Escola da Vida Capítulo 7

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Oito anos se passaram. Perdi totalmente a esperança de um futuro melhor. Já não sonho mais com um País de cara limpa, simplesmente adormeço.

Quisera ter coragem de contar tantas outras coisas cruéis que observei na rua dos meninos.

Há muitos anos venho falando de meninos que brincam como crianças, que amam como adultos e roubam como bandidos.

Meninos que vão a luta o dia inteiro, que fazem bicos nas feiras, que guardam carros, que esmolam nas sinaleiras, que tomam banho de chafariz e brincam, simplesmente brincam.

Se o dia está quente, lavam suas roupas e secam as margens do lago, depois dançam  na calçada na porta das lojas de eletrodomésticos.

Hoje no meu coração os meninos são as estrelas de um teatro criminoso e violento, triste sina de violência que começa em casa e termina na geladeira do IML.

Já não tenho mais tempo para fazer atividades lúdicas nas calçadas.

Tenho dedicado todo o meu tempo para um novo trabalho de educação social de rua e educação ambiental na vila Cai Cai.

Se encerrei o meu trabalho como educadora de rua, ainda não sei . não tenho coragem de contar o fim da história.

Meu pequeno príncipe Charles virou prêmio literário, pelo trabalho com os meninos de rua "Os Tartarugas Ninjas", fui homenageada na Câmara de Vereadores ano retrasado.

        Dias atrás fui visitar a turma da Alice no "cavalinho", e o cara acordou e pulou de golpe, me assustei, me abraçou.

Era Edson ex-líder dos Tartarugas Ninjas.

Abracei-o e conversei com a gurizada.

André, o professor de capoeira da vila Cai Cai estava comigo. Apresentei-o aos meninos.

Foi bonito rever Daiane, Danda, Eliane, Edson...

- Onde está o Chinês?

Silêncio, os meninos se olharam...

- Ela tem que saber mesmo, disse Danda.

- O que aconteceu com o Chinês?

- Mataram ele tia, faz um mês.

Por muitos dias a morte reinou dentro de mim.

Tarde chuvosa de sábado, combinei com o professor de capoeira de irmos até a vila Cai-Cai e depois ao IML.

Estava decidida a desvendar a morte de Chinês.

Com uma foto do Chinês nas mãos, entramos no IML. O cheiro de carne podre me revoltou o estômago e minha cabeça começou doer muito, dor tanto quanto a que trago na alma de ter que buscar o corpo de um filho que não gerei nas minhas entranhas e sim no meu coração.

Haviam homens que conversavam comigo, que me ouviam, que olhavam a foto do Chinês e que o reconheciam.

Queria chorar, queria fraquejar, queria gritar com toda a minha força de mãe, de mulher, de bicho selvagem, de natureza, mas o capoeira André me pediu que eu não fizesse escândalo.

Queria abraçar forte meu mano capoeira, como se dessa forma eu pudesse ser forte...

Haviam dois cadáver sob as mesas e o suposto corpo do Chinês na geladeira.

O funcionário do IML olhou na geladeira e perguntou se eu queria olhar.

Covarde, covardemente não tive coragem. Minha cabeça doeu e minha menstruação escorria pelas pernas como se tudo vazasse de dento de mim.

Os Ninjas do BueiroOnde histórias criam vida. Descubra agora