- EU VOU TE MATAR! ESTÁ ME OUVINDO? VOU TE MATAR, SEU FILHO DA PUTA!
Foi basicamente isso. Atendi ao telefone, falei alô e o cara gritou sem parar, logo depois desligando na minha cara. No início me assustei, até porque era de madrugada. Telefonemas de madrugada são sempre assustadores, mesmo quando você não é médico, mas matemático. Quando o pai da minha mãe beirava os 95 anos, cada ligação de madrugada era uma ida urgente ao hospital. Hoje, ele não é mais vivo, mas o pai do meu pai sim, e ele anda em um estado que a qualquer momento teremos ligações de madrugada. Passado então o susto da ligação, me acalmei e voltei a dormir.
- Como assim, doido? – Perguntou o Cadu assim que contei para ele no dia seguinte. – Te ligam dizendo que vão te matar e não está preocupado?
Não tinha motivos para me preocupar. Apenas um pequeno grupo de pessoas tinha o telefone lá de casa: minha mãe, avó, duas amigas e o zelador do prédio que me ligava constantemente pelas manhãs para se certificar que não tinha morrido por alguma estupidez etílica. Imagino que isso não tinha nenhuma relação com preocupação direta comigo, mas apenas prevenir que os vizinhos não reclamassem primeiro do cheiro de cadáver pelo prédio. De qualquer forma, tinha certeza que era engano.
- Que engano, que nada – exclamou Cadu. – Ninguém liga para a casa dos outros de madrugada por engano e fala que vai matar a pessoa. Um cara que quer matar o outro, primeiro pega todas as informações para ter certeza e depois liga.
De fato, essa teoria fazia sentido. Mas como sabia bem, poucas pessoas tinham o meu número, então era impossível ser comigo. Talvez não fosse alguém querendo de fato matar outra pessoa, que nesse caso era o inofensivo eu. É possível que fosse apenas um trote. Eu mesmo adorava passar trotes de madrugada. Ligava para um número aleatório e deixava tocar. Às vezes, tocava tanto que a ligação caía. Daí ligava de novo até o infeliz atender. Quando finalmente atendiam, fazia a mesma pergunta: "Bom dia, eu acordei para beber água e o senhor?". Na maioria das vezes, sempre recebia como resposta algo parecido como a ligação daquela madrugada. Aliás, uma bela coincidência, não?
- É, pode ter sido trote mesmo. – Cadu concordara com a minha segunda teoria.
No outro dia, assim que nos encontramos, a primeira coisa que Cadu perguntou foi se alguém ligou novamente. Disse que não. Ninguém ligou mesmo. Concluímos que era apenas uma situação pitoresca que passei e seguimos com as banalidades de sempre.
- EU VOU TE MATAR! ESTÁ ME OUVINDO? VOU TE MATAR, SEU FILHO DA PUTA!
Passados três dias o cara ligou novamente. Mais uma vez de madrugada. Levantei assustado esperando o pior como já disse antes. Quando vi que não era algo sério, relaxei. A voz era mesma. Aparentemente de um homem por volta de quarenta e poucos anos. Dessa vez ele não desligou. Assim que terminou de gritar a mesma mensagem, ficou mudo por alguns segundos calado ou recuperando o fôlego, dando assim brecha para que eu pudesse falar. Calmamente perguntei quem era.
- É O MARIDO DA MULHER QUE VOCÊ ANDOU COMENDO, SEU FILHO DA PUTA!
Já tinha perdido o sono mesmo e a certeza que era trote ou engano me levou a dar corda na irritação do traído. Continuei falando calmamente. Dessa vez, disse que como comia muitas esposas por aí, ficaria difícil saber de quem estava falando. Então perguntei se poderia pelo menos dizer o nome dela.
- NÃO VOU FALAR PORRA NENHUMA. EU VOU É TE MATAR! E QUANDO TE MATAR, FALAREI O NOME DELA NO SEU OUVIDO, SEU MERDA!
Realmente consegui irritar mais ainda o cara. Se ele estivesse na Tijuca, seria possível ouvir pela janela ele gritando, seja qual fosse a rua que ele morava. Decidi então meter o dedo na ferida e dar aquela giradinha para a dor ficar insuportável. Disse que, como não iria falar o nome dela, ficaria difícil saber de quem se tratava para poder, pelo menos, pedir sinceras desculpas. Essa fala das desculpas é um truque velho para o cara dar uma pequena acalmada e te conceder mais uns segundos para prosseguir com o golpe final sem te interromper. Como funcionou, logo em seguida pedi que desse uma pista sobre a esposa. Foi então que sugeri que ele falasse se, quando ela goza, ela geme, grita, mia ou fala o nome de quem está com ela.
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Volúvel
Cerita PendekUm homem com a fraqueza por mulheres, bebidas e arruinar a própria vida. Nove mulheres, nove histórias, nenhuma cronologia. [EM CONSTRUÇÃO - 5 de 9]