— Bom dia! — Disse o Lorde com a voz grave, grossa e glacial. Assim que Berenyce abriu a porta, notou-lhe o rosto com poucos sentimentos e com a postura superior de sempre.
Para a surpresa da moça ele não estava barbudo e desalinhado como da última vez que o vira, ao contrário, estava mais lindo do que nunca. Trajava um casaco preto com a parte de trás mais comprida que a da frente de tecido importado, sobre uma camisa vinho de botões dourados. Calça bege e botas inglesas de couro alguns dedos abaixo dos joelhos. Os cabelos escuros em um corte bem feito na altura do ombro, estavam lisos e brilhantes. A barba bem aparada e sobrancelhas grossas. De fato, era um homem que sobressaía numa multidão, o mais lindo que vira na vida. Porém, o que mais lhe chamou a atenção não foi somente a beleza, mas sim os olhos azuis e intensos como o mar das ilhas Maui, no Havaí. Willian olhava para ela intensamente, que também estava muito mais bonita do que do último encontro dos dois. A cor rosa-bebê lhe caía muito bem e o modelo de vestido simples de renda com caimentos nos ombros parecia ter feito especialmente para ela. E fora mesmo, feito com muito amor por Irene.
— Bom dia, Senhor! — Respondeu Berenyce, sentindo-se intimidada diante da presença superior dele. A gata Magui passou correndo entre as pernas dela em um galope e foi brincar com o cavalo Majestoso para matar a saudade que estava do amigo.
— Vim para me desculpar pela forma grotesca que a tratei das duas e únicas vezes que a vi, não costumo agir assim com ninguém, muito menos com mulheres. — Exclamou ele, desviando o olhar. Na verdade, era o Lorde que se sentia intimidado diante dela, ela mexia por demais com ele. Desde a pele negra que imaginava ser macia aos cabelos soltos de forma avulsa, diferente de todas as outras mulheres do povoado que costumam usá-los sempre presos.
—Tudo bem, Senhor, todos nós temos dias ruins! — Disse ela sorrindo. — Deus, que sorriso era aquele? Pensou o Lorde, tentando recuperar o fôlego. Berenyce tinhas os lábios grossos, convidativos.
—Trouxe isso para você, é a única que sobreviveu depois que foi embora. — Ele entregou a rosa vermelha a ela, Berenyce estava tão atordoada que nem vira de onde ele tirou flor. O Lorde observou a jovem fechar os olhos e levar a rosa até as narinas e inalar o aroma gostoso que vinha dela. Com certeza fora a coisa mais erótica que Will vira na vida, a graciosidade dela era excitante.
— Obrigada, é linda! Mas como assim, a única que sobreviveu? Quando vim embora estavam todas lindas e saudáveis, esbanjando vida. — Os olhos dela ficaram marejados, uma lágrima fujona caiu sem pedir licença.
— Por favor, não chore! – Ele pediu, limpando a lágrima de sua face.
— Obrigada! – Agradeceu tímida, afastando-se do toque repentino do Lorde.
— Gostaria que aceitasse o seu emprego de volta, estão todos sentindo a sua falta. — A voz do Lorde saiu baixa, quase um sussurro.
— Não sei, Senhor, gosto muito de trabalhar no Castelo, mas tenho medo de ... — Parou de falar, com o olhar para baixo contorcendo as mãos.
— Que eu a maltrate novamente, não é mesmo? — Ergueu o queixo dela para que olhasse para ele, se arrependendo logo após. Ela estava chorando por causa dele. Então, a partir daquele momento jurou para ele mesmo que faria de tudo para vê-la sorrindo sempre.
— Na verdade, eu ia dizer que o meu medo é justamente que o Senhor comece a me tratar bem. — O Lorde não entendeu o que ela queria dizer com aquilo, mas também não perguntou nada. Berenyce não sabia muito sobre o amor, porém, sabia que ele era o tipo que qualquer mulher se apaixonaria rápido. E isso não poderia acontecer com ela, havia nascido para viver sozinha. Sem contar que um homem de linhagem nobre jamais olharia para uma forasteira, pobre e doente como ela. Quando soubesse que ela era portadora do vírus HIV teria nojo, assim como todas as outras pessoas.
— Se quiser eu posso dobrar o seu salário, ou melhor, pago o preço que quiser! – E de fato Will faria ou pagaria o que fosse para trazê-la para perto dele novamente e isso não tinha nada a ver com o jardim.
— Nem tudo se resume a dinheiro, Senhor, existem coisas bem mais importantes do que isso! Coisas que duram para sempre, como a amizade. — Berenyce sorriu olhando para Majestoso e Magui brincando como duas crianças no jardim de infância, na hora de recreio. O cavalo pegou a gatinha com cuidado usando a boca e a colocou sobre suas costas e ela andava de um lado para o outro brincando com a crina de fios longos e brilhantes.
