Pedras na janela

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PEDRAS NA JANELA

Ele batucou os dedos na mesa de madeira, sentindo uma ansiedade absurda. Não se lembrava de ter sentido isso em todos os seus míseros 17 anos. O coração batia mais rápido, suas mãos não paravam quietas, seu cabelo já revolto após tantas passadas de mão. Era isso que chamavam de ansiedade de amor? Porque se fosse, ele gostaria que diminuísse a frequência.

Desviou o olhar da janela do quarto, que tinha vista para a casa azul ao lado. O gramado deles sempre parecia mais verde - e era, de fato. A perfeita casa americana com a perfeita família americana. O casal, a filha prodígio e um cachorro labrador. Andou de um lado ao outro do quarto e parou de frente para o espelho, olhando o próprio reflexo. Sorriu com escárnio. Era tão clichê que o garoto mais arruaceiro e desajustado do colégio se apaixonasse pela vizinha prodígio e arrumadinha.

Engoliu em seco e o sorriso desapareceu ao lembrar da proposta da noite anterior. Ele e ela debaixo da árvore, às onze horas de uma terça-feira. Talvez devesse ter ficado quieto e guardado suas ideias insanas para si. Pela expressão que ela fez, era óbvio que àquela hora ela devia estar arrumando as suas coisas para ir mais cedo para a universidade, sem olhar para trás.

Grunhiu e se jogou na cama, socando o travesseiro. Tão patético quanto um garotinho de 7 anos frustrado com o couve do almoço. O que havia acontecido com ele? Era um cara normal, que saía com algumas garotas, andava de carro, chegava bêbado em casa e ouvia reclamações da sua mãe amorosa e preocupada. Depois ia para o colégio, tentava prestar atenção na aula e apesar de não ser o melhor aluno, ainda era razoável.

E agora, ali estava ele. Apaixonado por uma menina totalmente diferente dele, e infinitamente melhor. Ela era tudo o que ele admirava em um ser humano - e mais um pouco. Era o que ele chamava de porto seguro, seu alicerce e e todas as definições românticas e patéticas existentes. Ela era tudo, e era o que ele queria pro seu futuro. Queria ser melhor para ela, queria ser dela. E já não sentia mais vergonha de admitir isso. Antes sentia, claro. Quando ainda não entendia nada. Agora ele entendia menos ainda, mas tinha os olhos mais abertos para o óbvio.

E antes que seus olhos se fechassem novamente diante da possibilidade caótica e perturbadora da negação dela, ele levantou, vestiu sua jaqueta de motoqueiro preferida saiu de casa confiante. Não era motoqueiro - nem ao menos tinha uma moto -, mas gostava da sensação de se sentir um. E naquele momento ele precisava.

Deu a volta na casa dela e se esgueirou pelos fundos. Avistou a janela dela aberta e, se xingando mentalmente, catou pedrinhas para jogar na janela. Arremessou a primeira bem no momento em que ela pôs o rosto para fora. Mordeu o lábio ao ver a pedrinha acertar a testa clara da menina.

- É isso que eu adoro em você - A ouviu dizer baixinho, com um sorriso cínico. - Tão delicado!

- Desculpe.

- O que faz aqui?

- Estou jogando pedrinhas na sua janela. Ouvi dizer que meninas boazinhas gostam disso.

- Aprendeu isso com os filmes dos anos 80?

- Sim. Eu pensei em aparecer aqui com caixas de som e uma música marcante, para ser mais romântico, mas não achei caixas de som.

- E nem o romantismo.

- Exato.

Se olharam por alguns segundos, ambos com um sorriso contido no rosto. Ela engoliu em seco, desviando o olhar para o céu rosado por alguns segundos. O dia estava chegando ao fim, e isso era acolhedor e triste ao mesmo tempo. Ela lhe devia uma resposta.

- Eu não sei.

- Eu posso te ajudar a descobrir.

- Não, não pode... Eu tenho medo.

- Eu também tenho.

- Mas olha pra você! Com essa jaqueta esquisita e esse cabelo bagunçado. Um perfeito protagonista rebelde atrás da garota chata. O que é isso tudo?

Ele suspirou, olhando para os próprios pés e em seguida para ela, novamente.

- Eu também não sei. Essa jaqueta nem faz mais sentido e... Pedrinhas. - Ele mostrou as pedrinhas brancas em sua mão. - Na janela. Preciso fazer mais o quê para você perceber que só quero sair daqui com você e ir pra longe disso tudo?

Ela riu, apertando os próprios dedos. Indecisão. Sempre foi ensinada a pensar com calma e clareza, sobre tudo. Mas o que fazer quando a sua mente não responde? Ela realmente só queria sair daquele lugar sem pensar, e ir para qualquer lugar. Sem destino certo.

Ela olhou para ele e suspirou. Fechou a janela com calma enquanto via a expressão dele mudar de felicidade para tristeza em milésimos de segundos.

Olhou para seu próprio quarto e decidiu pegar apenas o necessário. Bolsa, casaco e balas.

Tendo tudo o que precisava, desceu as escadas correndo e saiu de casa, bem a tempo de vê-lo chegando na entrada de sua própria. Ela correu até a calçada, parando na metade do caminho a tempo de ele avistá-la, confuso.

Ela sorriu e apertou a bolsa contra o peito, sentindo-se tímida de verdade pela primeira vez na frente dele. Era assim que as pessoas diziam se sentir quando amavam pela primeira vez?

- Vamos?

- Você é maluca.

- Obrigada pelo elogio.

Ele riu e correram até o carro, ambos se enfiando em seus bancos rapidamente antes que o juízo atacasse suas mentes. Ele com sua jaqueta e ela com seu sorriso doce. Um dia ele lhe disse para nunca deixar a pressão superar a diversão. Talvez estivesse certo.

Descobriria isso quando estivessem livres e bem longe dali.

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