Mansão assombrosa

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  Andamos pelas ruas da cidade em sincronia, conversando bastante!

- Você vai gostar da escola. É chato estudar, mas agora você tem companhia.

- É o que espero. Hoje foi bem diferente de qualquer outro dia de aula.

- Que bom que já está gostando! Olha, pode ser que você demore à se enturmar com as meninas, é que você é aluna nova e a última vez que teve gente nova na nossa sala já faz dois anos.

- Eu entendo. Também sou muito tímida e diferente, deve ser normal elas estranharem.

Bem nessa hora chegamos ao bairro da minha casa. Estávamos na Avenida Central. Iríamos cruzar a Rua Europa e depois a rua da minha casa.

O bairro era repleto de casarões antigos, não tão grandes quanto a minha casa, mas tão velhos quanto.

- Sabia que essas ruas são assombradas?

- O que?- eu sabia dessa crença, mas foi engraçado.

- Almas penadas! Elas vagam por essas ruas, ao redor das casas.

- Isso tudo tem à ver com a história da cidade? A história não é bem assim. Todervauser era físico e biólogo, um grande cientista. O Brasil estava na era colonial e na Alemanha se falava muito nisso. Todervauser veio para cá com sua jovem esposa Alícia e sua sobrinha órfã, Frida. Depois de alguns meses morando aqui, Frida desapareceu, foi sequestrada por um dos moradores do vilarejo ao lado da mansão. Todervauser quis se defender, e os aldeões tomaram seus experimentos, começando uma guerra que durou cinqüenta anos e só acabou com a morte dele.

- Não. Havia um pequeno vilarejo aqui, desde a montanha até o riacho. Um dia Todervauser chegou e tomou uma grande área para si. Derrubou a casa de dois lenhadores e construiu sua mansão. Alguns meses depois, Frida, que tava ficando com um cara aí, que o tio dela não gostava, decidiu fugir. Aí, Todervauser, se achando, foi queimar o Vilarejo. Os moradores foram atrás das riquezas dele pra poder arrumar a destruição que ficou. Só depois que Todervauser morreu é que os conflitos acabou e aí a vila virou cidade.

- Sua história é confusa! Pra quê Albert iria queimar a vila e derrubar casas? Quando ele morreu os moradores da vila ainda queriam tomar a casa da filha dele e quando Frida foi sequestrada ele não queimou nada, mandou roubar as plantações da família do sujeito que pegou a Frida.

Antes que ele retrucasse, parei na frente de casa e Adriano ficou abobado.

- Vamos sair dessa calçada agora! O espírito do cientista doidão tá aí, doida!

Comecei a rir freneticamente.

- Eu moro aqui e esse lugar não tem nada de assombrado. Vê se não borra as calças!

Abri o portão e entrei, esperei Adriano tomar coragem e entrar também.

A mansão já foi reformada umas três vezes, mas sempre mantiveram os detalhes originais, como a cor, o jardim e as colunas de mármore. Apenas a piscina não vazia parte do plano original, foi ideia da minha mãe.

- Zoraide!

- Que?- ela surgiu de um corredor segurando um pano de prato.

- Meus pais estão?

- Dona Lígia foi trabalhar e só volta na parte da tarde, Seu Petrônio está no escritório e volta tarde hoje, tem audiência e reunião.

- Põe um prato pro meu amigo, estaremos na biblioteca.

- Gosta de sopa de cenoura e salmão?

Adriano balançou a cabeça em choque. Ele tomava cuidado até para pisar no chão e olhava para todos os lados à procura de algo suspeito.

A biblioteca era pequena, ficava bem no meio da casa, era uma caixa sem janelas, apenas com uma porta que dava no corredor e outra para o jardim, tinha uma lareira antiga e óbvio, ar-condicionado, ideia da minha mãe.

As estantes eram bem altas, chegavam a ter até quatro metros de altura, estavam repletas de livros que vinham desde a época de Albert até os livros de alto ajuda da minha mãe e os livros de advocacia do meu pai. O teto tinha um mosaico que cobria a sala toda, nele havia uma jovem de cabelos loiros e olhos negros.

- Olha para cima.- Ordenei e Adriano obedeceu- A moça do mosaico é  Amélie, irmã de Albert Todervauser, ela é a mãe da Frida. Ela era a irmã mais velha. Enquanto Albert estudava na França, ela foi obrigada a se casar com um nobre, só que ela tinha dezesseis anos, era jovem demais e muito nova. Quando engravidou seu marido a acusou de adultério, ele se dizia estéril, era velho, podia ser avô de Amélie. O pai de Albert e Amélie morreu de desgosto assim que soube. Amélie ficou sozinha, apanhou do marido até ser expulsa de casa, teve uma gravidez conturbada e acabou morrendo no parto, ela nunca amamentou a filha, apenas lhe deu um beijo na testa, um nome e um destino: Albert.

- Albert cuidou de Frida?

- Sim, ele a amava como se ela fosse sua filha. Ele sentia muita saudades de sua mãe e de sua irmã, então ele se consolava em Frida.

- Quem é o pai da Frida?

- Ninguém sabe. Nunca foi comprovado que Amélie traiu seu marido e ela nunca quis falar sobre o assunto. Tenho uma tiavó que diz que Amélie deixou uma carta para a filha explicando sobre sua origem, mas quem tinha a posse dessa carta era Albert e não se sabe onde a carta foi parar ou se chegou as mãos de Frida.

- Sabe, apesar de medonho, é uma história fascinante.

- Concordo. Vem cá.

Levei Adriano até o corredor dos quartos. Havia um quadro de Frida lá.

- Que linda!- ele disse abobado.

- Ela é a Frida. Foi o próprio Albert que fez.

O quadro era bem grande e tinha uma moldura de cor escura e talhada. Nele Frida tocava o piano, ela estava com um vestido rosa claro enorme, a saia era tão grande e rodada que cabia três de mim ali dentro. Frida estava sorrindo, um sorriso perfeito e cheio de dentes, seus cabelos dourados estavam amarrados numa trança que formava uma cascata que descia por toda a sua costas. Seus olhos eram de um verde vivo! Sua pele parecia neve de tão branca e ela tinha uma mancha marrom no braço esquerdo igual a minha.

- Vocês são parecidas.- Adriano disse alternando o olhar entre eu e o quadro.

- Não! Ela é muito mais bonita. Eu sou mais gorda e meu cabelo é cacheado e castanho.

- Vocês são idênticas!- ele pegou meu braço onde tenho a mancha escura.

- Crianças? O almoço está pronto lá na sala de jantar!- Zoraide gritou das escadas.

Eu e Adriano descemos correndo sob o olhar de desaprovação de Zoraide. Comemos quase mudos e assim que terminamos voltamos para a biblioteca, onde fizemos todo o trabalho.

- O que vamos fazer agora que terminamos?- eu disse.

- Não sei. A casa é sua.

- Que tal a gente jogar vídeo game lá no meu quarto.

A mansão TodervauserOnde histórias criam vida. Descubra agora