Sempre tive amigos imaginários na minha infância, pelo menos foi assim que os descreveram para mim.
Aos meus olhos e sentidos, sempre foram muito reais, mais reais até que os amigos que eu tinha, na verdade, que os amigos que eu não tinha.
Sempre estavam ali, brincando comigo, a criança estranha demais para ser merecedora da amizade.
Com "eles" as coisas estavam ocorrendo bem em uma hora, e na outra, nem tanto.
Eles, as pessoas que me acompanhavam e só eram visíveis aos meus olhos, tinham uma característica em comum: seguravam uma vela. Mas suas velas não eram sempre iguais, e a maneira em que ela se encontrava dizia muito sobre a pessoa que a segurava, bem, "pessoa".
Classificava-os em dois grupos: sun e moon, os nomes vindos da minha falta de imaginação já pode ter deixado claro a razão da distinção entre eles. Quem possuía uma vela acesa era classificado como sun, devido à relação do sol com o dia e consequentemente com a luz, e quem a possuía apagada, moon, devido a relação da lua com a noite e consequentemente com a escuridão. Mas o estado da vela não era o único que diferenciava os dois grupos: os sun eram os verdadeiros "amigos", que interagiam e comportavam-se como verdadeiras crianças, sempre felizes e talvez um pouco egoístas e agitados.
Já os moon não tinham nenhuma característica dessas.
Responsáveis por causar-me medo e sensações horríveis, sempre estavam nas sombras, pareciam vigiar-me mas nunca falavam nada. Possuíam uma altura suficiente para ser considerada bizarra e um corpo verdadeiramente esquelético. A vela apagada que seguravam em suas mãos ossudas dificultava a visão clara e completa de seus rostos, sorte a minha.
Enquanto os sun tinham face e porte infantil, os moon possuíam algo em seu rosto que não era uma face, nem poderia ser. Mesmo não o vendo 100% bem, sabia que nunca agradável aos olhos e verdadeiramente apavorante, o que era pra ser um rosto tomava forma desfigurada com poucos aspectos padrões de rosto. Narizes convencionais, pelos faciais, lábios e orelhas não eram presentes nessa classe.
Mesmo encaixando-se nessas características, nunca eram iguais. Mas havia sempre um moon que via com frequência, na verdade, que via sempre. Me acompanhando, me vigiando e me perseguindo, era Mr. Boogie.
Diferente dos outros, Mr. Boogie possuía uma certeza "interação" comigo, se assim podemos dizer. Quando o via em curtos flashes borrados, ele saia das sombras, fazendo os sun desaparecerem. Imediatamente começava a chover, o céu que era tomado pela escuridão e pelo vento, trovejava furiosamente. Ele aparecia em vários lugares, tudo era como um efeito de uma droga alucinante, mas em preto e branco. De maneira desconhecida, a chuva que me atingia não me molhava, entretanto a sentia escorrer em minha pele, era real. Meu camafeu atingia uma temperatura altíssima e queimava minha pele, aquilo ardia e eu só podia esperar aquilo passar, não tinha nada a se fazer.
Mr. Boogie começava a rir ao ver o meu desespero, repentindo frases com sua voz rouca que só agora entendo o significado:
"Você vai ficar sozinha", "você só tem a mim", "eu vou te acompanhar para sempre", "isso nunca vai parar", "eu sou sua sombra".
Eram como sussurros em minha mente, em meu ouvido e em outras horas eram como gritos de gozação misturados a gargalhadas malditas. Tudo isso só parava quando ele retornava as sombras, abria um sorriso amarelo e desaparecia em meio à escuridão. A partir desse momento tudo voltava ao normal, o sol rompia as nuvens formadas e iluminava a escuridão, o vento cessava e os sun apareciam.
Nas primeiras vezes corria a minha mãe contando o ocorrido e mostrando a marca de queimadura em meu colo feita pelo camafeu, que mais tarde geraria uma cicatriz, mas ao perceber como passava a agir de modo estranho, parei de recorrer a ela.
Com essas lembranças pulsando em minha mente acordei e sentei-me subitamente... Coloquei as mãos na cabeça e depois no camafeu ardente.
Dizem que os primeiros 4 segundos depois que acordas são os melhores da sua vida devido à ausência de memórias, mas, após os 4 segundos suas memórias voltam. E seu pesadelo continua.
Assim foi comigo, passados alguns segundos olhei ao redor e recordei-me dos acontecidos. Meu pai.
VOCÊ ESTÁ LENDO
Lúcifer - Marcados pelo Sangue
ParanormalAos olhares alheios, Lúcifer era uma garota normal, talvez um pouco mais pálida que as garotas de sua idade ou até dona de uma aparência estranha, que mais gosto de categorizar como exótica. Vinda de uma família não exatamente exemplar, receb...