[NOVA VERSÃO]
"Sabia que estava a brincar com a paciência de um demônio. Sabia que aquelas palavras não eram apenas para testar-me, mas que graça tem deixar este jogo a meio? "
Lágrimas, sonhos quebrados pela luxúria dos outros.
Annie não merecia na...
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" O destino tem inveja de nós. Como tu, eu estou com tanto medo."
– Serendipity
Risos, choros...Isto era tudo o que as pobres crianças conseguiam ouvir naquela noite.
Os seus frágeis e sujos corpos tremiam, os seus olhos mais uma vez se enchiam de lágrimas perante aquelas máscaras medonhas e as suas mentes eram levadas para a escuridão onde apenas a loucura permanecia, num lugar na terra onde os anjos não conseguiam consertar ou simplesmente tocar.
Mas, no meio das chamas transparentes daquele inferno, duas almas não choravam, não tremiam, nem sequer se moviam, apenas encaravam fixamente cada corpo que entrava naquele mundo, como sempre faziam quando aquela data chegava.
As suas mãos, porém, não mostravam a firmeza nem a determinação dos seus olhares, permaneciam fortemente entrelaçadas. Faziam-no numa tentativa de mostrarem a sua união e força ao destino e fugir, mais uma vez, à morte, como sempre fizeram durante incontáveis dias, durante o que lhes pareciam vidas.
As velas começaram a ser acesas, uma a uma, enquanto os corpos mascarados se posicionavam nos seus respetivos lugares, sedentos até cada ponta dos seus cabelos pela hipótese de conseguirem finalmente a resposta dos seres que deviam ser mantidos adormecidos.
Quando as chamas começaram a derreter a cera e as doze badalas foram tocadas pelo sino do edifício, estes encaram, como uma matilha faminta, todas as imundas jaulas que os rodeavam, uma atrás da outra, fazendo as crianças no seu interior sussurrassem as preces que pouco tempo tiveram para decorar, rezavam silenciosamente enquanto as suas lágrimas limpavam o sangue seco dos seus rostos.
Mas os dois jovens continuavam sem se mover. Mantinham-se ajoelhados na sua jaula demasiado pequena para a altura que obtiveram durante os anos, as mãos ligadas e os rostos secos. Não sussurravam como todos as outras, não suplicavam pelas suas vidas ao ser lá de cima como todas as outras, apenas encaravam sem expressão aquele cenário. Há muito que tinham parado de acreditar em qualquer força sobrenatural, do bem ou do mal, apenas acreditavam um no outro, por isso, permaneciam como estátuas num cemitério enquanto as suas almas dançavam abraçadas na escuridão do medo.
Contudo o destino não gostava de ser ignorado.
O olhar dos mascarados pousou na vigésima primeira jaula e os seus lábios abriram quase imediatamente num sorriso macabro enquanto os seus corpos se inclinavam das cadeiras para poderem analisar cada detalhe das crianças de mãos dadas.
Foi nesse instante que a rapariga do duo fechou os olhos, movendo-se pela primeira vez naquela noite. Sabia o que aconteceria nos minutos futuros, sabia que tinha chegado a hora de um deles, e sem mesmo perceber esta começou a cantarolar a canção de embalar da sua mãe. O rapaz por sua vez também se moveu, encarou a sua companheira e num ato igualmente inconsciente sorriu, não num sorriso de pura felicidade, nem sequer de pena, apenas um simples e quente sorriso, fazendo com que o mesmo sentisse o sabor salgado das suas lágrimas na boca.
Os passos fortes de Cérebro podiam ser ouvidos juntamente com o tilintar das suas tão famosas e amadas correntes, ambos os jovens sabiam que lutavam contra o tempo e que uma dor maior os esperava, independentemente do escolhido.
As outras crianças os encaravam agora silenciosamente, sabiam que o dia deles não era aquele e, apesar de egoistamente, as lágrimas já não caiam da mesma forma nos seus rostos, deixavam de transportar desespero e carregavam, agora, o alívio e a pena. Uns baixavam o seu rosto, assustados, pela força do cão personificado daquele inferno que passava pelas suas jaulas, outros, mais audazes, continuavam a encarar a dupla, emocionados pela voz da pequena.
A rapariga parou de cantar quando a jaula foi aberta apesar da sua mão continuar protegida pela do seu parceiro, e como se uma fera não estivesse à sua porta, encarou o jovem, fixando cada pequeno detalhe da sua aparência na sua mente, não o queria esquecer, não queria chegar ao outro lado sem a sua imagem, desejava que, se assim o fizesse, o reconheceria num mundo longe do que o que esta vida lhes trouxe.
E com apenas um pequeno movimento do homem de máscara, as suas mãos separam-se.
Num movimento demasiado rápido, o corpo fraco do rapaz foi arrastado para fora da jaula sem delicadeza alguma, fazendo com que a jovem agarrasse os ferros imundos da porta agora fechada e a sua voz doce desaparecesse, apenas para ser substituída por sons de desespero, primeiro pequenos sussurros de negação, depois, a cada passo que ele era afastado dela, por gritos de puro desespero.
Mas, apesar da tristeza mostrada pela rapariga, o rapaz não se opôs a quem o levava, não se contorcia nem chutava tudo e todos, apenas deixava-se ser arrastado para a mesa manchada de escarlate, onde o seu caminho terminaria, naquele inferno, num corpo demasiado esgotado para lutar pela sua vida e pela vida da jovem de olhos castanhos à sua frente, como um pássaro branco encarcerado.
Ao som da voz da alma sofrida da jovem, o rapaz foi deitado na mesa sagrada daquele submundo e a adaga foi trazida pela cabeça daquele lugar, o Lucifer daquele mundo, livrada do sangue que derramara da última vez.
Num movimento de total desespero a criança começou a tentar abrir a porta da sua cela, chutava-a, empurrava-a, mas os seus braços eram finos e seu corpo estava desidratado, não demorou muito para o seu fôlego acabar e sua cabeça encostar nas grades, esgotada, confinada apenas a observar enquanto adaga era levada aos céus e, num movimento rude, cravada na carne de quem mais confiava.
Nesse instante, o tempo parou para as duas crianças.
Encaravam-se, num encontro de olhares demasiado triste para poder ser imaginado em tão puras almas, e num movimento de lábios forçado, com um conhecido sabor metálico, o rapaz proferiu as suas últimas palavras antes de fechar os olhos para aquele mundo.
E o fogo do inferno tornou-se numa realidade.
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Notas: Oi, Diana aqui. Hoje é o meu aniversário e também o recomeço desta história. Espero que gostem e que partilhem comigo as vossas opiniões, estarei sempre pronta para as ouvir. Até breve!