onde teriam uma infância e uma vida comum. Fecho meus olhos com muita força quando começa a parte que mostra o vídeo original do assassinato assistido, líderes extremistas e suas famílias sendo mortos "em nome da lei". Mais quantas vezes terei que ver esse vídeo horrendo?, me pergunto.

A próxima parte, a de como somos bons e estamos salvando a humanidade, obviamente oculta o fato de que tivemos que testar em crianças muitos experimentos, alguns – dezenas – dando errado e as matando. Quanta idiotice, quanta tolice, quantas mãos cobertas de sangue inocente, includindo as minhas.

Eu nasci no final do conflito, perdi minha mãe com 5 anos e meio. Tinha 5 quando houve o Grande Dia Negro, março final dos Dias Negros. Vivi uma vida comum, na medida do possível. Meu pai era o Superior dessa merda de Grande Conselho, o que na época era segredo, nem eu sabia. Eu não tinha nada haver com isso, eu tinha amigos, escola, iria pra faculdade, tinha namorados, ficantes, etc. Tudo isso indo pro ralo quando começou a dar mais merda.

Eu participei dos movimentos pacifistas desde meus 17 anos, lutando de maneira diferente dos meus antepassados. Lutamos, todos os jovens juntos, sem armas, sem violência, e sim, com amor, saíamos as ruas distribuindo abraços, flores e mensagens de paz para as pessoas que tentavam voltar a uma vida que era comum antes da guerra, estudando e trabalhando. A população no início tinha medo da gente, achavam que éramos novos terroristas e íamos matá-los, mas depois viram que tudo que queríamos era ajudá-los, fazê-los felizes como antes podíamos ser. Passaram a nos agradecer, quem estava estabelecido e tinha um emprego decente, nos doava alimentos ou roupas usadas, aos poucos começamos os distribuir a quem necessitava, alguns quase a beira da morte tamanha precariedade em que se encontravam.

Um ano depois, eu já sabia da possível existência de um tal de Grande Conselho, o que era sussurrado em todas as esquinas, ninguém sabendo quem especificamente fazia parte, só que haviam pessoas do mundo todo participando. Meu pai, ainda não sabia que eu era uma das líderes dos movimentos pacifistas, que na época já havíamos começado a fazer marchas também pacíficas, todos de mãos dadas, cantando e sorrindo. Até que um belo dia, meu pai descobriu, juro que se algum dia descobrir quem me delatou, vou quebrar a cara do cretino.

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(11 anos antes)

Termino minha prova e entrego para o professor, pego minhas coisas e saio de sala, finalmente sexta! Estamos fazendo as provas finais do ensino médio e agora que as faculdades já voltaram a funcionar, o que quando nasci não era disponível, vou cursar biologia ou medicina. Hoje vou direto pra casa, Gustavo, meu namorado, e Sofia, minha melhor amiga, ainda estão terminando a prova, amanhã vamos nos ver na marcha quinzenal, espero que dessa vez venham mais pessoas para causar maior impacto, o que provavelmente vai acontecer já que a cada dia ganhamos mais simpatizantes.

Entro em casa e vejo meu pai sentado no sofá da sala olhando fixamente para frente, a TV está desligada e casa se encontra em um completo silêncio, exatamente como o encontrava quando descobrimos que minha mãe fora morta por extremistas. Me assustei ao vê-lo assim, sento ao lado dele e seguro sua mão direita.

— Pai? – Ele não me ouve. – O que houve, pai? – Pergunto já assustada.

Ele me olha, no início como se não me visse, seus olhos refletindo o mais profundo sofrimento, também muito arrependimento, talvez. Depois ele foca, percebe que eu estou aqui e seu olhar se torna de raiva, ódio e nojo, tudo misturado. Seu aperto em minha mão se torna mais forte, me machucando.

— O QUE VOCÊ PENSA QUE ESTÁ FAZENDO?! – Grito e puxo minha mão com força. Me levanto e me afasto dele. – Enlouqueceu de vez?!

—  O  QUE VOCÊ PENSA QUE ESTÁ FAZENDO?! – Ok, nunca vi meu pai com tanta raiva quanto agora e espero nunca mais ver, ele parece prestes a me matar com as próprias mãos. O que tá acontecendo?!

— Você está louco – Concluí, me virando e tentando sair dali, mas ele me agarrar pelo braço com muita força. – ME LARGA! – Grito e puxo meu braço de seu aperto.

— COMO VOCÊ PODE SER TÃO IDIOTA?! VOCÊ QUER JOGAR TODOS MEUS ESFORÇOS PELO RALO?! É ISSO?

— DO QUE VOCÊ ESTÁ FALANDO?! VOCÊ DEFINITIVAMENTE ESTÁ LO... – Ele me dá um tapa no rosto.

— EU SEI DE TUDO! Você é tão tola, tão ingênua! – Outro tapa. Estou muito assustada. – Agora vai aprender como mudar um mundo, a partir de amanhã você irá começar a me ajudar. Vai trabalhar COMIGO e não CONTRA MIM. Vai aprender a ser menos infantil, vai aprender que a única arma na qual faz com que você alcance a vitória é a inteligência, o que aliás lhe falta. – Ele fala com desprezo, raiva e amargura, tudo misturado em um caos completo.

— ME DEIXA EM PAZ! Já tenho 18 anos e você não vai me obrigar a coisa nenhuma!

— VOU SIM, PORQUE SOU SEU PAI! Vá para seu quarto e arrume suas coisas, amanhã vamos deixar a cidade! – Ele ordena. Percebo que não tenho escolha.

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Sou Alice Lucklace, coordenadora dos experimentos, preferia ter morrido, preferia ter sido punida com chicotadas ou a forca, mas não, tive que matar crianças "em nome da paz". 14 anos de experimentos, 14 anos matando inocentes em testes idiotas, 14 anos me preparando para este momento.

Bem vindos ao inferno. Bem vindos a Reiniciação.

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O vídeo está sem áudio em consequência dos direitos autorais (originalmente era "In The Night" do The Weeknd). Outro detalhe é que talvez a miniatura (capa do vídeo) esteja com o título anterior, tentarei concertar isso, mas por enquanto ficará assim.

 Outro detalhe é que talvez a miniatura (capa do vídeo) esteja com o título anterior, tentarei concertar isso, mas por enquanto ficará assim

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prepared, restarted & mutatedWhere stories live. Discover now