II - CALEIDOSCÓPIO - Praga

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"Nada é tão ruim quanto parece, sabe? Talvez você só esteja vendo tudo com as cores erradas.
Ou, talvez, você seja daltônico."

(x)

O sol lucilava agradável no céu de Julho, mas não suficientemente quente para o fazer abrir mão do colete roxo de brim acetinado; entretanto, Magnus suava às bicas.

Quando Lucy Morgan dissera que Alec estava contando consigo, ao sair para o pátio do playground, na parte posterior do orfanato, ele não sentiu tanta certeza. Alguns metros de distância à frente, Alec empurrava-se melancolicamente no balanço, sem tirar os calcanhares do chão ou o olhar do livro infantil em seu colo.

De alguma forma, Magnus ficou intimidado.

Ele é só uma criança inocente, tentou convencer a si próprio, limpando alguma poeira imaginária dos ombros e treinando um sorriso paterno. Mas tinha só vinte e quatro anos, e ele nunca quisera ser pai. Era por isso que usava camisinha. Aliás, era exatamente por isso que ele fazia questão de usar camisinha!

- Por quanto tempo ficará aí?

Magnus piscou. A voz de Alexander, mesmo naquela distância, foi alta e clara. Ele pensou se, após a puberdade, o menino fosse adquirir uma voz poderosa e grave, como a de um líder.

Ficou relativamente perturbado com a ideia e desistiu de evitar seu fatídico destino, descendo os singelos degraus de concreto que o apartavam do caminho encimentado, o qual protegia dos pés a grama secada pelos incisivos raios de verão.

Os sapatos cuidadosamente engraxados fizeram um barulho esquisito quando Magnus pisou na enorme caixa de areia dos brinquedos. Caixa de areia lembrou-o de Presidente Miau e dos presentinhos matinais.

Urgh!

Mas, olhando de perto, a areia não era tão suja assim. Não que fosse limpa o bastante para ser um lugar convidativo para sentar-se e divagar sobre a vida, o universo e tudo mais. Magnus ainda analisava os arredores quando ouviu um tão suspiro cansado e aborrecido, que poderia muito bem ter vindo de algum velho ranzinza de oitenta anos de idade.

- Qual é o seu problema? - inquiriu Alec, erguendo o olhar vazio para Magnus pela primeira vez. - Senta logo! Você está fazendo sombra e eu não consigo ler direito.

- Desculpe... - pediu Magnus, meio envergonhado por ter acatado imediatamente com a ordem ao tomar assento no balanço disponível ao lado: uma ridícula tira de borracha, para qual ele torcia que não arrebentasse debaixo dos seus setenta e três quilos.

Alexander o acompanhou com a ausência de emoção que sua voz conseguira transpor momentos atrás, e logo retornou às intrínsecas palavras de Antoine de Saint-Exupéry. Esticando os olhos, Magnus leu:

"O que eu devo fazer para cativar você?", perguntou o Pequeno Príncipe.

"Você deve ser muito paciente", disse a raposa. "Primeiro você vai sentar a uma pequena distância de mim e não vai dizer nada. Palavras são as fontes de desentendimento. Mas você se sentará um pouco mais perto de mim todo dia."

- Gosta de ler? - perguntou Magnus, percebendo que o garoto havia o flagrado lendo clandestinamente O Pequeno Príncipe. O mais velho acrescentou rapidamente: - Eu gostava muito desse livro quando era mais novo. Talvez nós tenhamos ótimos gostos em comum, não concorda?

GROWING UP ;; malec (HIATUS)Onde histórias criam vida. Descubra agora