Capítulo 7

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          Meu corpo ainda se mantinha na mesma posição de antes: deitado de costas na cama ao lado da Blanco, com o lençol branco me cobrindo até à cintura. Eu tentava controlar minha respiração que estava ofegante até agora e ainda não tinha olhado para ela. Imaginei que não estivesse muito diferente de mim: cansada. Meu braço estava pousado em meu abdomen suado e quando o larguei ao lado do meu corpo, minha mão roçou com a de Mia. Virei o rosto para olhá-la e pude vê-la sorrindo enquanto olhava o teto. Isso me fez sorrir também. Acho que nunca me esqueceria do estado em que a deixei: suada, cansada e sorrindo. O que estava dando em mim? Eu também não sei. Ela sabia que eu a olhava e talvez por isso, o sorriso desapareceu de seu rosto.
    - Porque parou de sorrir? Eu… eu machuquei você? Tem algo errado? - Perguntei desesperado. Sim Tobias. VOCÊ está errado idiota. A minha reação foi a mais estúpida do mundo, mas eu estava realmente preocupado.
    - Está tudo bem. Não tem nada errado. Eu… só… - Vi-a dar um sorriso forçado.
    - Diz. - Encorajei virando de lado para ficar de frente pra ela. Ela virou também, ficando de frente para mim e seus olhos inocentes me encararam. Aproximei-me dela e deixei nossos rostos bem pertinho. Mia levou uma mão até meu rosto e fez carinho em minha bochecha. Fechei os olhos gostando do carinho.
    - Você quer que eu vá embora? Abri meus olhos rapidamente para encará-la. Quando ela me perguntou isso, eu fiz a mesma pergunta a mim mesmo. Eu queria que ela ficasse ali comigo? Ou queria que ela fosse embora? Eu não sabia! Antes de tudo isso começar eu tinha tudo sob controle. Eu sabia o que queria e o que fazer! E agora não sei nada! Eu me sentia satisfeito perto dela. E não é só satisfação carnal que eu estou falando. Ela me dava paz. Dava-me o que eu não tinha a anos desde que meu pai morreu. Eu queria aproveitar essa paz. Pela primeira vez, eu não queria deixar a garota. Eu não queria que a garota fosse embora. Eu não queria que MIA de deixasse. Ela fazia carinho em meu rosto, orelha e cabelo. Acariciava minha pele bem devagar. Contornando os traços do rosto, sentindo a irritação da pele pela barba que já começava a crescer de novo. Nunca nenhuma garota fez carinho assim em mim. Nem antes do sexo, nem durante e muito menos depois. Talvez a culpa fosse minha. Eu não dava oportunidade para que isso pudesse acontecer. Sempre é: preliminares (nem sempre), transar e só. Nunca fiquei na cama delas depois do sexo para saber como seria. Eu gostava do carinho que Mia me dava. Fazia-me sentir bem. Fazia-me sentir que sou importante para alguém. Talvez a ponto de esse alguém me amar. Fazia-me sentir como se eu valesse realmente a pena. Com ela eu sentia tudo aquilo que eu não sou e tudo aquilo que eu sei que nunca iría ser assim que os primeiros raios de sol do dia aparecessem. Nós tinhamos um acordo. Eu cumpri minha parte. Agora é por nossa própria conta. Cada um por si. Eu deveria ficar feliz por isso. Como já tinha feito minha parte, agora podia despachá-la. A parte racional de mim dizia que eu tinha que mandá-la embora neste preciso momento e acabar com isso de uma vez por todas. Já a outra parte -desconhecida- de mim queria que ela ficasse. Nem que fosse só até o sol nascer. Eu queria que ela ficasse comigo e me fizesse sentir como estava fazendo agora. Eu estava confuso e ao mesmo tempo estava me sentindo impotente por tudo estar fugindo das minhas mãos. Fugindo do controle. Eu tinha que saber o que fazer. Tinha que saber o que queria. Ela queria uma resposta, e eu queria a ela.
    - Eu… - Ela me cortou.
    - Tudo bem. Eu… eu já entendi. - Disse precipitadamente e ao mesmo tempo hesitante. Vi-a olhar em meus lábios e se aproximar devagar para beijá-los. Sua mão segurava meu rosto quando senti seus lábios ternamente nos meus. Eu gostei daquele simples beijo. Era carinhoso e inocente, e isso a identificava perfeitamente. Totalmente o contrário de mim. Ela se afastou e eu abri meus olhos para olhá-la. Aqueles olhos brilhavam tanto como antes, mas havia algo a mais neles. Algo que não era bom.
    - Obrigada. - Sussurrou tirando sua mão de meu rosto e a encolhendo para si.
    - Eu prometo que ninguém vai saber disso, como você queria. Eu vou continuar sendo a nerd de sempre e nada vai mudar. - Foi aí que eu percebi que ela estava se despedindo. Quando ela disse aquilo, eu lembrei tudo o que eu tinha antes de esse acordo começar. Popularidade, dinheiro e boa fama de pegador. Apesar de ter tudo isso, eu sabia que só tinha Urih de verdade. Só ele era real em toda a minha vida nos últimos anos.
    - Só tem mais uma coisa que eu quero dizer pra você. - Anunciou interrompendo minha linha de pensamentos. Eu não sabia o que ela iria dizer. Não esperava que fossem aquelas três palavrinhas. Mas sinceramente, eu gostaria de ouvi-las pelo menos uma vez, e de forma sincera. Eu não sei o que iria responder se ela as dissesse. Não sou bom o suficiente para Mia e talvez fosse melhor assim.
    - Eu não sei se estou certa sobre isso… - Disse enquanto dava um sorriso de canto.
