Natureza morta.

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Te joguei do alto de 26 andares
Na forma de um cuspe
Te cobri de pancadas dentro da minha cabeça
E gritei pros quatro ventos "foda-se toda essa merda"

Bebi e pedi desculpas enquanto meu estômago revirava feito uma máquina de lavar
E voltei a pedir desculpas
Todas sujas

"Mas você gosta de mim tipo um abacaxi ou uma maçã?" perguntei, bêbada
"Eu não gosto mais de você" você disse, sóbrio

Fingi que esqueci e em outras almas me encostei
Beijei em banheiros sujos e cheirando a urina velha
E depois fui pra casa, vazia de tudo
Levando dentro da bolsa uma garrafa cheia de nada

Você me disse que eu era jovem demais
E que precisava cuidar do meu fígado
Respondi bebendo direto do gargalo
E ficando com as pontas dos dedos queimados

Te disse adeus e depois te disse olá
Quis sumir e desejei voltar
Te criei com as minhas palavras
Para que assim, pudesse te odiar

E não pude
Você voltava a cada seis meses
Vomitava na minha frente o que tinha por dentro
E por fora, me fazia queimar num sol desgraçado
Enquanto dizia que me amava

Fugi dessa vez, pra bem longe de você
Menti uma centena de vezes, chutei portas e paredes
Arrebentei corações alheios
E mandei mensagens de texto

Pensando até aqui, talvez eu seja uma maçã
Comum e muitas vezes oca
Fácil de se encontrar
Já você? Seria um abacaxi
Difícil e fechado
Tão cheio de camadas
Nunca sei se doce ou azedo
Imprevisível

Mesmo assim, eu continuo a fugir de alguma forma
Pra longe de ti
E ainda de encontro aos seus espinhos e seus sorrisos
Como uma mosca que sempre volta pra teia
Mesmo sabendo do perigo.

Eu e o VentoOnde histórias criam vida. Descubra agora