Capítulo 3

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"Vim pra lhe encontrar, dizer que sinto muito

Você não sabe o quão amável você é

Tenho que lhe achar, dizer que preciso de você

E te dizer que eu escolhi você

Conte-me seus segredos, faça-me suas perguntas

Oh, vamos voltar pro começo

Correndo em círculos, perseguindo a cauda

Cabeças numa ciência à parte"

The Science-coldplay

-Deverá continuar os tratamentos, também te encaminharei para um grupo de apoio para pessoas que perderam a memória. Os remédios precisam ser nos horários exatos.-diz o médico assinando meus papéis para eu receber alta.

-E se...e se minhas memórias não voltarem? Qual é a real chance de minha vida voltar a ser o que era antes?.

-Serei sincero com você Adam, sua situação não é uma das melhores. Faz um mês que você acordou e ainda não se lembrou de sua esposa, mas não se preocupe com isso, faça novas memórias, nada precisa ser como era antes senhor Clarck. Essa é uma das vantagens da amnésia, reinveste-se.

-Eu não posso me reinventar se não souber como eu era antes disso tudo acontecer,eu...eu me sinto perdido.

-Tenho certeza que você encontrará uma maneira de se realocar. Não são muitos os casos em que eu vejo uma pertinência em quadro amnésico, mas no seu em especial,eu nunca vi um parente que se empenhasse tanto no bem estar de um paciente meu como sua esposa se empenha, tenho certeza que ela irá te ajudar. E falando nela, ela deve estar esperando você. Até mês que vem Adam.

-até mês que vem,muito obrigado por tudo doutor.

-Esse é só o meu trabalho Adam, agora vá. Sua nova vida te espera.
Saio de sua sala em direção aos corredores que levam á entrada do hospital. É estranho ir embora porque tudo o que eu lembro está aqui. Aprendi os caminhos entre as salas de ressonância e fisioterapia, conheci outros médicos e enfermeiras. E agora preciso partir para um lugar desconhecido no qual não tenho certeza se um dia poderei o chamar de lar novamente .
Anne me espera com umas sacolas na mão, ela está tão concentrada em algum livro que não nota minha presença.
-Você parece nervosa.-digo ao me sentar ao lado dela.
Ela se assusta, mas logo recupera-se e fecha o livro.

-Impressão sua querido, e você não está nervoso?-diz se levantando.

-Sim...-sussurro como uma criança assustada.

-Nós vamos conseguir Adam, tenha fé. Um dia iremos rir disso tudo. Ela diz tentando me passar confiança.
***
Sinto um frio em minha barriga assim que Anne estaciona o carro na garagem. Não tenho coragem de sair do carro, tenho medo de lembrar de outras coisas ruins, como na primeira vez em que me olhei no espelho depois que acordei. É estranho essa sensação, e me sinto tão contraditório que tenho vontade de me bater,eu quero lembrar da minha vida, mas tenho medo de perceber o quanto eu era infeliz nela, na verdade, nessa conclusão eu já cheguei,eu era infeliz antes do acidente, não contei para minha esposa sobre o flash que tive, sinto que ela sente medo de estar perto de mim,se retrai, gagueja quando eu não entendo o que ela fala e peço para ela repetir, mas o que mais me machuca é lembrar das noites no hospital em que acordei no meio da noite com o choro dela.
"Estou chorando de felicidade meu bem",mas não consigo acreditar no que ela diz.

-Vamos?, a casa é muito maior que a garagem senhor Clarck-diz Anne saindo do carro.

-só um minuto, preciso de mais minuto, dois talvez.

-tudo bem então,eu...vou deixar a porta aberta, quando você se sentir a vontade, pode entrar, se quiser.

-claro,eu só preciso digerir tantas informações- digo e ela levanta uma de suas sombrancelhas,uma mania na qual percebi que ela faz com frequência.

-É, sabe né,a cor da casa tão cinza e sem nenhum jardim, talvez eu precise de um tempo—digo tentando fazer as palavras soarem em um tom divertido.

-você que escolheu a decoração da casa querido-diz me deixando sozinho.
***
Depois de muitos minutos, resolvo entrar na casa.
Assim que fecho a porta da sala, passo a fazer minha expedição pelo meu lar. Tudo está em completo silêncio, as coisas são minuciosamente perfeitas e organizadas, como se nunca tivessem sido usadas de fato, na estante da sala há apenas dois quadros de foto, uma do meu casamento e a outra no parque de diversões, nessas fotos eu parecia tão feliz, aliás eu e Anne parecíamos muito felizes. Coloco as fotos no lugar, mas mudo a posição para me sentir mais a vontade com alguma coisa fora de ângulos exatos. Continuo seguindo para dentro da casa, e chego na cozinha, que por sinal é muito moderna e com tons sérios, mais parece um lugar profissional do que uma casa aconchegante, aqui não existe nenhuma foto ou detalhe que me faça lembrar de minha personalidade. Não me surpreendo ao perceber que todo o resto da casa é dessa forma, lembro-me do que Anne disse "você que escolheu querido", isso tudo faz parte de quem eu sou, mas eu não consigo me sentir a vontade com nada que encontrei até agora. Subo as escadas, que dão acesso ao segundo andar da casa, à procura do anjo.
_ANNE_grito tentando acertar a porta de nosso quarto.

_Segunda porta da direita_
Assim que entro, sinto um alívio ao perceber que esse é o lugar mais aconchegante da casa. Ao contrário do resto, esse tem a cor vermelha e é muito mais receptivo.Anne sai do banheiro enrolada em uma toalha, que assim que nossos olhos se encontram, vejo seu rosto ganha mais cor. Ficamos nos encarando por um tempo, até eu perceber que estava invadindo o espaço dela, assim que chego a essa conclusão, saio do quarto e sigo em direção a sala.
Fico sentado no sofá com os olhos fechados por muito tempo, até sentir suas mãozinhas envolvendo minha cintura.
_Demorei?

_Nenhum pouco_digo enquanto sinto o cheiro de seus cabelos recém lavados.

_O que vamos fazer agora?_ela me pergunta com o olhar refletindo incertezas

_De agora em diante ou nesse exato momento?

_Os dois, mas o agora desse momento

_Nesse momento eu acho que seria bom comermos alguma coisa que não seja sopa do hospital, e bem,de agora em diante, talvez você possa me ajudar a lembrar o que eu fazia e como vivíamos.
Sinto seu corpo ficando tenso.

_hum..que tal ligarmos para alguma pizzaria e pedirmos o seu sabor preferido?!.

_Antes de saber o meu sabor favorito, preciso saber quem escolheu a decoração do nosso quarto.

_Nos quartos as escolhas foram minhas, esse tinha sido nosso acordo, você cuidava do primeiro andar, e eu do segundo.

_Bem,sabendo disso,eu prefiro que você escolha seu sabor preferido para a pizza.

_por que?_me pergunta rindo

_Alguma coisa me diz que seus gostos são bem melhores que os meus.

FAÇA-ME LEMBRAROnde histórias criam vida. Descubra agora