    - Mas aqui e agora você parece ser bem diferente do que você fez parecer ser todos esses anos. Provavelmente eu não estou certa, mas eu acho que você não é quem aparenta ser. - Explicou meio receosa. Mal ela sabia que tinha razão. Mal ela sabia que eu vivia numa mentira. Mal ela sabia que era tudo uma máscara. Ela estava receosa ao falar isso e eu sei o porquê. Se fosse antes, eu teria gritado com ela dizendo que ela não passava de uma nerd horrorosa que não tinha nada haver com a minha vida. Levei minha mão até sua nuca e comecei a afagar seus cabelos.
    - Quem você acha que eu sou? - Perguntei. Sua opinião me interessava. Droga! Interessava-me e muito. Não devia ser assim. Nunca foi assim.
    - Eu… eu acho que o Tobias que conhecemos não é apenas ‘isso’. Acho que você tem muito mais a mostrar ás pessoas. Coisas boas. Acho que você é uma pessoa especial que precisa ser amada. Você merece ser amado por alguém verdadeiro. Alguém que saiba cuidar de você de maneira certa. Merece ter uma vida ótima. - Pude vê-la corar envergonhada ao acabar de dizer isso.
    - Você merece ter alguém do seu lado que possa dizer ‘Eu te amo’, sem que isso seja uma mentira. Era incrível como ela conseguia me fazer sentir bem. Apesar de ela dizer todas aquelas coisas sobre mim, nenhuma delas era verdade. Eu não sou especial. Sou uma mentira. Respirei fundo e tirei minha mão de seu cabelo um pouco chateado com a lembrança. Eu não gostava de lembrar no que a minha vida se tornou depois da morte do meu pai. Sentei-me na cama com as costas apoiadas nas almofadas brancas e grandes e passei a olhar algum ponto fixo no quarto. Minha cara não devia ser das melhores a esta altura e Yasmin percebeu isso.
    - Só para esclarecer antes de ir: você não me machucou. Foi perfeito. Obrigado, mais uma vez. - Disse suspirando.
    - E me desculpa se falei de mais. Eu sempre falo quando não devo. Eu… - Ela se auto interrompeu e esticou-se um pouco para chegar até meu rosto. Ela deu um beijo demorado na minha bochecha e logo se afastou.Olhei pra ela e vi-a se sentar na beirada da cama com o lençol branco tapando até os seios. Ela estava de costas pra mim e pude ver seu tronco se mover quando ela respirou fundo. Seu cabelo preto caia por suas costas nuas. Eu estava olhando feito um idiota enquanto ela se preparava para ir embora. Eu não queria que ela fosse. E que se foda o resto! Quando Mia ia soltar o lençol para sair da cama, levei um dos meus braços até sua cintura, impedindo-a de sair.
    - O que você esta fazendo? - Perguntou confusa. Não respondi. Puxei-a para mim e fiz ela deitar de costas em meu peito com a cabeça apoiada em meu ombro. Uma de minhas mãos pousou sobre sua barriga lisa de uma maneira protetora, fazendo carinho.
    - Fica. - Sussurrei em seu ouvido enquanto beijava seu ombro nu e com uma mão, desviava os cabelos de seu pescoço.
    - Até ao sol nascer? - Perguntou. Sentia-a colocar a sua mão sobre a minha como sempre, fazendo carinho.
    - Até o sol nascer. Eu… eu quero você aqui comigo. - Disse um tanto… tímido? Ela apenas assentiu e se acomodou melhor em meu peito. Eu sei. Devo estar completamente louco. Urih não sabe tudo da minha vida, e eu decido contar logo pra Blanco? Estranho? Muito! Eu já devia estar completamente louco, mas eu confiava nela. Essa noite estava sendo mais do que aquilo que eu esperava. Estava sendo estranha e boa, mas, sobretudo, inédita! Respirei fundo e finalmente falei.
    - Eu não sou especial como você diz. Tudo o que você disse é mentira. Eu sou um monstro zuador de nerds na verdade. Exceto isso, não sou o que os outros conhecem. - Desabafei.
    - Como assim? Você é especial sim. Eu sei que é. - Disse confusa enquanto virava o rosto para me olhar.
    - Você não entende. Você não sabe. Ninguém sabe. - Suspirei frustrado. Ela me olhava confusa. Sorri de canto e dei um beijo nela como forma de ganhar ‘coragem’. Logo eu já estava contando tudo.
    - Eu tinha 11 anos quando descobri. Meu pai tinha viajado para Londres por causa da empresa que ele tinha lá e eu tinha ido dormir na casa do Urih. Minha mãe tinha saído com suas amigas para o shopping nessa tarde e por isso nem pude avisá-la de que ia dormir na casa dele. Tive que deixar o recado com a babá. - Disse olhando o vazio do quarto enquanto fazia cafuné no cabelo e acariciava a barriga de Mia.
    - No dia seguinte eu iria voltar de tarde, mas Urih teria que sair com seus pais, e por isso eu tive que voltar pra casa de manhã cedo. Quando cheguei a casa, encontrei minha mãe na cozinha tomando o café da manhã com um… com… - Ótimo, agora eu bloqueei? Bota pra fora Tobias! Já começou tem que acabar!
    - Hey, se não quiser continuar tudo bem. Não precisa. - Disse ela compreensiva e sorrindo pra mim. Eu queria continuar. Respirei um fundo.
    - Encontrei minha mãe com um homem que não era meu pai. - Disse olhando ela nos olhos. Pude ver a surpresa em seu rosto.
    - Esse foi o primeiro de muitos. Eu lembro-me bem.

Quebrando RegrasOnde histórias criam vida. Descubra agora