capítulo 2

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          Quem imaginar que os dois namorados iriam conformar-se com as ordens recebidas, ou ficar apenas se lamentando, é por que conhece muito pouco de amores em geral, especialmente de amores contrariados...
          Ao sair do palácio, Hérmia e Lisandro marcaram um encontro para a tarde daquele mesmo dia, numa praça próxima a casa de Egeu. É verdade que, de início, a jovem estava abaladíssima. Tanto assim, que o rapaz ficou preocupado:
          - Que é isso, meu amor? Por que está tão pálida? Como foi que murcharam tão de repente aquelas lindas rosinhas que vivem em seu rosto ?
          - Talvez tenham morrido por falta de chuva... Mas eu poderia inundá-las com a tempestade de meus olhos...
          Lisandro tentava consolar a moça e, ao mesmo tempo, lamentava-se:
          - É mesmo assim... -explicou ele-. O verdadeiro amor sempre encontra uma porção de dificuldades pelo caminho. Às vezes esbarra em diferenças de cultura, idade, ou então fica a depender de amigos... Outras vezes sofre o efeito de alguma tragédia, como a guerra, a doença, ou a morte, que interrompe bruscamente a felicidade... Já li e ouvi falar de muitos casos assim...
          Diante disso, a triste Hérmia foi se conformando com a ideia de suportar o cruel destino que parecia acompanhar o amor... Mas Lisandro tinha outros planos e não se deixaria abater por aqueles obstáculos:
          - Escute, Hérmia, eu tenho uma tia, viúva, rica, sem filhos, que gosta de mim como se eu fosse seu único filho. Tenho certeza que faria tudo pra me ajudar. Ela mora a umas sete léguas de Atenas, e as leis daqui já não tem mais valor nesse lugar. Podemos nos casar lá. Se você me ama mesmo, fuja amanhã à noite dá casa de seu pai e vá se encontrar comigo naquele bosque, aqui perto de Atenas.
          - Onde ?
          - No mesmo lugar onde encontrei você uma vez com Helena, lembra-se? Vocês estavam naquela Festa de Maio, comemorando a primavera... Estarei lá esperando por você, minha querida!
          Hérmia animou-se:
          - Ho. Lisandro, meu amor, eu irei sem falta! Juro por tudo que é mais sagrado, por tudo que une as almas e ajuda os amores... Encontrarei você amanhã naquele bosque!
          Quando estavam acabando de combinar tudo, aproximou-se Helena, uma moça tão bonita quanto Hérmia, embora de traços muito diferentes: Hérmia era baixa e morena. Helena, sua melhor amiga, era alta e loira. Mas a expressão de sei olhar era ainda mais triste do que a de Hérmia, mesmo antes de esta se iluminar de esperança com a ideia de fugir para casar-se com Lisandro.
          - Bom dia, Helena! Você está sempre bonita! -disse Hérmia.

          - Bonita? -respondeu a moça, tristonha. - Bonita é você, que é amada por Demétrio... Ele sempre diz que seus olhos brilham como estrelas e que o doce sim de sua voz tem mais música do que o canto da cotovia... Ah, pena que só as doenças sejam contagiosas... Se a beleza também o fosse, Hérmia querida, você me passaria sua graça... E então o mundo seria meu! Por favor, ensine-me o segredo para chegar ao coração de Demétrio...
          Hérmia foi sincera:
          - Honestamente, não sei. Faço cara feia e, mesmo assim, ele diz que me ama.
          - Ah, se essa cara feia pudesse ensinar seus truques ao meu sorriso...
          - Eu o insulto e ele continua dizendo que me ama - prosseguiu Hérmia.
          - Ah, se minhas súplicas o comovessem assim... - tornou a falar Helena.
          E seguiram conversando. Hérmia queixava-se do assédio de Demétrio é Helena suspirava, lamentando-se por ele não lhe dar a menor atenciosamente a, tenção.
          Com pena da jovem, Hérmia e Lisandro acabaram por expor-lhe seus planos de fuga, com detalhes. confiavam em Helena e acharam que, talvez, se soubesse o que pretendiam fazer, ela poderia ficar mais contente e esperançosa, na certeza de que sua rival no coração de Demétrio iria deixar o caminho livre...
          Depois de contarem seu segredo, os dois namorados despediram-se e saíram, indo cada um para sua casa. Em nome dá prudência, não era conveniente que fossem visto juntos, pois isso poderia atrapalhar seus planos. Helena ficou sozinha, pensando.
          Quem muito ama e se sente inteiramente só e desprezada, é capaz de fazer qualquer coisa, por mais estranha que seja, para atrair a atenção do amado. Foi o que conheceu com Helena. Já que Demétrio nem queria olhar para ela, a pobre imaginou o seguinte: se lhe fizesse um favor, ele ficaria grato, sorriria e, em troca, talvez até se tornasse seu amigo...
          A oportunidade estava aí. Era só contar a Demétrio que sua noiva ia fugir para casar-se com outro. É verdade que Helena precisaria quebrar uma promessa: ela havia dito a Lisandro e Hérmia que guardaria seu segredo. Mas, seu coração doía muito e lhe afirmava que, em assuntos de amor, os juramentos e promessas não têm grande valor... Afinal de contas, Demétrio não lhe tinha jurado amor eterno, antes de conhecer Hérmia?
          E foi assim que, justamente Helena, a melhor amiga de Hérmia e principal interessada em que Demétrio ficasse sozinho, acabou por contar a ele os planos de fuga de Lisandro e sua amada.

Sonho de uma noite de verão (escrevendo)Onde histórias criam vida. Descubra agora