Spencer R. Fletcher
Onze anos atrás.
Acordei em desespero quando senti que estava me afogando, abri os olhos com certa rapidez e deixei a cama em um pulo sentindo meu rosto e corpo gélido e molhado. Havia uma mancha de água ao redor da marca do meu corpo sob o colchão junto de pedras de gelos e um balde ao lado da madeira.
— Hora de acordar, Principessa.
Eu odiava quando me chamava daquela forma, sabia exatamente o que seguia, e aquele apelido durante a madrugada era o único carinho que Peter podia me dar.
Olhei para minha roupa encharcada e pensei em trocar, mas não tinha tempo para isso e eu não estava a fim de descobrir qual era a punição número três: "nunca chegue atrasada ou será punida".
Calcei meus sapatos ao lado da cama e caminhei até os fundos, onde havia uma sala de treinamento, Kovic e Maurice já estavam me esperando, e eu agradeci mentalmente que eles eram os treinadores desta semana, eles sabiam pegar leve e me tratavam como uma "frágil garotinha", do jeito deles.
— Acorde, Rose. — Murmurou assim que passou um golpe entre minhas pernas e me levou para o chão.
— Caralho. — Murmurei e movi meu corpo no chão duro, ignorando a dor em minhas costas.
As próximas horas foram de treinamento intensivos, levei vários golpes, mas pude acertar outros sem me importar em machucar meus instrutores, eu até queria fazer isso, e poderia se ambos não fossem dois armários.
Deixei a sala de treinamento com novos hematomas e uma aparência horrível, minha roupa estava colada em meu corpo pelo suor e a água de mais cedo e eu só queria ter um dia normal. Minha vitamina estava pronta na cozinha, assim como o drink de Peter, costumávamos tomar o "Café" de fim de treino juntos, para que ele pudesse ouvir de mim tudo que havia aprendido. Encarei seu copo por um tempo me deixando ser atingida por diversos pensamentos maldosos que não tive tempo de colocar em prática, como se estivesse lendo meus pensamentos, em segundos tratou de ocupar seu lugar na ponta da mesa como sempre.
— Você está linda. — Zombou.
Meu pai queria que eu passasse horas treinando igual um homem que no final do dia estivesse com um vestido caro, salto alto, cabelos soltos, unhas e maquiagem feita como toda maldita mulher deveria estar. Ele desejava que eu fosse cobiçada pelos homens que entravam e saíam da mansão e que futuramente, se eu não me desse bem em seu trabalho, eu pudesse lhe dar algum dinheiro sendo vendida para qualquer merda.
— Você me fez treinar por oito horas seguidas. — Murmurei tomando minha vitamina de uma só vez para deixar o cômodo.
— Isso não é desculpa. Sua mãe estava sempre linda e cuidava de todos os meus negócios por horas.
Ri sem humor, deixando o copo sob a mesa.
— Ela não precisava levar uma surra por oito horas de dois homens mais velhos que se revezaram até me cansar. Faz menos de cinco minutos que deixei a sala e você queria que eu fizesse o quê? Me maquiasse? Porque você não experimentar se pintar antes de cada treino e me diz como ficará no final.
Observei-o olhar para seu copo enquanto misturava o líquido âmbar no vidro, sem qualquer resquícios de que havia odiado o que acabei de dizer, ele nem ligava.
— Desse jeito, você não encontrará um marido. — Foda-se!
Sorri.
— Papai, me conta uma verdade sobre mim. — Pedi, conforme me aproximava. — Antes de seguir com o que tem me reservado, eu só quero que me conte uma verdade.
Deu de ombros antes de tomar seu drink em um gole demorado que para mim pareceu uma eternidade e então respirou fundo.
— Quando te trouxe para casa, você era tão linda e delicada, eu passaria horas lhe observando dormir sem pensar o que aconteceria. Sua mãe ficou tão feliz, lhe tratou como uma princesa mesmo sabendo que você nunca seria uma, afinal, ela iria embora em breve e não sou o tipo de rei delicado que ela desejava que eu fosse. — Suspirou. — Hoje, eu te vejo como uma linda vaca.
Arqueei a sobrancelha e engoli em seco, por que havia pedido uma verdade? As mentiras eram reconfortantes.
— Você alimenta, cuida muito bem, garante que ela tome banho todos os dias e que sua pelagem esteja perfeita, e então você espera que futuramente ela lhe traga alguma coisa boa. E de você, eu espero uma coisa: trabalho, e caso não seja capaz de executar, eu vou ter de volta todo o dinheiro que gastei todos esses anos com você.
Abri um sorriso e levei minha mão até seu rosto quando estive próxima o suficiente, abaixando meus lábios até sua cabeça e deixando um beijo sem carinho na região.
— Aqui está você e sua verdade. Foi a coisa mais sincera que já disse para mim. Obrigada.
— De nada. — Respondeu no mesmo humor que o meu.
— E eu entendi tudo, sem sombra de dúvidas. — Me afastei e caminhei até a saída.
— Espero que sim. Não quero ter que te vender para algum abutre bilionário procurando por uma esposa jovem e linda para lhe dar herdeiros e transformá-los em cachorrinhos.
— Quer saber a minha verdade, papai? — Perguntei sem virar para encará-lo.
— Por favor.
— Eu ainda vou matar você.
— Principessa, eu não espero menos de você.
Assenti e deixei o cômodo, caminhando em passos rápidos até meu quarto, o único lugar em que eu me sentia segura, com armadilhas caseiras que colocava todas às vezes em que ia dormir, mesmo sabendo que pela manhã elas estariam desativadas apenas para que ele pudesse dizer "eu passei por aqui".
Quanto tempo alguém aguenta estar no inferno? Por quanto tempo uma pessoa aguenta ser torturada? Machucada? Estudos mostram que humanos conseguem suportar até 45 unidades de dor, e mulher consegue chegar até 57 unidades de dor, isto equivale a vinte fraturas de ossos ao mesmo tempo, quantos ossos eu já quebrei?
O suficiente por um parto ou dois?
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Criminal Soul
Fanfiction"Sua história é a sua armadura" "Esta é quem realmente você é, é a sua melhor versão" Eu costumava olhar no espelho todos os dias e repetir as frases magicas para camuflar o quão fraca fui em não ter resistido. Uma garota ingênua, de cidade pequena...