Quatro

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Ao chegar em casa, abri a porta carregando Eduard. Meggie logo veio me receber.
-Anna? O que houve? Chegou mais cedo?
-Meggie, lembra dele? -Falei sentando Eduard no sofá.
-Lembro, o que aconteceu com você, filho? -Meggie respondeu enxugando a mão no avental e indo até ele.
-O que você acha? Passou dois anos cuidando de mim por causa de cachaça e cigarros. O que acha que pode ter acontecido à ele?
-Ah...Por Deus, está brincando? -Ela respondeu tirando a camisa dele.
Meggie fez todo o procedimento que fazia comigo, deu banho em Eduard, colocou as roupas do meu pai nele, que eu havia pego, deu de comer e colocou-o pra dormir na minha cama.
-Você acha que ele vai ficar bem? -Sussurrei para Meggie enquanto olhava ele dormir.
-Claro, querida. Isso é só um susto, não se preocupe, está bem?
Eu assenti e Meggie saiu.
Fiquei ali por um tempo olhando ele, e o admirando enquanto dormia. Lembrei do carinho que fiz à ele na estufa e pensei que ele deveria confiar muito em mim, porém, o que não passava pela minha cabeça era sua hipocrisia, de ter quebrado minhas bebidas, e depois ter feito a mesma coisa.
Sentei-me na cama ao lado dele, admirando cada parte do seu corpo. Os músculos, os olhos fechados, o peitoral... Ele era lindo, e finalmente tínhamos algo em comum. Ele me fazia bem, eu gostava dele, mas não sabia se queria deixar ele entrar na minha vida. Era difícil eu me apaixonar por alguém na altura do campeonato, e mesmo que fosse só amizade, eu não sei lidar com amigos, principalmente quando se trata de amigos homens. Todos os amigos homens que eu tive, davam em cima de mim, e nunca tive um verdadeiro. Meu melhor amigo era Tom.
Me despertei dos meus pensamentos quando Meggie entrou no quarto me trazendo o almoço. Eu estava acariciando o cabelo de Eduard, e fiquei sem graça quando ela entrou.
-Seu almoço, querida.
-Obrigada, madrinha.
Ela trouxe a bandeja até mim e eu peguei cuidadosamente para não deixar cair. A comida estava com uma cara ótima e um cheiro divino. Meggie me deu um beijo na testa e se retirou.
Ela havia feito uma carne assada, muito parecida com a que minha mãe fazia, mas não era a mesma coisa. A carne estava suculenta, eu sentia o sabor dela e engolia com gosto.
Estava sentada ao lado de Eduard, que dormia feito um anjo, sem nem saber onde estava. Ao meu ver, ele só tinha como base a floricultura, ele não sabia onde procurar ajuda, já que a avó estava doente. Ele sabia onde me encontrar, e eu me sentia na obrigação de ajudá-lo, já que na noite passada ele se preocupara comigo e me deixara na porta de casa.
Ainda comendo meu almoço feito por Meggie, não parava de pensar no que tinha acontecido com Eduard na noite passada, eu estava curiosa pra ele me contar o que deu na cabeça dele para ser tão hipócrita.
Depois de almoçar e voltar ao trabalho, percebi um estranho movimento em casa. Havia alguns carros estacionados em frente à minha casa, e alguns homens do lado de fora com taças e conversavam.
Ao me aproximar, vi Meggie sentada com uma cara de entediada, como se já me esperasse chegar. Fui direto até ela, que melhorou a cara na mesma hora que me viu.
-O que está havendo aqui, Meggie ? -Perguntei correndo os olhos pela sala. Vários homens bebendo e conversando, a maioria puxando saco de papai, para conseguir um cargo melhor.
-Seu pai promoveu uma reunião de última hora e chamou alguns chefes de outras empresas, para comemorem o aniversário da empresa Miller.
Abri um sorriso irônico. Me centrei tanto nisso, que acabei me esquecendo de Eduard.
-E quanto à Eduard?
-Está no seu quarto, disse que só sairá quando você chegar.
