Capítulo 1

236 26 11
                                    

A taberna estava cheia de pessoas imundas e bêbadas, era um inferno ter que atender a todos eles, ainda mais com suas investidas e palavras para mim.

Se tivesse condições de trocar de emprego eu trocaria, não tenho dúvida que o faria. Talvez eu fosse professora de português, leitura era algo que me encantava, mas infelizmente só pude aprender a ler e entrar no mágico mundo dos livros depois dos meus 16 anos, quando fui apadrinhada pelo senhor Jeremias, antes disso eu vivia nas trevas da ignorância e nem o sabia.

Na verdade isso acontece com grande parte da população, poucas das pessoas que eu conheço sabem ler, e as que sabem são apenas meus patrões ou superiores, então nunca tenho a oportunidade de conversar sobre um livro.

Entreguei a última cerveja na mesa dos fundos da taberna e os homens brindaram molhando um pouco do meu vestido com a bebida. Um dos homens me chamou a atenção, não era gordo com os os outros, e suas roupas não estavam sujas, se não estivesse em um bar como aquele eu poderia dizer que era da nobreza só pelo seu ar e forma de se portar, ele era um pouco assustador. Não pude ver seu rosto pois ele usava um capuz, mas devo confessar que fiquei um pouco curiosa.

Me virei para ir embora e começaram as investidas. Seria melhor se eu não fosse bonita, isso me pouparia muita frustração, acredito que possam imaginar como é uma mulher servir mesas cheias de homens bêbados e exaltados.

Ignorei a todos os comentários, aquilo não me incomodava mais tanto quanto no início, embora nunca houvesse deixado de ser ruim, eu já havia me acostumado.

Saí dali, mas não sem antes receber um tapa no traseiro, era humilhante.

Andei rápido até a bancada para pegar mais uma bandeja com os pedidos. A saia era muito pesada e dificultava para que eu andasse, então eu tinha que levantar um pouco e acabava mostrando a canela, atraindo muitos olhares e murmúrios.

-Alice, está tudo bem com você?-O senhor Jeremias que estava do outro lado do balcão chamou minha atenção.

-Claro, padrinho. -Eu sorri -Tem mais pedidos para mim?

-Não, minha querida, pode descansar.-Ela sorriu também é eu vi as suas rugas de expressão, ele havia envelhecido muito em um ano, acho que os problemas financeiros tenham afetado expressão lê mais do que eu havia imaginado.

-Sabe, Alice -Ele começou a falar com aquela voz calma que sabia tocar meu coração -Seus pais vão ficar orgulhosos de saber que você se tornou uma menina tão prestativa...Tem certeza que não quer vê-los?

-Tenho.-Desde que eu fiz 16 anos e vim morar com Jeremias eu nunca mais vi meus pais, isso já fazem 4 anos. Ele sempre tenta me convencer, mas eu não ligo. Meus pais me jogaram para ser criada pelo primeiro que apareceu, eu fico feliz que tenha sido por sorte una pessoa tão boa quanto o padrinho.

Ele suspirou e voltou a secar os copos.

Peguei um jornal que estava na bancada e parei para dar uma olhada, fazia tempo que eu não me atualizava sobre o mundo, e até sobre minha própria cidade, eu passava muito tempo em casa, então perceber as novidades era mais difícil.

Coloquei o jornal na primeira folha, 24 de julho de 1830, era de hoje mesmo.

A manchete era sem dúvida chamativa "A família real está em nossa cidade".

Li toda a matéria, mas não adiantou muito, a matéria inteira era apenas o título de forma enrolada. Era simples, a família real estava em Barcelona e ficaria uma semana para conhecer e tratar de negócios.

Eu estava imersa na leitura mas me virei repentinamente para atrás ao ouvir o som de copos quebrando e pessoas gritando.

O homem que parecia da nobreza brigava com um dos outros homens da mesa. Ambos eram fortes, mas o "homem misterioso" parecia bem mais preparado, e não demorou muito para deixar o oponente sem ter como revidar.

Meu tio saiu da bancada e foi até os dois com uma olhar de ódio indescritível.

-Posso saber que confusão é essa no minha taberna, cavalheiros?! Por acaso isso aqui parece um zoológico para vocês se portarem como animais?!

-Sinto muito, senhor, mas este homem estava falando coisas não muito agradáveis daquela senhorita--Ele apontou para mim-Eu quis apenas defendê-la.

Senhor Jeremias suspirou.

-Agradeço, meu rapaz...-Meu tio colocou a mão no ombro do rapaz, que ainda não havia mostrado o rosto- Qual seu nome?

-Nico, meu nome é Nico.-Ele respondeu sério, mas eu vi por debaixo do capuz que ele deu um sorriso, como se fosse algo engraçado.

-Obrigado, Nico.-Ele olhou para o outro que ainda estava no chão e você, Vicente, vá embora por favor, sabe que essa não é a primeira vez.

O outro rapaz colocou o chapéu com raiva e foi embora pisando com força.

-Acho que eu já vou também -Nico disse -Desculpe novamente pela confusão.

-Não foi nada, meu filho, desculpe de comparar com um animal. -Ambos riram e o homem saiu pela porta.

Depois de algum tempo todos os clientes foram embora.

Meu tio apagou algumas velas na área dos clientes para que não gastassem.

Depois ele se sentou ao meu lado e começou a fumar o seu charuto, ele sempre fazia isso depois de um dia cansativo.

-O mundo precisa de mais jovens assim, depois de conhecê-lo eu até criei um pouco de esperança com a nova geração.

-Ele era muito bem educado, suas roupas não eram nada baratas, me pergunto o que ele fazia em uma bar neste bairro.

-Eu também, querida. -Meu padrinho deu um gemido de dor -Essa dor nas costas nunca vai embora...Pode terminar de fechar aqui para mim? E não se esqueça de colocar os cavalos pata dentro do estábulo, deixei eles andarem um pouco.

-Claro que posso, vá descansar.-Ele me deu um beijo na bochecha e um sorriso orgulhoso.

-Você é um anjo, muito obrigado.-Ele colocou uma mão nas costas e subiu para o apartamento.

Apaguei as outras velas e saí para colocar os cavalos no estábulo.

Saí da taberna e aí abrir a porta eu encontrei o homem estranho de mais cedo encostado na parede.

Ele fez uma cara de susto quando olhou para mim, mas logo depois se recompôs.

-Podemos conversar? -Ele sorriu e eu fiz que sim com a cabeça, só esperava que não estivesse metida em problemas.

1082 palavras

O que me separa do príncipeOnde histórias criam vida. Descubra agora