- Hoje é dia da Marlene, baby?
Juliana, com a cabeça repousada em meu ombro, fez a pergunta me tirando do estado sonolento, quase apagando. Tínhamos acabado de transar e permanecemos deitados curtindo o momento. Juliana conseguia uma folga extra no trabalho às quintas-feiras e passou a usar esse dia para ficar comigo. Típico programa de amante que tanto me incomodava e comentei com a Tatiana no dia anterior. De fato, não gostava de como essas coisas estavam andando. Por outro lado, tinha um dia inteiro com ela à minha disposição. Ela chegava, rolava aquela trepada sensacional para matarmos a saudade, coisa hormonal beirando à selvageria, depois saímos para almoçar, voltávamos para a minha casa, rolava uma rapidinha de sobremesa, um cochilo pós-gozo em seguida, acordávamos já de noite, bebíamos alguma coisa, às vezes um filme, depois um sexo de fim de dia protocolar estilo casal com vinte anos de relacionamento, dormíamos e no dia seguinte ela ia direto para o trabalho. Com sorte, conseguia um sexo matinal daqueles que o homem não goza nunca porque está com a bexiga cheia. Não, não podia reclamar no quesito satisfação. Fazia um bom tempo que não tinha dias com tanto sexo. Contudo, esperava algo mais da minha relação com ela. Ainda mais considerando como foi na época que apenas flertávamos.
- Claro que não – respondi. – Até porque já são quase cinco e meia. O horário dela não é esse.
- Baby, então melhor ver porque, pelo barulho de porta abrindo que eu ouvi, alguém acabou de entrar.
Não tinha escutado o tal barulho que Juliana falou. Como sou bem surdo na maior parte do tempo, deveria levar em consideração o que ela tinha dito. Antes que pudesse fazer algo, ambos escutamos o som da minha porta da sala batendo com força. Os dois reagiram assustados àquilo. Juliana, levando consigo o lençol cobrindo o seu corpo nu, correu para o banheiro e lá se trancou. Que ótimo, não? Um suposto marginal entrando na casa e eu que me virasse para me defender dele nu, literalmente com o pau na mão. Acabei correndo e fiquei atrás da porta do quarto que já estava fechada. Alguém forçava a maçaneta tentando abrir a porta. Continuei atrás da porta oferecendo resistência. Aliás, uma resistência nem tão impressionante assim. Aparentemente, o meliante era surpreendentemente fraco. Após algumas tentativas frustradas, a pessoa parou de forçar a porta.
- SAI DE TRÁS DESSA MALDITA PORTA, SEU IMBECIL! - era a voz da Tatiana.
- Porra! – disse abrindo a porta. – Você quer me matar do...
- IMBECIL! – Tatiana me interrompeu. – COLOCA UMA ROUPA! PORRA! Não bastasse tudo, ainda tenho de te ver pelado. Por que você está pelado em pleno... Peraí! Tem gente no banheiro? Quem é a piranha desta vez?
- Tatiana, não tem piranha alguma – disse enquanto colocava um short e tentava gesticular para Tatiana que contivesse as palavras. – Só pode ser uma pessoa.
- Uma pessoa é o cacete! Cada dia você come uma piranha diferente. Por que está todo se mexendo aí igual a uma codorna abatida? O que tem a piranha no banheiro? O que ela tem de especial para você estar a defendendo? Ela por algum acaso... Ah tá! Já entendi. Quem está no banheiro é a...
- Juliana – a própria saiu do banheiro se apresentando. – Você deve ser a Tatiana, não?
- Sim, sou eu. Desculpe-me pela maneira rude de nos conhecermos, mas meu dia não foi nada bom.
- Imagino que tenha seus motivos além, obviamente, do habitual que é conviver com esse traste.
- Baby – intervi na conversa. – Não tem nem cinco segundo que conheceu a Tatiana e já está contra mim?
- Baby é o cacete – Juliana respondeu num tom áspero que nunca tinha visto antes. – Que história é essa de cada dia uma piranha diferente?
Olhei para Tatiana na intenção de sinalizar que a brincadeira não estava tendo graça. Ela me devolveu um olhar tão furioso quanto o de Juliana. Naquele momento, me dei conta de que algo sério aconteceu e eu iria me dar muito mal. Pelo menos já estava vestido, pois a exibição do encolhimento do meu pau seria ilustrativa para a minha sensação de pavor pelo que estava por vir. Cheguei a desviar os olhos para a Juliana para confirmar o que era óbvio, só faltava a Tatiana bufar. Vendo que estava em uma sinuca de bico, ou melhor, em uma corda bamba equilibrando duas coisas ao mesmo tempo, optei por contemporizar. Seria impossível administrar uma Tatiana, que tudo sabe de mim, possessa e uma Juliana, que gostaria que desse certo, igualmente irada. Sentei-me então à beira da cama:
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Diário de Classe
No FicciónProfessor, irresponsável, beberrão, pervertido e tentando reorganizar a vida. Talvez seja autobiográfico, talvez seja ficção. Quem se importa? [EM CONSTRUÇÃO]