Sangue Seco da Desilusão

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Miniconto dedicado ao @Kalimacast, referente ao tema ganhador do concurso realizado pela equipe do Podcast (que não existe mais, por questões tretudas).

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 Ele, o Negro do Mundo, o Cão do Inferno. O sangue seco ao sol da manhã, mais um corpo caído, anônimo, no asfalto esburacado de uma área qualquer, invisível aos olhos dos bons. Passantes acríticos continuam sua caminhada diária rumo ao pão nosso de cada dia, na certeza de que o sangue de amanhã pode ser de um deles. Vermelho-sangue, símbolo da vida, visão de morte. Era mais um dia para o rapaz que saíra de casa cedo para comprar o remédio de sua mãe. Seus parcos rendimentos ajudavam no sustento de uma família de cinco integrantes, mãe e quatro filhos, sendo o jovem no asfalto o mais velho deles e o único efetivamente trabalhando, O pai os abandonara à sorte e sumiu sem deixar vestígio. Quisera ele, o rapaz, ter sumido também, mas o senso de responsabilidade falava mais alto, e vivia assim, cada dia, cada momento, sem perspectiva, apenas existindo. Nulo, pária, sem voz, como muitos, morro acima, condenado a acompanhar pela velha televisão as cores que faziam o mundo exterior, do outro lado do morro, parecer tão sedutor e inalcançável. Sonhava, claro. Sonhava em ser um jogador de futebol, ou talvez um rapper (sonho impossível). Sonhava com sorrisos felizes que se impunham na tela mágica. Os carrões, as festas, os corpos esculturais. Tudo que ele desejava, nada que teria. Sonhos quebrados em respingos de sangue que salpicavam o asfalto. A voz da autoridade atrás do rapaz jovem, negro, sorumbático e sonhador. Surdo-mudo, não atendeu ao chamado. Uma bala, duas, três o atravessaram. No asfalto, o sangue, vermelho, jazia, secando. A cor do sangue era o que tinha em comum com seus heróis da tela da velha TV.   

Binho Horror Story - Contos de Fabiano JucáOnde histórias criam vida. Descubra agora