Já fazia três meses.
Por mais ou menos um mês, a vida de Jack Kingsley virou um caos. Como se seu corpo se movesse sozinho como um robô, sem que sua cabeça conseguisse processar tudo que estava acontecendo, foi agindo e se ocupando das coisas práticas: arranjou o funeral, recebeu a sobrinha na sua casa imediatamente cuidando dos papeis para adquirir sua guarda legal, tratou de que ela começasse o quanto antes um acompanhamento psicológico como lhe fora recomendado, colocou a empresa em segundo plano para lidar com os destroços daquela tragédia até que não estivesse mais soterrado, até que tudo estivesse mais ou menos limpo e que ele pudesse ver a luz do sol e respirar. Bem, o cenário podia estar mais limpo, mas a verdade é que ainda estava tudo destroçado. A reconstrução levaria tempo. Às vezes, secretamente, ele se perguntava se algum dia tudo realmente voltaria ao seu lugar certo.
Jack não era do tipo emocional, mas a verdade que ele tentava esconder principalmente de si mesmo todos os dias é que nunca tinha sentido tanta dor. Seu irmão mais velho era a pessoa mais importante na sua vida. Apesar de sua arrogância e excesso de autoconfiança, Jack sempre admirara Karl e os dois eram os melhores amigos. Faziam tudo juntos, desde crianças. Onde quer que fossem se destacavam, eram as almas da festa. Karl com seu bom humor, sua vivacidade, sua inteligência; ele tinha o dom de fazer qualquer assunto parecer interessante e qualquer mentira parecer convincente, levava todo mundo na lábia e conseguia, assim, tudo que queria. E era tão divertido que ninguém conseguia ficar com raiva dele, fosse o que ele aprontasse. Assim que o pai dos dois tinha morrido, não muito tempo atrás, Karl assumiu a enorme empresa de publicidade que ele havia fundado e feito crescer internacionalmente. E o fez com excelência. Como era de se esperar, Jack logo se juntou a ele e os dois, além de muito bem-sucedidos, se divertiam juntos no trabalho. Eles jorravam ideias sem parar quando se juntavam e jamais brigavam, mesmo que discordassem firmemente um do outro. Formavam a equipe perfeita. Foram padrinhos de casamento um do outro. Encobriram as travessuras um do outro lealmente tanto quando crianças quanto como adolescentes.
Karl era o único que sabia do grande segredo de Jack.
Até que aconteceu o acidente com o caminhão na pista. E então não havia mais Karl. Ele se fora junto com a amada e também inteligente e criativa esposa Alison, que escrevia romances históricos bastante aclamados dos quais o marido era fã número um. Eles morreram instantaneamente, foi o que disseram. Pelo menos não sentiram dor. Pelo menos não estavam com Susie naquela noite. Jack repetia tudo isso para si mesmo. Pelo menos... Pelo menos...
Karl morrera com apenas trinta e sete anos. Alison, com trinta e cinco. Tinham tantos planos. Tinham uma filhinha de quatro anos. Alison estava no meio de mais um livro. Karl prometera a Jack que tirariam um fim de semana apenas para relaxar, os dois juntos, assistindo jogo de rúgbi na TV e bebendo cerveja, como não faziam havia muito. Karl era a única família que restava a Jack.
Mas pelo menos... Pelo menos...
Pelo menos tinham vivido, até então, uma vida maravilhosa. Não podiam reclamar nem se arrepender de nada. A vida é assim mesmo, não é? Acaba de uma hora para a outra. A única certeza de que temos na vida é a morte. A vida segue... Pelo menos você ainda está vivo e tem tanta coisa pela frente...
- Você devia fazer terapia também - Mia havia sugerido a Jack quando ele viera com o assunto sobre um psicólogo para a sobrinha.
Mas Jack ficou com raiva da esposa. Ele não queria terapia. Ele estava bem. Não estava na mesma situação que a sobrinha que era uma criança vulnerável. Era um homem feito e sabia lidar com a morte. Tinha perdido a mãe quando ainda criança. Tinha perdido o pai. Ele não precisava de terapia.
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Jardim de Infância [Degustação]
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