Mendiga - Não mexa no meu lixo!

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A noite estava fria, mas a família Moura estava em festa. Era aniversário do vovô Mauro e todos se reuniram para um jantar para lá de animado. Som de música alegre escapava pelas frestas das janelas e muitas vozes eram ouvidas pelo lado de fora da casa. Uma mendiga encurvada passava por ali, estava com fome e sentia um pouco de frio também. Suas roupas eram desgastadas e sujas, tinham muitos remendos e rasgos em um lado ou outro. No pé calçava sapatos velhos, de diferentes pares e tamanhos, não podia dar-se ao luxo de jogá-los fora ou pisaria descalça nas calçadas sujas daquela vizinhança, onde ratos e baratas circulavam a todo tempo, poderia até mesmo cortar-se em cacos de vidro das garrafas estilhaçadas por causa das brigas promovidas pelos bêbados. Seu estômago roncava alto agora, afinal, faziam vários dias que não comia nada.

- Ai, que comida nojenta! - As vozes do interior daquele casarão gritaram em uníssono.

A mendiga correu para perto da porta, talvez ali alguém se compadecesse de seu sofrimento e lhe servisse algo que pudesse comer.

- Moça? - Chamou em alta voz.

- Ei! Alguém pode me ajudar, por favor? - A maltrapilha começou a bater palmas na porta da casa, na esperança de que alguém viesse lhe atender. Sentia-se fraca e doente por causa da fome.

Ela encontrou uma lata de lixo e não teve alternativa, tirou a tampa e começou a revirar tudo que encontrava pela frente na tentativa de achar algum alimento descartado por ali.

- Deixa que eu resolvo. - Uma voz de mulher soou de dentro da casa enquanto a festa ainda acontecia por lá.

- Quem é você? - A voz da mulher soou do alto da escadaria exalando desprezo e repulsa. - O que você quer com o meu lixo?

A mendiga parou de procurar e apertou-se um pouco enquanto explicava-se com voz chorosa.

- Moça... - Começou a falar e sentiu as lágrimas escorrerem por seu rosto sujo. - Eu só preciso de um resto de comida.

A mulher rica caminhou na direção da mendiga, o que fez com que ela desse alguns passos para trás, tomada pela vergonha.

- Qualquer coisa serve pra matar a minha fome. - Argumentou.

- Estou dando uma festa com a minha família. - A dona da casa começou seu discurso, sem esconder a irritação por ter encontrado aquela rata de esgoto fuçando sua lixeira. - Você acha que vou dar a minha comida pra você?

A pobre mulher encolheu-se ainda mais, arrependida de ter pedido qualquer coisa para aquela ricaça cruel. A outra vendo o desespero da mendiga e incomodada por sua aparência imunda e pelo mau cheio que exalava dela, gritou com raiva enquanto a empurrava de volta para a calçada cheia de sujeira e lama.

- Sai daqui, sua nojenta! - A mulher voltou para casa em seguida, deixando a mendiga caída no chão.

- Alguém pode me ajudar, por favor? - A mendiga começou a gritar com toda a força que havia em sua alma, morrendo de fome e sentindo na pele o desprezo dos demais. 

- Enquanto você só sabe olhar o prato que tem na sua mesa e reclamar: "Eu não vou comer essa porcaria, porque isso aqui não é comida de gente!" - Ergueu-se do chão e começou a andar em círculos pelas ruas, chamando atenção de todas as pessoas que passavam por ali. - Você reclama porque não sabe o que é passar fome! O que é acordar pela manhã e não ter o que comer.

Ela estava descontrolada, andava de um lado para o outro ainda gritando para quem quisesse ouvir.

- Não sabe o que é passar pelas calçadas, sentir o cheiro da comida e não ter. - A voz dela encheu-se de raiva enquanto proferia as palavras. - Você sabia que quando você olha para seu pratinho na mesa, reclama e murmura, é o mesmo que você estivesse dizendo... - Ela olhou para o alto antes de gritar as palavras. - DEUS! Se EU estivesse aí no SEU lugar, EU colocaria uma comida melhor aqui!

- Seus ingratos, murmuradores! - Ela gritava para o nada, mas sabia que todos estavam escondidos atrás de suas cortinas ouvindo as palavras que saíam dos lábios de uma mendiga morta de fome. - Mas não tem problema, não. Já que o seu Deus só te deu essa comida, põe o resto no lixo que eu como.

A voz dela traía toda a dor que carregava no peito enquanto falava.

- Eu não me importo se a comida tá podre, se cheira mal. - Ela admitiu. - Eu sei que vai matar a minha fome. Alguém pode me ajudar, por favor?

A pequena missionária que estava ali perto entregando alguns folhetos e orando em silêncio compadeceu-se da mendiga.

- Saiba que Jesus não quer te dar migalhas. - Ela afirmou enquanto sorria com amor. - Porque assim como Ele cuida dos lírios dos vales, das flores do campo, Ele também quer cuidar de você. Jesus te ama!

- Jesus me ama o quê, moça? - A mendiga explodiu revoltada. - Tudo o que você sabe dizer é que Jesus me ama! - Ela aproximou-se da anã e gritou. - Amor não enche barriga, não! E tem mais, essa história eu já ouvi!

A mulher começou a chorar e abraçar-se desolada.

- Esse Jesus não pode fazer nada por mim porque ele está morto. - A mendiga deu as costas para a mulher e voltou para perto da lata de lixo.

- Jesus não está morto! - A missionária insistiu. - Ele já ressuscitou, e Ele quer acrescentar vida à sua vida! Ele quer te tirar dessa miséria.






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