CAPÍTULO QUATRO

1.4K 223 50
                                    

O clima entre o Pedro e eu estava mudado. As conversas idiotas na frente da TV que costumavam ser nosso principal contato social já não aconteciam. Nossos horários se desencontravam, eu saía muito cedo e ele chegava muito tarde. Como estava sem notebook passei a emendar meus horários. As manhãs confortáveis no balcão da cozinha foram substituídas pelo computador da biblioteca.

Durante aquela semana perdi meus almoços para seguir um bom ritmo de estudo. Era o último mês daquele semestre e me vi envolvido numa exposição da turma que deveria ter sido organizada há semanas. Apesar do carga de trabalho extra, foi ótimo ocupar a mente, colocar o cérebro para trabalhar, concentrar atenção em alguma coisa produtiva. Me joguei de cabeça nesse projeto, assumi muitas responsabilidades sobre ele. Eu estava fugindo de mim mesmo. Tive uma boa desculpa para não encontrar o Guto, que tinha me mandado muitas mensagens preocupadas depois que eu desapareci da boate no domingo.

Assim acabou uma semana e começou outra. Correria, trabalhos, projeto, cansaço. Só parava no apartamento para dormir, nunca encontrava o Pedro a noite, ele chegava bem mais tarde.

Mas na terça-feira foi diferente. Ele estava assistindo TV quando eu cheguei, espalhado no sofá, só de cueca, como era seu costume. Passava um pouco das nove da noite, estava passando um seriado policial desses bem previsíveis.

— Ei cara. Eu quero falar contigo.

Ele anunciou assim que me viu entrando, sentou direito no sofá e baixou o volume da TV.

Eu estava exausto.

— Oi, eu tô morto. Vou tomar banho, comer alguma coisa e depois a gente vê.

Falei com calma, sem ser ríspido nem nada. Mas para meu total espanto, Pedro me puxou pelo braço, me derrubou no sofá.

— Porra nenhuma! A gente vai conversar é agora — falou cheio de autoridade.

— Tá doido cara? Já disse que tô...

— Tá fugindo de mim a semana toda, faltei na autoescola só para falar contigo e é isso que eu vou fazer.

Me sentei direito no sofá, me afastando mais dele. Olhei para ele e vi sua expressão carrancuda que costumava afugentar as pessoas, tive certeza que ele não ia deixar a chance passar. Fiz sinal com as mãos para que falasse logo, como se eu estivesse com pressa.

— Eu não tô muito certo disso, por isso eu quero te perguntar logo para saber. Eu fiz alguma coisa errada naquele sábado que eu cheguei bêbado aqui?

Ergui as sobrancelhas, Pedro estava sério, muito mais que o habitual.

— Não lembra? — escapou da minha boca.

Ele coçou, estava sem jeito, mas continuou sério.

— Não, por isso que perguntei, mas só pela tua cara nesses dias aí ei já vi que fiz besteira. Mas eu quero saber o que foi direitinho sabe, quero que me diga tudo. Vai cara, fala aí!

Pedro gostava de tudo muito claro, preto no branco, era uma das suas características mais fortes.

— Não foi nada não Pedro, esquece isso.

— Não Joca! Eu fiz coisa errada e isso tá tirando meu sono brother, só vou ficar tranquilo quando souber tudo. Fala aí cara, por favor.

Pedro veio de uma família humilde que criou ele dentro do rigor da honestidade e conduta correta, eu não duvidava que realmente estivesse se remoendo por dentro sem saber o que fez de errado.

— Você, disse que queria se mudar daqui e que já tinha um lugar não sei aonde, não lembro direito. Mas que para sair eu tinha que te mandar embora. Hum... quebrou meu notebook, mas eu não tô nem aí, era velho mesmo... e vomitou na minha cama.

Amigos - Um Romance ClichêOnde histórias criam vida. Descubra agora