Futuro sombrio

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O enorme cogumelo de fumaça, fogo e plasma cresceu para tomar todo o céu. Já não havia câmeras de filmagem analógicas para registrar aquela tragédia. Os celulares e câmeras digitais estavam todos fritos devido ao pulso eletro magnético da bomba atômica. O epicentro da explosão foi o Aterro do Flamengo, era um domingo e milhares de pessoas foram instantaneamente vaporizadas. A onda de choque e de calor se espalhou demolindo bairros vizinhos como Botafogo, Catete, Glória e Urca. O Pão de Açucar foi tomado pelas chamas ficando completamente tostado. Mais ao longe, a onda de choque atingiu o Corcovado, fazendo-o estremecer. No topo, a estátua símbolo da cidade, o Cristo Redentor partiu-se como um biscoito (ou bolacha) Cream Cracker e um terço dela, incluindo o braço esquerdo e parte da cabeça, caiu morro abaixo.

Debaixo de toda aquela chuva de fogo e caos, apenas uma figura foi capaz de se erguer. Uma massa negra e fumegante na forma de pessoa. Ele abriu os olhos, o calor provocando lágrimas que escorriam e evaporavam antes de chegar no meio do rosto. Ele caiu de joelhos amassando nas mãos a areia seca da praia. Sua postura era de completa derrota.

Sua voz rouca escapou embargada — Eu falhei! Falhei de novo. Eu num aguento mais.

E então, ele estava deitado numa sala de paredes e teto de branco límpido, sobre um colchonete de couro verde claro. Um par de lágrimas escorreu pela lateral e pingou na maca. A expressão de Café era de dor, desespero e desesperança.

O moleque estava de pé, encostado na entrada da sala. Ele olhava para Café com seus olhos grandes um pouco aumentados pelas grossas lentes de seus óculos. Café piscou forte duas vezes e pronto, a imagem de Coffee Break tinha desaparecido. Ele voltou seu olhar para o rosto preocupado de Timeslip, sentado ao seu lado.

— Quantas vezes fizemo isso, Vagalume? Cinquenta?

— Cinquenta e quatro, Coffeepal. — respondeu Timeslip, o herói tetraplégico, ao seu lado preso à sua cadeira de rodas.

No canto da sala, numa poltrona, estava Forecast, uma agente da SPIA. Uma senhora magra, de cabelos antes ruivos, agora grisalhos, vestindo um macacão jeans e blusa branca. Sua pele era muito branca e os olhos verdes, cansados, mas expressivos. Seus lábios, sem baton, estavam comprimidos. Seu fardo era ver o futuro, mas sem poder fazer muita coisa para alterá-lo.

A SPIA, Agência de Inteligência dos Super Poderosos, sabia que uma catástrofe sem precedentes se aproximava. Todo arsenal nuclear americano, russo e de outros tantos países fora roubado. Foi uma roubo perfeito e que não deixou rastros. Algo que só poderia ser explicado como sendo fruto da ação de alguém dotado de superpoderes.

O Homem-Café, Timeslip e outros heróis da LIS, Liga Internacional de Supers, estavam trabalhando no caso. Tentavam através de viagens no tempo para o futuro, descobrir quais cidades seriam atingidas, quais seriam os pontos de impacto e tentar descobrir alguma pista sobre como se dariam os ataques. A teoria da imutabilidade do passado era muito sólida, mas os teóricos da SPIA acreditavam que combinando as previsões de Forecast e as viagens ao futuro de Timeslip poderiam encontrar uma maneira de evitar o apocalipse.

As previsões da Agente Forecast apenas se confirmavam. Em poucas semanas, as principais cidades do mundo seriam alvo de ataques nucleares. O mundo ainda não sabia com certeza, mas havia rumores. Os poucos que tinham acesso àquela informação, faziam preparativos para evacuar as cidades, levar pessoas para abrigos, e até enviar uma missão às pressas para a estação espacial internacional, na esperança de promover a sobrevivência da espécie. A cada dia que passava, aumentava a paranóia e diversas teorias conspiratórias se espalhavam pela internet.

— Essa é a pior crise que já enfrentamos, Coffeepal, pior que a invasão do Bruxo Negro e dos Megalomonstros Abissais de Tóquio.

— O pior é que nem sabemo quem é o fio duma égua por trás disso tudo!

— O que acha, Kaylin? — indagou Timeslip. — Concorda com a teoria a respeito dos radicais islâmicos?

Ela tinha uma voz calma e rouca — Já vimos que as dezenas de cidades de países islâmicos também serão atingidas. Eu descartaria isso...

— Diga isso pros chefões, o que sei que mais da metade dos agente tão investiganu grupos radicais. — retrucou Café incomodado. Ele virou a cabeça e ficou quieto. Olhou para Kaylin e seus olhos se iluminaram. — Os ataque que pudemos ver foram dirigidos às cidades com maior densidade populacional. Tem alguma que escapuliu da regra? — O Homem-Café tinha um palpite.

— Nós viu o Rio, São Paulo, Belo Horizonte e Salvador, no Brasil. Todas fumegadas. E Brasília? Oia aí na internet a população.

Kaylin tinha um tablet nas mãos e fez a consulta. Ela disse pronunciando o nome das cidades brasileiras com o típico sotaque americano — Aqui está: São Paulo, Rio, Salvador, Brasilia...

— Ué? Brasília é a quarta do Brasil? E achava que Beagá tinha mais gentes... decidido. Vou pra lá.

— Como assim, Coffeepal?

— Fala pros chefões que cansei dessa joça. Tô fora. — Café levantou-se saindo da maca em direção a porta.

— Ei, docinho, trás para mim um pacote daquele seu café, está bem? — pediu Forecast.

— Sinceramente, Kay, o café da minha marca é ruim pra cacete.

— É melhor que a maioria da sujeira que consumimos aqui. Além do mais, não é pelo Café, mas pela embalagem. Sabe que sou sua fã.

— Vai me dizê que tem bunequinho meu...

— Tenho sim, de todos vocês. E chuta a bunda de uns corruptos por mim, ok?

Café sorriu pela primeira vez, mostrando os dentes muito brancos contrastando com sua cor de piche fosca.

— Onde você arranjou dentes tão lindos, Coffeeman?

— Meu patrocinadores fizeram eu arrancá os meus véio. São tudo novinho, de porcelana.

A agente levantou-se e deu um abraço apertado nele. — Se cuida, docinho.

mais, Kay. Nos vemos, Vagalume.  

Homem-Café - ApocalipseOnde histórias criam vida. Descubra agora