Capítulo 4

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Naquela tarde eu saí. Não para uma festa, nem nada do tipo. Eu saí e fui até a pracinha do meu bairro. Sentei e fiquei lá olhando as pessoas. Sem nenhum propósito. A verdade é que eu estava arrependida por ter dado a louca daquele jeito. Quer dizer, a Luíza não devia ter mexido nas minhas coisas, mas eu também não precisava ter feito aquele show. Não precisava gritar e praticamente a expulsar da minha casa. Ah, droga, eu sou uma pessoa horrível! Continuei ali sentada, por uma meia hora. O dia começou a escurecer e eu fui andando de volta pra casa. Eu gosto do inverno e tal, mas eu não gosto que o dia vire noite muito rápido. Gosto do horário de verão, quando já são sete da noite e o sol ainda está brilhando. Parece estranho, mas eu acho que as crianças de hoje precisam brincar mais, e quando o dia ainda está claro, é o momento perfeito. Acredito que as pessoas devam criar memórias das quais um dia no futuro possam olhar e pensar que foram realmente felizes. Talvez ficar sentada lendo um livro não seja a forma mais ativa de se viver. Mas a verdade é que lá na frente eu vou olhar para todos os livros que já li e sorrir. Essa é a minha forma de criar memórias. Estava pensando nisso quando entrei em casa. Meu irmão estava brincando de carrinho e minha irmã na mesa estudando. Parei na cadeira atrás dela e vi seus cálculos rabiscados atrás de uma folha. Uma folha com nome de livros escrito "emprestar". Dei uma risada alta e ela xingou baixinho.
- Você me atrapalhou Alice!
- Mas eu não fiz nada! - me justifiquei e soube que já íamos brigar.
- Ah, claro, só deu essa sua risada de foca no meu ouvido.
Risada de foca!?!? Essa foi demais!
- Nossa Carina, você é tão chata, mas tão chata, mas tão chata
- Meninas, meninas! Quantos anos vocês tem pra ficar brigando desse jeito? 5? - minha mãe interrompeu aos berros com um balde na mão e um pano de chão no ombro.
- Mas mãe, a Alice parece que não
Mais uma vez minha mãe interrompeu:
- Ai gente, que chatice ouvir vocês duas brigando, parecem que são menores que seu irmão!
- Eu sou mais esperto que vocês, lá lá lá - cantarolou Matheus e subiu no sofá. Minha mãe logo entrou em cena:
- Mas parece que não tão esperto assim, porque tá pulando no MEU sofá, justamente na MINHA frente! - e entrou na sala deixando o balde no chão da cozinha, para tirar meu irmão de seu pula-pula improvisado. Olhei de soslaio para minha irmã e vi que ela sorria:
- Porque você fez uma lista de livros para emprestar?
Suspirei e contei a história toda pra ela, e logo a gente já não estava mais na cozinha, mas deitadas na minha cama.
- E aí ela foi embora se sentindo mal e eu fiquei me sentindo pior ainda.- finalizei a trança que estava fazendo em seu cabelo. Diferente de fazer uma trança no meu cabelo, no cabelo de Carina a trança para. No meu ela escorrega.
- Mas você gritou com ela?- minha irmã perguntou se sentando- Só acredito vendo, porque você é tão calma, não é do tipo barraqueira.
- E eu não sou barraqueira. Nem fiz barraco! É só que eu fiquei brava por ela ter mexido nas minhas coisas, e acho que eu também já estava estressada por causa de toda a situação do empréstimo de livros.
Carina sacudiu a cabeca, e a trança se balançou.
- Sinceramente, eu acho que você tá exagerando um pouco. Se você ligar agora mesmo e pedir desculpas, em questão de segundos ela vai estar tagarelando sobre uma coisa qualquer, como se nada tivesse acontecido.
- Você acha? - perguntei enrolando a ponta da coberta.
- Eu tenho certeza. Aproveita e liga pra ela enquanto eu me arrumo. - ela falou se levantando da cama.
- Se arruma pra ir onde?
Carina baixou os olhos e respondeu baixinho:
- Eu vou sair com o Álvaro.
Abri a boca e arregalei os olhos. Levantei da cama também e dei um pulo, a boca aberta mostrando minha incredulidade.
- Não acredito que vocês vão ter um encontro! Ai meu Deus, eu sempre soube!
- Encontro? Não é um encontro, ele só me chamou pra ir jantar com ele, sua louca.
- JANTAR!? Que tipo de "amigo" - fiz sinal de aspas com as mãos - chama a "amiga"- repeti o sinal - para jantar, se não tiver a intenção de, sei lá, te beijar?
- Alice!! - ela colocou a mão na cintura, mas percebi que ficou vermelha - Ele não quer me beijar, para de criar caso. A vida não é um desses seus livros de romance. E eu nem quero que seja!
Ignorei.
- Você vai de que roupa? Não me diga que vai de calça jeans e blusa!
- Claro que eu vou de calça jeans e blusa! Qual o problema de ir de calça jeans e blusa? - o jeito que ela repetiu as palavras, me fez perceber que ela já sabia qual o problema.
- Carina, presta atenção. Se usa calça jeans e blusa, para ir no cinema, para ir no Shopping, para ir sei lá, na padaria. Para jantar, se usa uma saia, um vestido, um penteado bonito e um perfume caro!
- Você tá viajando!
- Posso até estar viajando, mas vou fazer o Álvaro viajar na sua beleza, pode ter certeza - falei brincando e rodopiei ela - Vai tomar seu banho e quando sair, sua roupa vai estar estendida na sua cama.
Sem ter alternativa, ela entro no banheiro repetindo que ficasse claro que aquilo não era um encontro. Sei. Abri o guarda-roupa dela e enquanto descartava uma saia brega, meu celular fez barulho. Ainda com a saia na mão, peguei o celular e fiz a senha. Jesus, aquela saia era horrível mesmo! Joguei ela no guarda-roupa e olhei para os cabides. Não. Não. Talvez. Pera aí. "Você tem uma mensagem não lida" Soltei o vestido florido que estava na minha mão e abri o Anonymous Readers. E lá estava no início do chat, um "oi!" de uma conversa diferente. Fui verificar e descobri quem era. "ogarotodoslivros". Oh! Eu tinha esquecido completamente dele. Fiquei tão nervosa com a Luíza por causa disso e agora nem me lembrava mais. O que prova como sou uma pessoa terrível. Continuei ali, estranhando a mensagem. Eu pensei que ele nem fosse responder! Porém respondeu o meu "oi!!". Não respondeu da mesma forma, faltou um ponto de exclamação para se igualar ao meu. Caraca, acho que só eu olho para essas coisas bobas! Mas ali estava o "oi!". Um ponto a menos não fazia diferença. Até porque eu nunca ia falar com ele de novo. Bloqueei a tela e continuei minha busca pela roupa perfeita. Depois fui ligar para Luíza. Estava na hora de resolver certas coisas.

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