Capítulo 17

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Ela não o viu partir. Virou-se para a porta. Ao gi­rar a chave na fechadura, ouviu o portão se fechar.

Ela quase caiu no corredor após tropeçar em uma pilha de objetos. Chutou tudo e acendeu a luz. En­torpecida, ela seguiu até a cozinha.

Uma confusão de emoções tomou conta dela de forma tão intensa que ela quase gritou. Avistou os Papéis espalhados na mesa e os jogou no chão. De­pois pensou melhor, os rasgou em pedacinhos e pôs no lixo.

Era uma hora apropriada para tomar algo. Mas não tinha bebidas no apartamento, e teve afinal que recorrer a leite quente. Tomou alguns goles e foi para o chuveiro, cuidando para não se olhar no es­pelho.

Sentiu como se algo estivesse entalado em seu - - peito. Só depois de sair do banheiro, quando foi ve­rificar se a porta estava trancada, percebeu as coisas no chão do corredor.

Era uma pilha de sacolas e caixas, entregue por uma transportadora e certamente colocada lá pela vizinha, que deve ter usado a chave que Ellie lhe dera para casos de emergência. Agora estava tudo bagunçado. As caixas estavam sem tampa e havia tecidos e sapatos caros demais, incompatíveis com o seu orçamento, tudo espalhado pelo chão.

Ela reconheceu tudo, obviamente. Eram as pe­ças que experimentara na loja. Valiam uma fortuna. Como um homem tão preocupado com a política do banco podia ser tão generoso?

Como ele se atreveu a fazer isso? Como ousou não aceitar sua recusa? Que tipo de homem não aceitava um "não" como resposta?

Ao rolar na cama vazia, a mente dela fervilhava com palavras. Arrogante, dominador, controlador, dissimulado, ardiloso...

Ela ficou lembrando o momento humilhante em que ele olhara para ela como se pudesse ver-lhe a alma.

O que um homem como ele sabia sobre uma mu­lher como ela?

***

Sam gemeu e rolou na cama.

Um minuto depois ele deu um pulo e calçou o tênis, um short e uma camiseta. Uma corrida pelas ruas da cidade ao amanhecer poderia ser um bom começo de dia, mas não hoje. Seria preciso fazer algo intenso na academia do prédio e depois nadar na piscina.

Após tomar banho e se barbear, vestir a camisa e a gravata, ele chegara a uma decisão sobre um modo razoável de lidar com tudo. Diria de forma sucinta que qualquer ligação pessoal entre eles era passado. Deixaria claro que tinha um banco para administrar e que não toleraria os desvios do comportamento feminino. Ofereceria uma transferência...

Mas e se ela aceitasse?

Não. Ele duvidava que aceitaria. Onde acharia a oportunidade de ter um emprego como aquele?

Mas e quanto ao lado pessoal...

Ellie O'Dea aprenderia que ele não era um ho­mem desesperado pela companhia de mulheres bo­nitas. O mundo estava repleto de ruivas ainda mais bonitas que ela.

Mais honestas. Mais abertas, mais diretas.

Mais receptivas. Mais complacentes.

Mais agradecidas pela oportunidade de aprovei­tar uma noite com um amante sensível. Se ela sou­besse as medidas desesperadas que algumas mu­lheres poderiam tomar para atrair a atenção dele... v Atrizes. Modelos.

Ao contrário do que ele esperava, ela não estava em seu local de trabalho, e não havia sinal de que tivesse chegado.

Excelente. Dava mais tempo para que ele se con­centrasse nas tarefas importantes daquele dia. No entanto... Ela não teria tirado o dia de folga, teria? Ou...

Um pensamento paralisante ocorreu a ele. E se ela decidira não voltar mais?

Ellie acordou tarde. Sabia que Sam estaria es­perando que ela chegasse antes dele, mas achou im­possível se apressar.

O cabelo levou um longo tempo para secar, não ficou preso direito, e no fim ela resolveu deixá-lo solto. Na hora de se vestir, lembrou que o melhor terninho fora deixado no carro de Sam e o outro estava na lavanderia.

Era uma emergência. Tinha que levar em conta seu orgulho. Uma mulher na situação dela não podia en­cará-lo com roupas velhas. Só podia fazer uma coisa.

A caminho do trabalho ela fez um desvio.

Na loja de departamentos ainda havia poucos clientes. Sabendo que a batalha não podia ser ven­cida com armas inferiores, ela passou direto pela seção de artigos mais baratos e foi direto para a se­ção de roupas de grife.

Precisou escolher rápido. A primeira coisa que chamou sua atenção foi um vestido preto. Era ele­gante e bem feminino, com pequenas mangas de tule bordado e um preço que a faria engasgar no dia anterior. Junto aos cabelos ruivos e à pele bran­ca, o vestido ficou ainda mais lindo. Ela ficou na dúvida por alguns minutos. Ninguém jamais fora trabalhar com um modelo assim. Ela teria que adiar a inseminação artificial. Um emprego valia tanto sacrifício?

Sim\ A resposta soou em sua mente.

A vendedora pareceu na dúvida quando Ellie dis­se que queria ir para o trabalho com o vestido, mas ela já havia se decidido. Deixaria um rombo nas economias, mas ela pagou o vestido sem hesitar.

Só depois de sair da loja ela se permitiu admitir que o nó que tinha no peito estava ligado a Sam. Cada passo em direção ao banco era um sacrifício, mas se conseguisse superar o primeiro dia perto dele...

Na hora em que ela chegou, o prédio estava cheio. As pessoas por quem passou olharam para ela e disseram "Ellie! Que vestido incrível", e ela sorriu como se fosse um dia como outro qualquer. Não que ela estivesse nervosa. Não exatamente. Ele seria cortês como sempre, tinha certeza. Seria difí­cil. Ele sabia ser educado e deixar as pessoas parali­sadas mesmo quando não estava despedindo-as.

Ela saiu do elevador às l0hl0. Era quase a hora do café dele. Deixou a bolsa ao lado da mesa e cor­reu para colocar o leite que comprara na geladeira.

Dentro do escritório, Sam ouviu o barulho da chegada dela. Ficou tenso e olhou para o relógio.

Deveria se explicar.

Ele se levantou e andou com o porte do presiden­te da empresa.

Ela estava de costas, ajeitando a máquina de café expresso. Ele percebeu imediatamente que estava de cabelos soltos. Ao ouvir a porta ela se virou, e -ele ficou atormentado.

O vestido era preto. Acima do corpete de renda a insinuação dos seios era perolada, como cetim. E as pernas longas. Os lábios pareciam mais volumosos. Os olhos dela brilhavam como... Droga, precisava se controlar. Não aprendera? Aquele brilho signifi­cava que ela estava planejando algo.

Ele disse bruscamente:

— Está atrasada.

Ellie ouviu a acusação na voz dele e corou.

— Eu sei. Lamento. Tive um imprevisto. Quer um café?

A expressão dele congelou. Ela percebeu o que dissera e seu coração saltou. Por um momento, fi­cou muda, mas depois se controlou.

— Quer...?

— Já tomei café, obrigado. Lembrou-se da reu­nião com os gerentes às 10h30?

— Sim, claro.

Droga. Esquecera da reunião, mas ainda tinha dez minutos para organizar a sala. Já preparara o material impresso de apoio para a apresentação que havia elaborado. Pelo menos não tinha motivo para se envergonhar de seu trabalho. Dedicara-se bas­tante a ele, e o conteúdo das apostilas era de ótima qualidade.

Sonhos de Uma NoiteOnde histórias criam vida. Descubra agora