— Não vejo Majestoso feliz assim desde o dia que foram embora do Castelo. Bernard também anda triste e mal fala comigo. Se a minha presença é um incomodo para você, prometo que não aparecerei no jardim quando estiver trabalhando. Não ouvirá nem o meu nome, nem nada sobre mim. — Disse Willian com uma certa tristeza na voz.
— Se for assim, eu aceito! Assim será melhor para nós dois! — Exclamou Berenyce, segura.
Bernard quase não acreditou quando avistou de longe o patrão puxando Majestoso pela rédea, com a jovem Berenyce sobre ele com a gata Magui nos braços. Agora, olhando os dois juntos, o mordomo constatou que pareciam ter sido feitos um para o outro.
— Menina Berenyce! Que bom que você voltou! — Bernard a abraçou o mais forte que pode.
— E agora é para ficar! — Berenyce beijou o rosto dele, feliz por estar de volta. Estavam tão felizes que não viram quando o Lorde entrara entristecido no Castelo. Cumprir a promessa que tinha feito a ela seria mais difícil do que parecia, verdadeiramente, quase impossível. Para sua surpresa, quando olhou da janela do seu quarto, curiosamente, as flores estavam mais lindas do que nunca, nem pareciam ter estado entristecidas. Estavam belas e vibrantes como se também estivessem comemorando a volta do Anjo Negro.
E ele cumprira a sua palavra por longos e dolorosos meses. Até um dia quando Berenyce teve que ficar até mais tarde no trabalho para plantar as mudas de algumas orquídeas selvagens que achou no bosque... O jardim, por sinal, estava cada vez mais lindo, sendo intitulado até mesmo de "o mais lindo do Condado".
— Desculpe Senhorita, não sabia que ainda estava aí. — Comentou Willian envergonhado, passando a mão sobre o cabelo. Havia esperado a tarde chegar para fazer a sua caminhada habitual em volta do Castelo, em especial no jardim. Apesar de não estar preparado para voltar ao Condado para interagir com as outras pessoas, agora era ele quem cuidava dos negócios da família que outrora esteve nas mãos de estranhos.
— Tudo bem, Senhor, gostaria de me ajudar com isso aqui? – Apontou para um saco cheio de mudas, próximo ao pé dele. Ela não sabia o que estava fazendo mas simplesmente o fez.
— Eu não sei se isso será uma boa ideia, acho melhor eu ir embora, até logo. — Porém, ele andou dois passos, parou por uns instantes e se agachou ao lado dela pegando uma muda dentro do saco.
— Sinto muito dizer, mas acho que não leva jeito para isso! – Brincou Berê, fazendo o Lorde ficar vermelho ao não conseguir, vergonhosamente, concretizar o simples ato de enfiar uma muda em um buraco já pronto. Realmente ele nunca tinha feito isso antes.
— Minha esposa dizia a mesma coisa quando oferecia ajuda a ela. – Ele parou para pensar no que havia falado, fechando a cara no mesmo momento. Ameaçou levantar para ir embora e se esconder na escuridão.
— Ninguém nasce sabendo, por favor me deixe ajudar você, Willian! — Berenyce segurou a mão dele, olhando dentro dos olhos do Lorde. Era a primeira vez que o chamava pelo nome, detalhe que não passou desapercebido por ele.
— Ninguém pode me ajudar, Berenyce! – A voz dele saiu profunda, cheia de dor e amargura.
— Deixe-me ao menos tentar! — Pediu ela com a voz firme. Will viu tanta confiança nos olhos dela que por um momento não conseguiu pensar em mais nada além de como ela era linda, encantadora.
— Espero que seja paciente comigo, Senhorita Berenyce, sou meio difícil às vezes. — Ele sorriu em meio as lágrimas.
— É, eu sei. — Berenyce gargalhou alto.
— Até me senti mal agora. — Então os dois riram, como há muito tempo não faziam.
Depois desse dia ficava cada vez natural ver os dois juntos, quase inseparáveis. Bernard não cabia mais em nenhum lugar de tanta alegria, sabia que a jovem traria vida para aquele Castelo. Já estava até preparando tudo para o casamento que, segundo a imaginação dele, aconteceria em breve.
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Lorde Willian (um conto de amor) Completo.
RomanceLorde William Walquer era um homem bondoso e respeitável. Até perder a mulher e o filho de apenas cinco anos em um trágico acidente de carro. Desde então vive uma vida solitária e amarga, escondido atrás dos muros do seu sombrio castelo, no povoado...