O Diário de um Desconhecido

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    Eu era um rapaz que tinha tudo para ser feliz, namorada, amigos, família, felicidade, amor, porém conseguia contemplar o oposto, tinha medo que o oposto pudesse voltar à minha vida, que me apanhasse e me empurrasse para um mundo cego, onde ter olhos não serviria de nada.
Todos os que eu tinha, me queriam bem, mas mesmo assim conseguia ter a coragem de me lamentar.
Senti-me um tubarão, não tinha pescoço. Só via aquilo que existia na minha frente, e no dia em que olhei para trás, já não tinha metade das coisas que outrora tive, e voltei a lamentar-me. Continuei a andar de olhos postos no chão, deixando que a melancolia se apoderasse de mim. Eu estava sozinho, era uma estrela não cintilante num universo sem a presença de um sol.
Quando o António Variações disse "Quando a cabeça não tem juízo, o corpo é que paga", ele não poderia estar mais correto, a baixa autoestima corroí todos os pontos positivos da parte humana, deixando-nos inúteis, de braços atados, prontos a transmutar para uma larva e construir um casulo, uma parede para o mundo, é triste quando a realidade nos vira as costas e ficamos num meio de um deserto a perseguir miragens.
Consegui olhar-me ao espelho mais uma vez, que distância é esta que eu tenho no meu olhar?
Perdi-me numa viagem em todos os sentidos, procurando efusivamente tudo aquilo que eu tinha perdido, fiquei obcecado pela ânsia de os voltar a alcançar.
Há momentos na vida em que um homem não sabe quando desistir mesmo quando já não tem trunfos no baralho, quando todos os seus peões foram derrubados e se encontra num xeque-mate evidente, poderia fugir, mas quem seria, eu se fugisse daquilo que eu próprio criei?
Eu tinha-me abandonado, procurava urgentemente a última peça do puzzle para encher o vazio que tinha em mim, esse grande vazio onde eu conseguia ouvir o eco do meu próprio pensamento como uma tortura, ecoam lamentos da minha própria lamentação, eu sei que a vida foge, mesmo acreditando que ela está para durar.
Eu tenho de viver hoje, porque não sei se estou cá amanhã, na verdade, a morte não me assusta, o que me assusta é eu não saber o que lá vou encontrar e saber que nunca mais poderei regressar.
Hoje sei que a vida não é um castigo que eu tenho que viver, estou sempre a tempo, posso mudar de vida.
Continuo em busca do que tinha, mas agora já não lamento, apenas desabafo, olho para o meu passado e posso rir e dizer "Adeus que me vou embora"    

"Por trás da realidade" by Nuno Miguel AssunçãoOnde histórias criam vida. Descubra agora