Dialogando a música

1 Apresentação

Talvez você já tenha ouvido falar que música é matemática.

Talvez já tenha ouvido falar que música é um tipo de linguagem.

Talvez, mas não acreditou muito nisso, não levou a sério. Mas são duas verdades plenas.

Vejamos a primeira dessas verdades: música é matemática.

Desde a antiguidade, os filósofos já perceberam e estudaram as relações entre a música e a matemática. Porém, eles se limitaram aos cálculos, porque não tinham como demonstrar isso na prática. Hoje, nós podemos comprovar isso: o seu computador executa música. O computador não apenas reproduz uma música gravada, mas é capaz de tocar uma música, se você baixar um programa específico, que possua um teclado musical e possa ser acionado. Ora, todos nós sabemos que o computador é uma máquina que usa linguagem matemática, tudo no computador se faz com números. Eu estou aqui escrevendo e você está lendo as palavras, porém isso é só a aparência externa para o usuário. Internamente, o computador trabalha com números e os transforma em imagens, no caso, em letras e palavras. Se o computador só usa a linguagem matemática e se ele consegue executar uma música, a conclusão é uma só: a música é matemática.

Mas não se preocupe, você não vai precisar estudar matemática para entender a música, para isso, bastam seus ouvidos. A referência à matemática é apenas para explicar que a música possui umas regrinhas repetitivas para a sua execução, assim como a matemática também tem. Vamos nos ater às operações simples, que todos nós aprendemos na escola desde criança: somar, diminuir, multiplicar, dividir. Para executar essas operações matemáticas, precisamos organizar os números em parcelas e realizar alguns malabarismos mentais, por exemplo: 2 + 3 = 5; 4 x 6 = 24; 10 : 4 = 2,5. Para essas operações simples, não precisamos usar calculadora, somos capazes de realizá-las de cor. Na música, isso também acontece. Vamos precisar fazer alguns malabarismos mentais semelhantes a esses, para entendermos a sequência de sons de uma melodia, nada complicado. Se você é capaz de fazer essas contas acima "de cabeça", então compreenderá sem dificuldade as relações entre os sons, que iremos explicar.

Agora, vejamos a segunda verdade: música é linguagem.

Aprender música é a mesma ação de aprender a falar uma outra língua. Você certamente já estudou inglês ou francês ou espanhol ou italiano e sabe o que isso significa. Aprender uma outra língua implica aprender a pensar com outras categorias de conceitos, convertendo as palavras que possuem um mesmo significado: água, water, eau, aqua; pão, bread, pain, panne. Basta ler algumas dessas palavras que você logo as identifica. Vamos complicar isso só um pouco, para depois descomplicar. Observe as palavras seguintes: spiritus - πνευμα - הןֹך . Talvez você tenha reconhecido a primeira "spiritus" porque é parecida com a palavra portuguesa "espírito" e é isso mesmo. As outras duas são as palavras pneuma (espírito, em grego) e ruah (espírito, em hebraico). Essas talvez você não tenha identificado, porque elas não estão escritas com as letras latinas, que nós estamos acostumados a usar.

Algo semelhante acontece com a linguagem musical e é isso que vamos aprender. A música não se escreve com letras comuns, essas que você está lendo. Ela se escreve com um conjunto de símbolos diferentes, assim como os sinais das línguas grega e hebraica. Quem conhece os caracteres gregos e hebraicos (ou de qualquer outro idioma que utiliza símbolos em vez de letras) é capaz de identificar os sons de sua pronúncia. O mesmo acontece com quem conhece caracteres linguísticos da música, que são as notas musicais. Tudo é uma questão de estudo e aprendizagem. Então, para aprender a linguagem musical, você vai precisar aprender os sinais com os quais se escreve a música: as notas musicais. Mas isso será feito apenas dentro do mínimo necessário, você não precisará tornar-se um especialista nessa linguagem, apenas um simples leitor.

Por último, faço uma recomendação: não tente começar a praticar antes de aprender a identificar as notas e reconhecê-las na escrita. Conheço pessoas que aprenderam a tocar um instrumento como quem aprendeu a andar de bicicleta: praticando, apenas. Não se deixe iludir com isso, não são ações semelhantes. Você até conseguirá executar uma música no teclado exercitando-se bastante. Mas essa prática, resultado de simples memorização, é totalmente improdutiva, você não conseguirá ir além disso. Ao contrário, aprendendo a leitura musical, você executará a música com domínio e consciência e o seu aprendizado seguirá um contínuo aperfeiçoamento.

A proposta deste escrito é explicar, de modo simples e direto, a leitura e a escrita musicais, isto é, a música enquanto linguagem. Não terá nenhuma evolução pelo aspecto da técnica ou da matemática. Se o seu objetivo é tornar-se um músico profissional, aconselho a buscar um estudo específico. Este aqui busca apenas introduzir o(a) interessado(a) no mundo da música, dialogando com ela, ou melhor, dialogando-a. Você não vai dialogar com a música, você vai dialogar a música, ou seja, vai "falar" a linguagem musical, através dos seus dedos. Se você tiver perseverança, conseguirá.

Convido-o(a) a aceitar esse desafio e lhe desejo um ótimo desempenho.