Criancinhas endiabradas

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O caminho até o parque é calmo e silencioso, e o vento gelado fazia Mel se encolher dentro do casaco que a agasalhava. O chinelo batia no asfalto fazendo um barulho irritante, e seus dedos do pé congelavam a cada passo.

Brett logo aparece um seu campo de visão, sentado em um dos balanços velhos do parque. Distraído, ele empurra o chão com o pé, guiando o assento de madeira para frente e para trás.

"Olá." Diz Mel sombriamente, fazendo o garoto cair do balanço enquanto solta um grito. Ele tenta correr, mas ao ouvir uma risada feminina, percebe que é apenas sua amiga tirando sarro dele, como sempre. Xingando, ele se levanta e limpa a terra em seu joelho.

"Você está querendo me matar de susto?!" Ele reclama com a mão no coração, encenando uma recuperação muito mas dramática que o necessário.

"Eu te matar de susto? É você quem está no balanço de um parque abandonado no meio da noite, parecendo uma criança endiabrada. Eu, no máximo, sou esforçada."

Rindo, ela sobe o brinquedão de madeira, sentando no topo e deixando suas pernas balançarem para fora.

"Então, quer dizer que nos futuros livros de história, a grande fuga vai poder ser narrada com uma guerreira que escapou do cativeiro vestindo apenas um moletom e chinelos de dedo?" Brett diz, se sentando ao lado de Mel. Com um sorriso do rosto, ela deita sua cabeça sobre seu ombro, enquanto ele envolve sua cintura com seus braços, a puxando para perto. "Mas, falando sério, você realmente pulou da janela de chinelo?"

"Pular da janela? Eu saí foi pela porta da frente. Bem mais fácil e menos perigoso."

"E bem menos divertido."

"Acho que a Mel com o pé quebrado em um Universo Alternativo vai ter que discordar."

E a noite segue assim, ambos rindo e aproveitando a companhia do outro. Mel não era de fazer muitos amigos. Era uma pessoa tímida, apesar de amigável, que tinha um pouco de dificuldade em fazer novos amigos, pois tinha o hábito ruim de julgar as pessoas sem as conhecer e formar conclusões precipitadas. Mas, quando deixava alguém a conquistar, se tornava uma pessoa completamente diferente. Ela amava com cada pedacinho de seu corpo, e tinha a felicidade alheia não apenas como uma prioridade, mas como uma coisa que a deixava feliz. Por isso, confiava cegamente e adorava completamente qualquer um sortudo o bastante para ter sua amizade.

A brisa gelada faz com que Mel se encolha contra o corpo de Brett. Seus olhos refletem o brilho das estrelas, e os dois ficam em silêncio. Ele sabia que ela não gostava de falar muito sobre sentimentos, e por isso, apenas estar ao seu lado enquanto ela decifra os pensamentos em sua cabeça é suficiente para a menina.

"No que você está pensando?" ele indaga, pois a morena não está com os pés no chão, e essa situação se torna uma metáfora para sua mente. Assim como a menina olha para o céu, enquanto balança os pés distantes do chão, sua mente vaga, desassociada de uma força normal que a combine com um plano reto, distante do concreto, flutuando pelo ar.

Seu olhar muda e volta a focar no rosto do menino, e ela percebe que seus olhos azuis tem um brilho tão elegante quanto o das estrelas. "Como você sabe que eu estou pensando em alguma coisa?"

"Não venha com essa para cima de mim." Ele diz com um meio sorriso. "Eu te conheço desde a época que você achava que haviam umpa lumpas trabalhando dentro dos semáforos para mudar as luzes."

"Ei!" Ela exclama rindo. "Você prometeu não usar isso contra mim!"

Apesar de não confiar em muitas pessoas, ela botaria sua vida nas mãos de Brett sem hesitar. Eles se conheciam desde o maternal, quando brigavam pelo lápis prateado na hora de desenhar, e mantiveram sua amizade sem esforços. Estar com ele era tão natural como um pôr-do-sol. Mesmo que, ao longo dos anos, o caráter deles tenha divergido um pouco, Brett se tornando o típico garoto popular que era parte do time da escola e tinha incríveis olhos azuis e Mel preferindo uma vida mais quieta, se tornando uma pessoa mais reservada, a amizade dos dois continuava inabalável. E, mesmo que Mel tivesse dificuldades para puxar assunto e mandar mensagens, ela sabia que ele não deixaria de insistir na comunicação entre eles.

"Anda logo. Desembucha piranha."

Ela suspira, sabendo que não há como escapar dessa. Por mais que ela confie nele, ela não gosta de contar sobre seus problemas, porque, além de gostar de resolvê-los sozinha, não quer atolar os outros com suas complicações.

"Bem... é um pouco estranho. Não sei bem por onde começar." Brett desliza sua mão sobre as da morena, um gesto que transmitia calma pra ela. Respirando fundo, ela continua. "Hoje eu acordei com uma dor de cabeça muito forte, e o corpo todo doendo. Assim que isso aconteceu, minha avó entrou no quarto com um copo de água e remédio. Ela disse que eu tinha me queixado de dores de cabeça antes de ir dormir, mas que ela acreditava que era só cansaço, nada para me preocupar."

"Bem, as vezes você só está doente. Todos nós sabemos como você é alérgica."

"Não foi isso a parte estranha." Ela busca em sua mente um jeito de explicar, mas não importa o modo como fale, sabe que vai parecer ter um parafuso a menos. "Quando eu acordei, eu não conseguia me lembrar de nada."
Brett franze as sobrancelhas, um olhar preocupado em seu rosto. "Como assim?"

"Eu não sei explicar. É como se alguém tivesse apagado minha memória. Eu sei que eu deveria lembrar de algo, mas quanto mais eu tento, mas distante a memória parece. E de depois, vovó ainda vem com esse papo esquisito de viajar de última hora e me deixar com minha prima." Ela aperta a mão do menino que repousa sobre a sua.

"Talvez você tenha ido dormir de tarde e acordou um pouco desorientada. Isso é normal. E mesmo que sua avó já tenha dado um motivo para viajar assim do nada, não deixa de ser estranho."

"Ou talvez eu esteja exagerando como sempre, e tudo não se passe de uma besteira."

"Ei." Ele leva sua mão ao rosto da menina, tirando uma mecha de cabelo que caía em seu rosto e a prendendo atrás de sua orelha. "Não tem problema. Qualquer que seja a explicação eu estou aqui para o que você precisar."

"Então, você não me acha maluca?"

"Isso eu já não posso dizer. Eu sempre te achei esquisitinha."

E como dois imãs de atraem, seus rostos se aproximam, os lábios selando em um gesto acompanhado de carícias. Talvez, aquela decisão não tenha sido a mais sensata, beijar seu melhor amigo na véspera de uma mudança. Mas enganado está que tenta aplicar lógica naquela menina que andava na terra com quem navega no mar.

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⏰ Última atualização: May 07, 2017 ⏰

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