Capítulo 2

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- V-vamos sim,Miguel. - Mamãe gaguejou - Estava apenas ajudando a Hillary com as vestes. - Ela o lançou um sorriso amarelo ao meu pai, que logo virou de costas pegando o paletó que estava estendido na cadeira. Impaciente, ele olhou o relógio novamente, e bufou alto ao provavelmente ver que íamos nos atrasar.

Eu e minha mãe caminhamos uma lado da outra, e meu pai, em nossa frente. A rua estava deserta, e os requicios da chuva ainda pairavam pelo asfalto. Abri a porta do carro logo após a entrada de meus pais, e me encostei na porta assim que vi meu pai dar a partida no carro. Me escorei na porta do carro e tentei dar um breve cochilo até chegar ao culto. Fechei meus olhos e alguns falshbacks passaram diante de meus olhos em segundos :

"Não entendia  o que acontecera, nem o porquê do meu pai estar tão alterado. Minha mãe tentava o acalmar de todas as formas, mas ele apenas gritava. Não era a primeira vez que presenciava uma briga entre meus pais, mas meu corpo gelou ao ver a pior coisa que um filho possa ver na vida. Meu pai deu um tapa estalado no rosto da minha mãe, e eu entrei em choque na hora. Percebi que mamãe estava chorando, porém, meu pai não se comovia com a cena, e apenas deu outro tapa em seu braço.

Meus olhos  se encheram de água, a vontade de chorar surgia forte, mas eu apenas gritava e implorava para meu pai parar. Tentei me colocar na frente de minha mãe, mas ele me puxou, me fazendo cair com as costas no chão. Tentava ao máximo me guiar para as escadas, mas minhas costas doíam pelo impacto. Finalmente consegui chegar às escadas, quando a voz de meu pai ecoou pela sala.

- Você vai ficar aqui,Hillary. Porque eu quero que você aprenda a não ser igual a sua mãe. - Encontrei os olhos perdidos de minha mãe no outro canto da sala, ela estava coagida, totalmente escorada no canto da parede. Fui surpreendida com um puxão de braço do meu pai,desta vez mais forte que o outro. Ele me pôs de pé, para observar a cena.

- Você é um monstro! Você não tem autoridade nenhuma de fazer isso com a minha mãe, um dia eu mesma vou vingar tudo o que fez com a gente. - Berrava igual louca, mas era impossivel me manter calma naquele momento. - Eu vou me vingar, por tudo. - O olhava incrédula, com nojo. Ele deu um tapa forte em meu rosto, fazendo minha raiva apenas aumentar. Olhei fundo nos olhos de meu pai, e tive certeza que era a gota d'água. Tinha ódio dele, e sempre terei, e nada nem ninguém mudará o rancor e amargura que sentia por aquele homem."

Minha mãe batia na porta do carro com toda aquela delicadeza que possuía. Levei um espanto ao acordar daquele pesadelo, meus olhos estavam marejados e meu coração acelerado só de pensar naquela noite de novo.  Olhei pela a janela do carro, que já se encontrava parado na frente da Igreja, minha mãe me olhava como se tentasse me tranquilizar, e eu a lancei um olhar confortante. Saí do carro as pressas, e assim que entrei na pequena Igreja pude ver Jackson e Ruth sentados na fileira atrás da minha. Jackson e Ruth eram meus amigos de escola, e os pais de ambos eram amigos dos meus. Me sentei em meu lugar de mãos dadas com minha mãe, meu pai já estava lá na frente de todos, pregando. Eu o observava, ele dizia coisas bonitas sobre Deus, e como a vida de seus discípulos eram importantes para todos que estavam ali naquele momento. Meu pai não demonstrava a mesma serenidade, ou calma em casa.

Fui tirada de meu transe automaticamente assim que ouvi meu nome soar pelo microfone. Estava na hora, lá ia eu de novo. 

Painted on, life is behind the mask

Self-inflicted circus clown

I'm tired of the song and dance

Living a charade, always on parade

What a mess i've made of my existence

But you love me even now

And still i see somehow

Chorus

Wonderful, beautiful is what you see

When you look at me

You're turning the tattered fabric of my life into

A perfect tapestry

I just wanna be me.

Por mais que muita gente achasse minha voz bonita, eu não tinha certeza disso.  Desci daquele pequeno púlpito com pressa, depois de tanto tempo não me sentia envergonhada, mas angustiada.  Assim que sentei em meu lugar ouvi a voz de Ruth perto de meu ouvido.

- Você foi incrível,Hillary.  - A voz dela soou rouca em meu ouvido e eu ri baixo pelo comentário -

- Eu sou melhor dançando que cantando. - Afirmei baixo, tendo a ouvir uma risadinha vindo dela -

- Vocês poderiam calar suas devidas bocas? - Jackson se intrometeu , e  eu apenas continuei olhando para frente. -

- Quem vê pensa até que está interessado. - Falei o mais baixo que pude, mas minha mãe me olhou feio.

Preferi ficar quieta o resto do culto, e apenas ouvir e tentar entender o que estava sendo dito. Admito que meus pensamentos voaram em alguns momentos , e eu acabei ficando desatenta.

Após o culto acabar e todas as pessoas irem embora , sobrou apenas eu, mamãe e meu pai, que nos fitava furioso ainda em cima do pequeno "palco". Ele andou firmemente em nossa direção, e quando estava bem próximo, pude notar a raiva que transbordava em seus olhos.

- Em casa a gente conversa. - Ele disse trincando os dentes, eu realmente senti medo, com certeza eu ia me ferrar. Minha mãe me olhou completamente assustada, sentia que meu coração poderia explodir. Meu pai saiu de dentro da Igreja, e mamãe segurou minhas mãos. Não tinha entendido por que tanta raiva, mas tive que ir para o carro mesmo assim.

Minha mão suava, não fazia ideia do que poderia acontecer. Meu pai se transformava com coisas bobas, e do nada, então não fazia ideia o que havia irritado ele. Entrei no carro e me sentei e em seguida minha mãe bateu a porta para fechá-la. Ficava imaginando o que tinha acontecido e no que ia acontecer comigo, principalmente no que meu pai se transformaria. Ficamos em silêncio até chegar em casa, e assim permanecemos até entrar. Achei que meu pai tinha esquecido, então corri para as escadas.

- Aonde você pensa que vai? - Ouvi a voz dele e em segundos meu corpo gelou. Seu tom de voz era arrogante, e a fúria era notada - Vem aqui agora , Hillary. - Ele ordenou. Senti minhas mãos tremerem.

- P-pai...O-o que..- Fui interrompida por ele, que já berrava -

- Cala a boca. - Ele berrou. - Você não consegue passar um segundo quieta? Você me fez passar vergonha naquele culto, porque não ficava quieta! Minha vontade é de te bater muito. - A cada palavra meu corpo tremia, meus olhos se enchiam de água.- Você não consegue calar a boca é? Eu vou te fazer calar. - Ele deu um tapa forte, consegui ouvir minha mãe gritar ao ver aquilo. Minha bochecha formigava e ardia, e lágrima quente escorreu pelo meu rosto. - Vai agora pro seu quarto, e se acontecer de novo...- Ele deu uma pausa e se afastou, entendi o recado dele. Se não fosse morta, seria despejada de casa. Subi correndo para meu quarto, com meu rosto já domado por lágrimas. Afundei minha cabeça no travesseiro e gritei, para descontar toda a minha raiva. Aquele homem era horrível, qualquer pessoa se sentia amedrontada só de olhar para o rosto dele. Acabei pegando no sono, com as mesmas vestes e com o rosto melado de lágrimas.

























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