Capitulo 3- Mr. Boogie

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Sempre tive amigos imaginários na minha infância, pelo menos foi assim que os descreveram para mim.

       Aos meus olhos e sentidos, sempre foram muito reais, mais reais até que os amigos que eu tinha, na verdade, que os amigos que eu não tinha.

        Sempre estavam ali, brincando comigo, a criança estranha demais para ser merecedora da amizade.

          Com "eles" as coisas estavam ocorrendo bem em uma hora, e na outra, nem tanto.

          Eles, as pessoas que me acompanhavam e só eram visíveis aos meus olhos, tinham uma característica em comum: seguravam uma vela. Mas suas velas não eram sempre iguais, e a maneira em que ela se encontrava dizia muito sobre a pessoa que a segurava, bem, "pessoa".

         Classificava-os em dois grupos: sun e moon, os nomes vindos da minha falta de imaginação já pode ter deixado claro a razão da distinção entre eles. Quem possuía uma vela acesa era classificado como sun, devido à relação do sol com o dia e consequentemente com a luz, e quem a possuía apagada, moon, devido a relação da lua com a noite e consequentemente com a escuridão. Mas o estado da vela não era o único que diferenciava os dois grupos: os sun eram os verdadeiros "amigos", que interagiam e comportavam-se como verdadeiras crianças, sempre felizes e talvez um pouco egoístas e agitados.

Já os moon não tinham nenhuma característica dessas.

        Responsáveis por causar-me medo e sensações horríveis, sempre estavam nas sombras, pareciam vigiar-me mas nunca falavam nada. Possuíam uma altura suficiente para ser considerada bizarra e um corpo verdadeiramente esquelético. A vela apagada que seguravam em suas mãos ossudas dificultava a visão clara e completa de seus rostos, sorte a minha.

        Enquanto os sun tinham face e porte infantil, os moon possuíam algo em seu rosto que não era uma face, nem poderia ser. Mesmo não o vendo 100% bem, sabia que nunca agradável aos olhos e verdadeiramente apavorante, o que era pra ser um rosto tomava forma desfigurada com poucos aspectos padrões de rosto. Narizes convencionais, pelos faciais, lábios e orelhas não eram presentes nessa classe.

        Mesmo encaixando-se nessas características, nunca eram iguais. Mas havia sempre um moon que via com frequência, na verdade, que via sempre. Me acompanhando, me vigiando e me perseguindo, era Mr. Boogie.

          Diferente dos outros, Mr. Boogie possuía uma certeza "interação" comigo, se assim podemos dizer. Quando o via em curtos flashes borrados, ele saia das sombras, fazendo os sun desaparecerem. Imediatamente começava a chover, o céu que era tomado pela escuridão e pelo vento, trovejava furiosamente. Ele aparecia em vários lugares, tudo era como um efeito de uma droga alucinante, mas em preto e branco. De maneira desconhecida, a chuva que me atingia não me molhava, entretanto a sentia escorrer em minha pele, era real. Meu camafeu atingia uma temperatura altíssima e queimava minha pele, aquilo ardia e eu só podia esperar aquilo passar, não tinha nada a se fazer.

         Mr. Boogie começava a rir ao ver o meu desespero, repentindo frases com sua voz rouca que só agora entendo o significado:

"Você vai ficar sozinha", "você só tem a mim", "eu vou te acompanhar para sempre", "isso nunca vai parar", "eu sou sua sombra".

Eram como sussurros em minha mente, em meu ouvido e em outras horas eram como gritos de gozação misturados a gargalhadas malditas. Tudo isso só parava quando ele retornava as sombras, abria um sorriso amarelo e desaparecia em meio à escuridão. A partir desse momento tudo voltava ao normal, o sol rompia as nuvens formadas e iluminava a escuridão, o vento cessava e os sun apareciam.

          Nas primeiras vezes corria a minha mãe contando o ocorrido e mostrando a marca de queimadura em meu colo feita pelo camafeu, que mais tarde geraria uma cicatriz, mas ao perceber como passava a agir de modo estranho, parei de recorrer a ela.

       Com essas lembranças pulsando em minha mente acordei e sentei-me subitamente... Coloquei as mãos na cabeça e depois no camafeu ardente.

Dizem que os primeiros 4 segundos depois que acordas são os melhores da sua vida devido à ausência de memórias, mas, após os 4 segundos suas memórias voltam. E seu pesadelo continua.

Assim foi comigo, passados alguns segundos olhei ao redor e recordei-me dos acontecidos. Meu pai.

Lúcifer - Marcados pelo Sangue Onde histórias criam vida. Descubra agora