Assenti, beijei sua testa e subi. Minha raiva era enorme em relação à festinha que meu pai organizara, fora todos aqueles homens na casa da minha mãe, o que ela não gostava. Depois que ela morreu, ele se sentiu mais livre, para fazer suas festas e encher a casa com homens.
Chegando ao meu quarto, bati na porta e a voz de Eduard soou levemente.
-Entre.
Ele pareceu surpreso e feliz ao me ver.
-Graças a Deus Anna.
-O que aconteceu ? Como você está ?-Perguntei.
-Estou bem. Dormi até agora a pouco, sua madrinha cuidou de mim. Preciso ir embora, minha avó foi para o hospital.
-O que aconteceu com ela ?
-Ela desmaiou. Preciso ir. -Ele falou pegando uma sacola, que deveria estar sua roupa.
-Espera. Precisamos conversar, Eduard. Quero saber o que aconteceu e porque agiu desse jeito.
-Não tenho cabeça pra isso. Minha avó está no hospital. -Ele respondeu abrindo a porta.
-Espere, eu vou com você.
-Não.
-Sim, eu vou. Não quero ficar em casa e se você precisar de ajuda, estarei lá. -Respondi firmemente.
Peguei meu casaco e desci, quando vi Eduard lá embaixo conversando com Meggie. Peguei as chaves do carro e fui até a garagem.
Nada passava pela minha cabeça, não pensava em absolutamente nada, apenas em ajudar Eduard e saber o que havia acontecido noite passada. Ele parecia tenso e preocupado. Eu até entendia, a avó era a única pessoa que ele tinha, era a única que sobrevivera para cuidar e dar carinho à ele. Por mais que ele fosse adulto, todos precisam de carinho, e ele parecia precisar mais e sofrer muito com a perda desde pequeno.
-Anna? -Ele quebrou o silêncio.
-O que ? -Respondi sem desviar o olhar do volante.
-Obrigado por tudo. -Ele falou me olhando pelo canto do olho.
-Disponha. Posso lhe fazer uma pergunta ?
-Claro. -Ele respondeu me olhando diretamente.
-O que aconteceu noite passada ? Preciso saber porque você agiu hipocritamente.
Ele suspirou até responder, mas por fim disse:
-Como posso saber que você é confiável?
-Não tem como saber. Acho que você já teve provas o suficiente.
Ele sorriu e continuou:
-Eu era pequeno, quando meu pai chegava bêbado em casa e agredia à mim e à minha mãe. Ele não sabia o porque de fazer aquilo, mas sempre que ele saía para beber, sempre apanhávamos.
Ele suspirou por um momento, pensando se continuava ou parava. Então ele continuou:
-No dia do meu aniversário, estava tendo uma festinha em minha casa, que minha mãe preparou. Ela mesma fez tudo. Doces, bolo, salgadinhos, enfim...
Meu pai estava ausente, o que me deixava muito triste. Quando deu 22:00 da noite em ponto, ele chegou e arrumou maior confusão. As pessoas assustadas, foram embora e depois disso, mamãe apanhou tanto que desmaiou. Fui tentar ajudar, mas não consegui. Meu pai me deu um soco e eu caí por cima de um copo, onde me cortei todo. Por fim, vizinhos escutaram gritos e pedidos de socorro e a polícia foi até lá. Prenderam meu pai, que permanece preso até hoje. E minha mãe morreu com problema nos ossos, de tanto apanhar. Ontem era meu aniversário, e não aguentei. Fiz o que minha mãe não queria que eu fizesse. Depois juntou o que aconteceu com minha avó, e eu fiquei completamente desnorteado.
-Poderia ter me procurado para conversar. -Interrompi.
-Lembrei de você só depois que fiquei sem saída.
Senti a raiva subir e a vontade era de falar besteira, mas ao menos, ele foi honesto comigo.
-Não fica chateada, é que vi você como...
-Não se preocupe. Não estou chateada.

Fiquei triste com a história de Eduard, o que me fez sentir muita pena dele. O pai permanecia preso, enquanto não fazia 3 dias que a mãe estava morta. A avó estava doente, e infelizmente, ele não sabia o que fazer. Eu não sabia muito sobre ele, mas ao que conhecia, sabia que ele tinha disposição para enfrentar qualquer coisa. Ele era adulto, forte e maduro.
Depois que estacionei, tranquei o carro e entramos no hospital.

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