Casa Desocupada

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Está vaga.
Lembro-me vagamente de quando ainda estavas aqui, o tempo realmente consegue levar grandes fragmentos da nossa história, porém continua aqui algo para contar.
Na verdade não mudou muito desde que a porta bateu perante a tua vontade, sempre desejei que voltasses, mas quem sou eu para desejar o que quer que seja?
Todos os dias é a mesma rotina cansativa, viver acaba por ser cansativo quando tudo é tão repetitivo, é um sentimento antagónico.
Todos os dias fico a olhar pela janela da cozinha, de olhar perdido onde as ruas se cruzam, tenho uma réstia de esperança que consiga avistar-te lá, e que possa encher o peito de ar, que os cantos da boca se inclinem para cima novamente com vontade própria, mas não.
Será que eu para ti caí em esquecimento? Sinto-me em fim de ato, com o pano a descer em frente aos meus olhos, mas aqui não existem palmas para o ator principal.
O amor.
Amor platónico, um amor puro, cego, efémero.
O amor é cego, porque andamos toda a vida com uma venda nos olhos, aos apalpões, até que algo dentro de nós diz que é aquilo que queremos, mas será aquilo que precisamos?
O céu abunda em tons vermelhos e laranjas, sinal que a companheira solitária aí se aproxima, para me aconchegar, e fazer-me adormecer com a ideia que será amanhã que tudo muda, que amanhã está casa voltará a ter um motivo. Desligo-me do mundo, com um sorriso, amanhã.
Não, ainda não é desta, os raios de sol entram pelas pequenas brechas que o estore contém. Talvez esteja na hora de deixar tudo aquilo que me lembro num baú, e encerrar a sete chaves todas essas vivências. Já estou capaz de tudo.
É notável como os padrões do amor são tão semelhantes aos padrões da loucura, talvez venha daí a expressão "amar loucamente".


"Por trás da realidade" by Nuno Miguel AssunçãoOnde histórias criam vida. Descubra agora