Os Cavaleiros da Energia Divina

19. O Surgimento da Vida

Aika estava sentada junto à entrada de Gémeos, olhando para o horizonte. Na verdade, não estava a observar nada em concreto, estava apenas perdida nos seus pensamentos e no que Shion havia dito. Guardava uma imagem mais simpática dele, agora apenas o achava um homem arrogante e autoritário, nem parecia o mesmo cavaleiro que ela havia conhecido. Aika trabalhara na biblioteca a sua vida toda, tinha lido imensos livros, e sabia perfeitamente que a vida que Atena tinha dado aos seus cavaleiros não seria permanente. Ela acabaria por vir a perder Mu, Saga e todos os restantes cavaleiros de ouro com quem se tinha habituado a conviver nos últimos tempos. Isso era o suficiente para a abater e deixar frustrada. Não sentia nem as gotas daquela chuva gelada que lhe lavavam a cara sem piedade.

Saga observava-a. Percebia nela uma enorme tristeza, uma vontade de gritar com o mundo por tudo aquilo que lhe estava a fazer. Era incrivelmente doloroso para ele vê-la assim.

— Continua a tentar ficar doente, Aika? - questionou, ao longe.

Aika não o ouviu. E se ouviu, não teve a mínima reação.

— Aika? - questionou, novamente, Saga.

A aprendiz não o ouvia. Já tinha sido doloroso demais ver Mu morrer uma vez, vê-lo partir novamente seria terrível para ela, e ela não queria, não conseguia sequer suportar a ideia. E depois tinha Saga, que estava a ser um dos melhores amigos que poderia ter arranjado naquele lugar. Vê-los morrer seria demasiado torturante. Naquele momento, ela estava completamente perdida no mundo imaginário e tudo o que viesse de fora da sua cabeça iria ser ignorado por completo.

O cavaleiro de Gémeos aproximou-se rapidamente, temendo que algo se passasse com a jovem.

— Aika! Aika! Você está bem?! - questionou, colocando-lhe a mão no ombro.

Aquele toque fez a jovem despertar e olhar para ele, confusa.

— Você me assustou, Aika, o que é que se passa? - perguntou ele, sentando-se ao seu lado, colocando a sua capa por cima da cabeça da aprendiz, e aconchegando-a junto ao seu corpo.

— Eu... Eu... - balbuciou, fixando novamente o olhar no horizonte, sem focar nada em especial.

— Fale comigo.

Aika suspirou e desabafou:

— Um dia vou perder-vos a todos, mestre. Depois de ter perdido toda a minha família, vou também perder-vos a vocês.

— Do que está a falar, Aika? - perguntou Saga, assustado.

— Atena reviveu-vos, e eu sei perfeitamente as consequências disso. Vai chegar um dia em que vos terei de dizer adeus. E, quando esse dia chegar, que, depois de tudo o que li, não deve tardar muito mais, eu voltarei a ficar sozinha. Todos estes homens que me voltaram a fazer acreditar na bondade dos cavaleiros voltarão a desaparecer. Os sentimentos, os momentos, as alegrias e as desilusões... serão apenas memórias que nunca poderei reviver. Nada se pode comparar ao enorme poder da deusa Atena, mas eu faria o que fosse preciso para vos manter vivos...

Saga baixou o olhar, entendia perfeitamente aquilo que a jovem estava a tentar dizer.

— Não perca o presente por causa do medo do futuro, Aika.

— O problema é mesmo esse, mestre... não iria haver futuro. Nem para si, nem para Mu, nem para nenhum dos cavaleiros.

Saga limpou docemente as lágrimas dos olhos de Aika.

— Minha pequena aprendiz, não chore por antecipação. Nós estamos aqui de corpo e alma agora, e isso não mudará tão cedo. Além disso, eu, Saga de Gémeos, não a irei abandonar sem mais nem menos, a minha missão é ensiná-la, Aika, e protegê-la, aconteça o que acontecer.